quinta-feira, fevereiro 19, 2009

O último a sair que apague a luz

O movimento migratório que mais nos deveria preocupar e levar a um debate sério sobre o estado a que chegou a nossa sociedade não são os emigrantes do leste, os que chegam da África ou os que vêm do Brasil, nem mesmo os nossos operários da construção civil que vão ganhar muito mais em Espanha. O movimento migratório que deveria estar atravessado na nossa consciência é o dos jovens quadros que abandonam o país e até os que são rejeitados pelas escolas de medicina num país carente de médicos e que vão estudar para o estrangeiro.

É evidente que muito vão em busca de doutoramentos de prestígio ou para centros de investigação, da mesma formas que outros chegam de todo o mundo para se doutorarem nas nossas universidades. Mas também estes acabam na sua maioria por ficar no estrangeiro, na hora de regressar entram em conflito com um país onde impera o oportunismo, onde se sobre com golpes baixos e onde o mérito é considerado perigoso.

O mesmo país que acumula dívidas para serem pagas no futuro por estes jovens rejeita-os, promove a sua proletarização forçada, condena-os a viver em casa dos pais até aos trinta anos com ordenados de quinhentos euros.

Os bancos estão cheios de licenciados em gestão a servir de balconistas, os hiper têm licenciados a fazer reposições em part-time, as empresas de serviços recorrem a licenciados para atenderem o público nos seus balcões, os advogados famosos cá da praça pagam menos aos jovens licenciados do que às suas empregadas domésticas e ainda pró cima com menos direitos, os ateliers de arquitectura de renome pagam à hora a jovens arquitectos para que passem os projectos para auto-cad.

E tudo isto não é resultado de nenhuma crise económica ou financeira, não é consequência de qualquer reforma da legislação laboral, é uma consequência da falta de valores, do apodrecimento de uma sociedade em que ninguém tem vergonha ou escrúpulos. Construímos escolas e universidades para mandar para o mercado uma legião de proletários de fato e gravata, proletários com que os sindicatos não se preocupam pois não pagam quota, de quem os políticos não se lembram por terem a consciência pesada.

No fim da escala social já não estão os proletários de antigamente, os mais explorados já não são os operários da indústria têxtil ou os pescadores dos arrastões, estão os jovens licenciados que são atirados para um mercado de trabalho marginal, sem regras. Não trabalham para o Almirante Henrique Tenreiro, para os patos-bravos da construção civil ou o industrial têxtil que leva a amante a passear no seu Ferrari. Trabalham para o Belmiro de Azevedo, para alguns advogados e arquitectos de mais prestígio da praça, para gente que não se cansa de dar lições de moral ao país, que se reúnem nos “compromissos Portugal” e noutras agremiações económicas ou políticas que arrastam a comunicação social sempre que decidem fazer alguma manifestação intestinal.

O movimento migratório que mais nos deveria ofender a consciência são os jovens que procuram no estrangeiro o emprego que cá não encontram, pior do que isso, os que procuram no estrangeiro um país que os trate com mais dignidade do que o país onde nasceram e onde supostamente deveriam ter uma oportunidade.