A política económica adoptada por Vítor Gaspar obedecia a um programa ideológico e tinha pressupostos que não se limitavam ao inscrito no memorando de entendimento. No primeiro ano foi evidente que o governo pretendia uma desvalorização fiscal que conduzisse a uma redução brutal dos salários, o despedimento em massa de funcionários públicos, a redução de sectores de produção considerados parasitários.
Era proibido falar em crescimento e a primeira vítima dessa proibição foi mesmo um membro do governo, o então ministro da Economia ousou propor medidas para o crescimento e foi gozado em plena reunião de Conselho de Ministros. Não só foi gozado como alguém fez questão de passar a suposta anedota para os jornais, tendo sido dessa forma alvo de uma humilhação pública digna dos tempos da revolução cultural de Mao.
A teoria estava nos livros e Vítor Gaspar quase se tornou numa vedeta internacional, o modesto professor de economia teve direito a escrever o prefácio da edição portuguesa do livro “Desta vez é diferente. Oito séculos de loucura financeira” da autoria de Reinhart e Kenneth Rogoff dois professores de Harvard. Só que o livro continha erros e aos poucos estas personagens foram-se eclipsando, enquanto Gaspar fugia do país com uma carta escrita à pressa.
Era o tempo da experiência, uma experiência que falhou e agora o país parece um laboratório abandonado, num edifício em ruinas e com os equipamentos enferrujados e cheios de pó e teias. Os experimentalistas ou fugiram ou deixaram de falar das suas teorias, deixaram de proibir o uso da palavra crescimento e até já consegue verter lágrimas pelos jovens desempregados, os mesmos jovens a quem sugeriam que procurassem zonas e conforto no estrangeiro, em Angola sugeria o académico Miguel Relvas.
A verdade é que a experiência falhou, os donos dos restaurantes arruinados não se transformaram em donos de startups tecnológicas, a construção civil destruída não deu lugar a fábricas de automóveis, os passaportes dourados só atraíram novo-ricos chineses, a liberalização da legislação laboral não atraiu nem um dos muitos investimentos prometidos. As gorduras do Estado estão onde sempre estiveram, as fundações e institutos estão em forma, os do BdP continuam bem na vida, os banqueiros foram salvos.
É como se esse laboratório fosse uma velha estação de serviço abandonada da estrada 66 dos EUA, à sua volta há abandono e deserto. O governo dedica-se a arrebanhar investimentos suportados por benefícios fiscais para promover cerimónias públicas ou embarca em show offs de multinacionais promovidos com dinheiros de Bruxelas. É o fim triste de um presidente da Comissão Europeia ajudando os seus no país que ajudou a destruir.
Onde estão os Bentos e muitos outros que tanto apoiaram as teses do empobrecimento e da desvalorização fiscal? Onde estão os famosos economistas do ISEG e da Nova que todos os dias apareciam nas televisões a fundamentar as teses do Governo? Onde estão os governantes alemães que tantas vezes vinham a Portugal elogiar a coragem de Passos Coelho? Onde está o Vítor Gaspar que de vez em quando vinha cá cobrar o favor que tinha feito ao país? Onde está o Álvaro Santos Pereira que foi humilhado e acabou por sair pelas traseiras?
E agora? Agora o país navega à vista, sem dinheiro, totalmente nas mãos dos credores, com um presidente que dá sinais de degradação física e já não consegue acabar um discurso sem sofrer uma “reacção vagal”, com um governo que não sabe o que fazer e que não representa quase ninguém. Falhada a experiência Portugal parece um navio fantasma que anda sem ninguém ao leme.