Cavaco vai na sua terceira versão, começou pela cooperação estratégica, passou ao “eu avisei”, agora parece um disco riscado com o seu compromisso. Desde que percebeu que o seu partido caminhava para a implosão descobriu no discurso do compromisso a forma de atacar sistematicamente o maior partido da oposição, com o seu partido permanentemente disponível para o compromisso fica no ar que se tal não acontece é porque a oposição se recusa.
O discurso do compromisso mostra como Cavaco não tem dimensão para o cargo que exerce. Começou por sugerir um negócio com o PS em que antecipava as eleições a troco de um compromisso cujas negociações chegaram a decorrer sob a sua tutela. Como as negociações foram inconclusivas vingou-se do PS e passou a dizer que o normal na Europa é que as eleições se realizem no fim das legislaturas. Só não disse que o normal na Europa é que a duração das legislaturas não se negoceia, nem se decide fora do quadro Constitucional e marginalizando uma parte dos deputados.
Como ninguém lhe pediu nada em troca do consenso ou do compromisso Cavaco passou a defender uma nova tese, que um compromisso permitiria uma redução das taxas de juro. Só que Cavaco teve azar e mesmo sem qualquer compromisso as taxas de juros têm vindo a baixar e é evidente que os mercados não estão assim tão preocupados com a política interna, como muitas vezes se tem dito.
Falhado o negócio das eleições, provado que os juros não dependem de compromissos e sem grande argumentos Cavaco passou a invocar as vantagens de longo prazo, sem dizer ou explicar quais são. Não se percebe muito bem que vantagens podem ser obtidas sem se saber quais as medidas que resultariam do tal compromisso.
Se recuarmos ao primeiro mandato presidencial de Cavaco Silva reparamos que no passado Cavaco já se preocupava com a necessidade de compromissos, mas nesse tempo os compromissos eram outros. Umas vezes criticava abertamente as decisões governamentais, ou convidava amigos para um chá em Belé, dque depois davam entrevistas à saída do Palácio cujo tema recorrente era a crítica ao governo. Por várias vezes Cavaco exigiu maiorias alargadas a decisões adoptadas pelo parlamento com maioria absoluta, achava que certas medidas deviam ser consensuais.
Acontece que este governo tem decidido a política económica como muito bem quer, chegando mesmo a ultrapassar os limites permitidos pela Constituição e Cavaco nunca defendeu qualquer compromisso alargado no parlamento, não pediu qualquer consenso parlamentar alargado em relação a um único diploma do governo ou do parlamento e a regra tem sido ignorar a Constituição no momento da promulgação de todas as medidas de austeridade. Aliás, Cavaco nem se dá ao trabalho de defender o regular funcionamento das instituições quando estas são atacadas pelo governo, nem sequer fica muito incomodado como o governo desrespeita de forma grosseira o princípio da separação de poderes.
Se Cavaco tem sido um militante da política deste governo para que quer o consenso? É evidente que não quer um consenso em torno de outra política do que aquela que tem sido consensual entre Belém e São Bento. O que Cavaco quer é dividir os prejuízos eleitorais da incompetência da direita, seja ela a do governo ou a da Presidência da República. O que quer é que o PS seja penalizado eleitoralmente para que nas próximas eleições não tenha que dar posse a um governo que ajudou a derrubar.
Cavaco desmaiou quando Guterres tomou posse, voltou a desmaiar ao ouvir protestos e voltará ter um fanico se tiver que dar posse a um governo de maioria absoluta do PS, ainda por cima presidido por alguém como António Costa. O compromisso que Cavaco pretende é o prolongamento deste pântano da direita para além do termo do seu mandato presidencial. Quer partir para a Quinta da Coelha com a ilusão de que fez alguma coisa por este país, algo que já tentou no passado com os resultados que se conhecem, os corredores dos tribunais estão cheios de filas dos seus velhos amigos.