domingo, setembro 20, 2009

Uma semanada de conspirações

A primeira reflexão que me ocorre perante esta sequência de escândalos é se tudo isto teria sucedido se o PSD tivesse um candidato credível a primeiro-ministro, um candidato que não fosse um invenção de Belém, com um programa para o futuro do país. Quando o candidato do PSD foi Santana Lopes ficámo-nos com a insinuação de que Sócrates era gay, ninguém vasculhou na família do líder do PSD, Cavaco não tinha os poderes que hoje tem e o caso Freeport continuou adormecido nos arquivos do Ministério Público.

Mal Cavaco Silva sonhou com a hipótese de acumular a Presidência da República com o exercício efectivo do cargo de primeiro-ministro nunca mais houve tranquilidade neste país, os seus assessores entraram numa grande excitação, ajudaram Manuela Ferreira Leite a eleger-se líder do PSD, instalaram-se na redacção do Público a promover conspirações e até fizeram o mini programa eleitoral do PSD.

Todos sabíamos que esta campanha eleitoral não se iria ficar pelas arruadas, só restava saber o que rebentaria. Mas ninguém esperava que uma idiotice se transformasse num caso de grandes dimensões. E tudo sucede num momento em que poucos acreditavam numa vitória eleitoral do PSD, quando Manuela Ferreira Leite estava sem discurso e se arrastava penosamente pelo país.
É evidente que Ferreira Leite nada tem a ver com isto, a comunicação social chegou a informar que o PSD ia mudar de estratégia e isso ficou evidente quando o PSD passou a agitar o espantalho de uma aliança entre o PSD e o BE. Com a notícia o PSD ficou baralhado e na defensiva, mas bastou um dia para mudar novamente de estratégia e voltar ao tema da asfixia democrática. Para tal bastou o falso silêncio de Cavaco Silva, ao mandar o recado de que já tinha investigado a escutas no Palácio de Belém e qu iria fazer perguntas depois das legislativas, o ainda presidente manteve a suspeição e alimentou o discurso de Manuela Ferreira Leite. É como se tivesse dito a Manuela Ferreira Leite “não mudes de discurso e aproveita a minha deixa”.

Há muito que Belém alinha a sua actuação com o discurso da “asfixia democrática”, aliás, não só alinha como o alimenta com gestos subtis e insinuações. Alimentou-o quando recebeu o senhor Palma do MP para falarem das alegadas pressões sobre os investigadores do Caso Freeport, alimentou-o quando fez insinuações sobre a eventual compra da Media Capital pela PT e voltou a fazê-lo a propósito de Manuela Moura Guedes.

Cavaco joga tudo nestas eleições, é bem mais fácil assegurar a sua reeleição destruindo Sócrates e o PS antes das legislativas do que ter que enfrentar Sócrates numa fase em que a economia entrar em recuperação. Se Cavaco não derrotar Sócrates nestas legislativas terá muitas dificuldades em reeleger-se ou pelo menos fazê-lo com as mesmas facilidades com que ganhou as presidenciais. Ele sabe que depois das tropelias que fez a Sócrates o líder do PS não lhe estenderá o tapete vermelho, que avançará com um candidato para o derrotar. E depois do espectáculo triste e do incumprimento das promessas eleitorais de Cavaco Silva dificilmente o boliqueimiano será reeleito.

Aparentemente a notícia do Diário de Notícias poderia favorecer a campanha do PS, mas só um doido recorreria a este estratagema num momento em que era o PSD que estava em dificuldades, o seu programa eleitoral revelou-se um fiasco, as intenções ocultas da Dra. Manuela ficaram evidentes e a sua campanha estava a perder gás. Mas perante esta notícia só poderiam colocar-se dois cenários possíveis: ou Cavaco promoveu uma conspiração para destruir politicamente o primeiro-ministro ou este tinha mesmo recorrido a poderes ocultos para vigiar o presidente.

Mas se o presidente estava empenhado na cooperação estratégica com o governo porque razão haveria Sócrates de estar interessado em saber das intimidades de Belém? O medo de estar a ser vigiado só pode ser entendido se Cavaco estava a actuar para além dos seus deveres constitucionais, já que tudo o resto é do conhecimento do primeiro-ministro, os poderes presidenciais não dão lugar a uma agenda secreta. O certo é que da segunda vez que se falou de escutas foi quando se soube que os assessores de Cavaco Silva estavam a colaborar na elaboração do programa do PSD. Ora, definir a estratégia do principal partido da oposição não faz parte da competência nem do presidente nem dos assessores, é uma violação dos mais elementares princípios da ética e do respeito pelos princípios constitucionais. E tal como o envolvimento dos assessores na eleição da Dra. Manuela, então denunciada pelo Expresso, o envolvimento dos mesmos assessores na elaboração do programa do PSD chegou ao conhecimento público sem ajuda de tropelias secretas.

A verdade é que Belém quer fazer passar a mensagem de que o Presidente quer que a Dra. Manuela ganhe e precisa de alguns truques. Não é Sócrates que está interessado em conhecer as intimidades do palácio rosa, é a equipa de Cavaco Silva que precisa de passar a mensagem do apoio de Cavaco Silva à escolha da Dra. Manuela. Até porque sabem que sem um forte apoio a líder do PSD nem uma junta de freguesia conseguiria ganhar.

A forma como o director do Público reagiu à divulgação do mail foi ridícula mas talvez menos ingénua do que aparentou. Começou por lançar dúvidas sobre a verdade do documento e acabou por lançar a suspeição sobre os serviços d informação. Coincidência ou não a estratégia do director do Público encaixou que nem uma luva nos objectivos dos assessores de Belém e no discurso de asfixia da Dra. Manuela.

Mas ninguém equacionou a hipótese mais evidente, a possibilidade de ter sido o tal assessor de Belém a combinar com um jornalista do Público ou mesmo com o seu director o envio de cópia do mail para as redacções de outros jornais. Mandava-se a cópia e insinuava-se que os serviços de informação além de vigiar o palácio também vigiava o Público, o presidente ficaria muito preocupado mas nada diria antes das eleições, a Dra. Maria voltaria ao discurso da asfixia democrática e um dos seus candidatos, o juiz Bacelar, exigiria uma investigação da Procuradoria-Geral da República a tempo de influenciar s eleições.

Quem mandou o mail para o DN? Esta resposta só poderá ser dada ou pelo director do DN ou por algum garganta funda do Público, mas nem um, nem o outro vai falar. Resta-nos ler o que escreve o director do DN com muita atenção e no editorial de Sábado escrevia um parágrafo muito intrigante:

«O PR, mais uma vez, não se demarcou da tarefa de que terá incumbido o seu assessor (que se tivesse exorbitado deveria estar já sumariamente despedido). Antes pelo contrário, afirmou, de forma clara, que vai "averiguar questões de segurança" depois das eleições.

Estas palavras são contraditórias com a afirmação de que não pretende influenciar o período eleitoral. Além do mais, escondem uma outra hipocrisia: se o PR não queria influenciar, porque utilizou o assessor para dar uma "notícia" em vésperas das eleições?»


É evidente que ao dizer que “se o PR não queria influenciar, porque utilizou o assessor para dar uma "notícia" em vésperas das eleições” João Marcelino refere-se à manchete do Público do passado mês de Agosto. Mas também se pode ficar a pensar que foi um assessor a entregar o mail ao DN. Porque não? Por aquilo que se tem visto os assessores do presidente mais parecem estafetas de uma empresa de Express mail, só lhes falta mesmo andar de mota.

Em Agosto o PS tinha saído de uma derrota eleitoral, poucos acreditavam na recuperação de José Sócrates, não fazia o mais pequeno sentido usar esta questão para efeitos eleitorais. Quando João Marcelino fala de “vésperas” das eleições está a referir-se ao mês de Agosto ou à semana que agora terminou? Está a criticar o Presidente ou a atacá-lo com base em algo que só os dois sabem?

É evidente que esta abordagem consubstancia uma teoria da conspiração. Mas o que é tudo se isto senão uma imensa conspiração. Seja qual for a verdade, que o Presidente está a usar a mentira para abater Sócrates ou este está a saber as cores das cuecas de Cavaco ou se a Dra. Maria usa Wonderbra, estamos perante uma imensa conspiração política capaz de abalar os fundamentos da democracia.

Quem são os beneficiados com todo este processo? É evidente que alguém quer ganhar as eleições a qualquer custo, diria mesmo que alguém as precisa de ganhar. Será Sócrates ou a Dra. Manuela.

É evidente que a Dra. Manuela não passa de um peão, quem quer ganhar estas eleições é Cavaco Silva e José Sócrates.

Depois de tudo o que já sucedeu Sócrates tem em termos pessoais pouco a perder com um derrota eleitoral, já lhe vasculharam a vida e o processo Freeport já deu o que tinha a dar. O mesmo não se pode dizer de Cavaco Silva e, principalmente, da seita cavaquista que o rodeia. Uma derrota eleitoral nas legislativas poderá significar uma derrota quase certa nas presidenciais. Seria o enterro definitivo do cavaquismo e, talvez pior do qu isso, a impossibilidade de abafar o caso BPN.

Uma coisa é certa, ainda um canhalha à solta e não tenho grandes dúvidas de sobre quem é o dito.