quinta-feira, junho 13, 2013

O revisionismo da história segundo Cavaco Silva

Deve ser muito frustrante ter-se construído a imagem de competência e acabar por ser tratado como um incompetente, passar a imagem do político venerado pela honestidade e acabar parecendo estar rodeado por quarenta ladrões, passar a imagem do modernizador do país e perceber-se agora que o dinheiro foi esbanjado e o país ficou na mesma, pensar-se que ia ser um grande presidente em comparação com Soares e acabar com o estatuto do prior presidente da história da democracia.
Cavaco candidatou-se a Presidente convencido de que tinha um lugar na história de Portugal, só faltava limar algumas arestas. A imagem do político que apostava no betão e desprezava os cidadãos, nódoas como a recusa de atribuição de uma pensão a Salgueiro Maia ao mesmo tempo que a atribuía a um inspector da PIDE de muito má memória, o investimento em estradas por oposição ao desenvolvimento económico e social.
Cavaco contava com dois anos num cargo sem grandes problemas para rever a história do seu desempenho como primeiro-ministro, inventou os roteiros que mais não são do que uma espécie de rota do camião do lixo, os roteiros mais não servem para mostrar um Cavaco que não existiu enquanto foi primeiro-ministro.
O Cavaco que com as privatizações criou uma classe de ricos preocupa-se agora com os pobres, o Cavaco que desprezava o Alentejo anda anda e ainda o vamos ver a treinar o cante alentejano com os mineiros de Aljustrel, o Cavaco que deu a pensão ao Pide apressou-se a montar uma homenagem a Salgueiro Maia, o Cavaco que tudo apostou no sector dos serviços não se cansa agora de falar dos produtos transaccionáveis e da agricultura como se fosse um fisiocrata dos tempos modernos.
Mas tudo correu mal a Cavaco e a actual situação política é prova disso, a história revelou-se tão cínica quanto Cavaco e como prenda pelo derrube de José Sócrates deu-lhe um governo do seu partido, mas com o seu velho inimigo Passos Coelho como primeiro-ministro e numa coligação que está nas mãos de Paulo Portas, o amaldiçoado director do semanário Independente. Deus foi justo, tratou o cão com o pêlo do próprio cão, queres um governo dos teus e para isso até os teus amigos conspiram contra a democracia? Então leva este governo e faz dele o teu governo para ver se gostas! Este destino quase me levou a deixar de ser agnóstico, se há Deus esta foi claramente uma manifestação da mão Dele!
Se Cavaco pensava rever a história e usar o poder presidencial para ser ele a escolher o seu lugar enganou-se. A história não gosta de ser manipulada por aprendizes de feiticeiro. O Cavaco competente deu lugar ao incompetente, o Cavaco que se queria vingar de Soares teve de se vingar em alguém que o enterrou e que todos os domingos reaparece como se fosse a alma penada do cavaquismo na versão presidencial, o Cavaco honesto deu lugar ao político português com mais amigos duvidosos.

Cavaco achou que podia tosquiar a história e acabou por ser tosquiado pelos acontecimentos, só mesmo os beneficiários do cavaquismo ainda estão ao seu lado e muitos deles porque agora pareceria mal cuspirem na sopa onde comeram. O cavaquismo acaba por morrer e ter um enterro organizado nem mais, nem pelos do que pelo próprio Cavaco Silva. A Presidência da República de Cavaco Silva é isso mesmo, em  vez da revisão manhosa da história é o enterro do cavaquismo devidamente encenado pelo seu principal protagonista. Para acabar em beleza só mesmo com um final encenado por Filipe la Feria.