No meio da voracidade desta época de bandalheira institucional já ninguém repara
que o marido da ministra das Finanças encontra um emprego estranho numa empresa
que foi vendida aos comunistas chineses ou que o Mira Amaral comprou um banco e ainda recebe dinheiro. Somando esta volatilidade ao facto de já pouca gente ligar ao Cavaco diz ou deixa de dizer leva a que ninguém tenha dado o devido valor a algumas declarações do ainda presidente, como a insinuação de que andava por aí gente (perigosa) a boicotar o seu milagre da salvação nacional.
Na mesma entrevista Cavaco disse outra coisa com grande
gravidade, a de que é de Lisboa costumam chegar as más notícias. Foi um momento
de ruralismo muito típico em Cavaco Silva, a ideia de que as más notícias vem
dessa Gomorra dos políticos, gente que só faz mal ao país e não defende o
interesse do país. É evidente que este Cavaco antes de ser presidente era um
modesto professor que não percebia nada dessas coisas sobre acções escritas em
inglês, era um modelo de virtudes ruralistas, até acredita nos milagres feitos avulso pela Nossa Senhora de Fátima!
Mas é muito grave que um presidente insinue que há gente a
boicotar a salvação nacional pela qual ele se bate nos intervalos da observação
das cagarras. E é grave porque toda a gente sabe a que personalidades se
referia, da mesma forma que toda a gente se lembra do famoso caso das falas
escutas a Belém. É ridículo ver alguém que deu cobertura a uma conspiração
contra um governo legitimado pelo voto popular venha agora fazer insinuações
sobre terceiros, só porque estes dizem a sua opinião ou porque tentam evitar que o seu partido seja alvo de uma opa da direita e extrema-direita.
Toda a gente sabe a que partido e a que personalidades se
referia Cavaco Silva e é lamentável que não tenha indicado os nomes, não porque
esclarecesse o que quer que fosse, mas pela cobardia da fórmula assente na insinuação. De um presidente espera-se coragem e não cobardia, exige-se frontalidade e não insinuações, já nos basta a crise financeira, não precisamos de uma crise de valores nas instituições da democracia.
Mas é grave que um presidente de um país democrático
considere que há democratas que ao defenderem as as suas opiniões dentro dos partidos
em que militam e que porventura até terão fundado e porque tais opiniões desagradam a alguém sejam acusados de estarem a boicotar a salvação nacional.
Cavaco devia ter mais tento na língua porque o único conspirador contra a democracia portuguesa é um seu braço direito, entre as pessoas a que ele se referia não há golpistas e muito menos ladrões de bancos, vigaristas e muito menos suspeitos de matar velhinhas. São
democratas que deram o melhor ao seu país, que sempre se bateram pelos seus
ideais e o seu comportamento nunca fez lembrar o Ali Baba e os quarenta ladrões.