quarta-feira, junho 04, 2014

Não me habituo

 photo Cobardolas_zps786ad023.jpg

Não me habituo à ideia de que perante a política económica mais brutal o líder da oposição não seja capaz de apresentar alternativas credíveis, escudando-se sempre atrás de decisões europeias.

Não me habituo a um líder da oposição que num ano tenta opor-se a que deputados do seu partido enviem o =E para o Tribunal Constitucional por considerarem inconstitucionais os cortes nos vencimentos e pensões e no ano seguinte venha aproveitar-se de um acórdão do mesmo tribunal considerando aqueles cortes inconstitucionais.
  
Não me habituo à ideia de que o partido em que costumo votar tenha um líder que passa três horas reunido com o primeiro-ministro e depois venha dizer que não houve qualquer acordo porque há divergências insanáveis, sem que explique o que discutiu durante tanto tempo e quais são essas divergências insanáveis.
  
Não me habituo à ideia de que há um líder da oposição que aceitar negociar com o governo em segredo e sob a vigilância de um delegado de Cavaco Silva visando um compromisso onde a troco dos direitos dos cidadãos tinha a promessa de receber a realização de eleições antecipadas.
  
Não me habituo à ideia de que em Portugal há um partido que é liderado por alguém que parece ter vergonha do legado do seu partido, permitindo que muita coisa boa seja destruída em nome da vaidade pessoal do primeiro-ministro, parecendo que em vez de fazer oposição ao governo prefere fazer oposição à sombra do seu antecessor.

Não me habituo à ideia de que o líder de um partido considere que os votos no seu partido são votos na sua pessoa e no seu brilhantismo, não fazendo sentido que umas vezes se diga que os eleitores estão votando para as europeias e depois e de forma abusiva se considerem esses votos como cheques em branco a um líder que nunca disse aos eleitores que estariam  votando na continuação da sua liderança.
  
Não habituo à ideia de que o maior partido da oposição é liderado por alguém que é mais desejado pelo governo e pelos partidos da direita do que parece ser pelo eleitorado do seu próprio partido.
  
Não me habituo à ideia de ao longo de três anos Seguro nunca ter feito uma oposição firme ao governo e em vez disso ter andado a tratar da sua própria imagem, aguardando tranquilamente que a legislatura termine para ser vice-primeiro-ministro do seu amigo Passos Coelho.
  
Não me habituo à ideia de termos um líder da oposição que ao longo de três anos não apresentou uma única alternativa em qualquer domínio da sociedade, para depois preparar à pressa um programa de 80 medidas, pensando que ia ter um grande resultado nas europeias tentou de forma atabalhoada transformá-las na primeira volta das legislativas.
  
Não me habituo à ideia de ver um líder da oposição dizer que não havia condições para voltar atrás em decisões inconstitucionais quando o próprio governo já tinha prometido a recuperação progressiva dos vencimento, para depois vir colher os louros por uma decisão do Tribunal Constitucional.
  
Não me habituo à ideia de ter um líder da oposição de quem o Marco António diz concordar com os cortes dos vencimentos dos funcionários públicos, ao mesmo tempo que acusava o TC de querer forçar os partidos do “arco da governação” a um aumento de impostos que não queriam.
  
Não me habituo à ideia de ver um líder da oposição esconder as suas posições com evasivas, deixando no ar a ideia de que as divergências com Passos Coelho são bem menos insanáveis do que diz.

Não me habituo a um líder que perante um desafio responde com cobardia e em vez de enfrentar quem de forma leal lhe disputa o cargo, recorre a truques de secretaria, chegando ao descalabro de adoptar as medidas a que no passado se opôs porque lhe era esse o seu interesse pessoal.
  
Não me habituo à ideia de ver Portugal governado por gente que faz do poder um prazer pessoal e que tem o maior desprezo pelos cidadãos, pelos eleitores e pelos militantes do seu partido.
  
Há coisas a que não me consigo habituar. Não consigo habituar-me ao compadrio interpartdiário, à incompetência, à mediocridade, à cobardia política, ao desprezo pelo sofrimento de medidas inaceitáveis e inconstitucionais, ao amiguismo, à falta de combatividade, à ausência de ideias e de alternativas. Não consigo nem quero habituar-me, porque acredito que se pode fazer diferente e melhor, porque defendo que os líderes devem ser escolhidos entre os melhores, porque acho quem quem é cobarde e recorre a truques não tem condições para liderar o que quer que seja e muito menos um partido ou o governo de um país.

Não me habituo, não aceito, nem me conformo.