Antes de proceder a qualquer beatificação ou canonização a Igreja Católica designa um “advogado do diabo”, alguém que vai tentar encontrar no candidato a beato alguma mácula que o chumbe nessa pretensão. É evidente que nem sempre o Vaticano é muito exigente nas suas beatificações e nos últimos anos o negócio da criação de santos e beatos não em sido sujeito a regras muito exigentes.
Tal como sucede com as beatificações e as canonizações a eleição de alguém para ter lugar no panteão nacional deve obedecer a critérios rigorosos, não porque todos tenham de ser santos como o D. Nuno Álvares, não porque quem mereça tal destaque tenha de ser um modelo de virtudes, mas porque quem está no panteão nacional deve ter dado muito ao seu país tendo tido uma vida sem hábitos muito reprováveis.
Aquilo a que o país assistiu nos últimos dias, a uma exaltação colectiva da nação iniciada com uma intervenção presidencial de apelo à emoção e à exaltação nacional não é o ambiente mais adequado para tomar algumas decisões para a história de um país. E muito menos é aceitável que alguém tenha lugar no Panteão Nacional graças a uma petição de um jornal, como se fosse a mesma coisa que decidir se foi golo com um chip na boa.
Eusébio foi um bom futebolista? Foi uma pessoa agradável para os seus amigos? Foi uma figura simpática? Merecia ter ganho mais do que o Benfica lhe pagou? Devia ter sido poupado à humilhação de jogar na segunda divisão? Era um bom colega de equipa? Era conhecido em todo o mundo? Os ingleses gostam muito dele? A resposta a todas estas perguntas é sim.
Mas há outras perguntas que terão como resposta sim ou não e se fosse designado advogado do diabo diria não ou, pelo menos não diria sim à transladação dos restos mortais para o Panteão Nacional. Isso apesar de ser benfiquista, de considerar que Eusébio foi o melhor benfiquista do mundo e de pensar que sem Eusébio o Benfica estaria muito aquém do que é hoje.
Eusébio foi um grande futebolista, da mesma forma que há no nosso país grandes profissionais de muitas profissões. Mas porque razão os jornais não fazem petições para que cientistas, prémios Nobel, engenheiros e muitos outros profissionais que se destacaram na sua profissão tenham o seu lugar no Panteão Nacional. Até há quem insinue que por ser conhecido em todo o mundo como um bom futebolista o país ganhava imenso, mas a verdade é que muitos dos que conheciam o Eusébio graças ao mediatismo de Portugal conheciam Portugal. Lá porque o taxista australiano saiba quem era o Eusébio isso não quer dizer que bata palmas a Portugal e vá a correr comprar uma garrafa de Mateus Rosé.
Eu também bato palmas a muitos jogadores estrangeiros e estou-me nas tintas para o país onde nasceram. Esta abordagem feita por muito boa gente, desde jornalistas ao Bernardino Soares não passa de uma parolice tipicamente nacional reveladora de um ruralismo cheio de complexos de inferioridade, que nos leva a avaliar a nossa valia através da simpatia estrangeira, algo inaceitável num país que esteve presente em todos os continente e foi uma das maiores potencias na história da humanidade. Era o que faltava que para que este povo tenha orgulhoso seja necessário que um qualquer chinês ou japonês diga que não sabe onde fica Portugal mas conhece o Eusébio ou o Ronaldo.
Eu também bato palmas a muitos jogadores estrangeiros e estou-me nas tintas para o país onde nasceram. Esta abordagem feita por muito boa gente, desde jornalistas ao Bernardino Soares não passa de uma parolice tipicamente nacional reveladora de um ruralismo cheio de complexos de inferioridade, que nos leva a avaliar a nossa valia através da simpatia estrangeira, algo inaceitável num país que esteve presente em todos os continente e foi uma das maiores potencias na história da humanidade. Era o que faltava que para que este povo tenha orgulhoso seja necessário que um qualquer chinês ou japonês diga que não sabe onde fica Portugal mas conhece o Eusébio ou o Ronaldo.
Eusébio fez grandes jogos contra a Inglaterra ou a Alemanha mas isso não é bem a mesma coisa que ficar entalado na porta do castelo para impedir a entrada do invasor, ou, como sucedeu com muitos portugueses quase esquecidos, morrer nas trincheiras da Grande Guerra. Tivemos grandes soldados que morreram, cientistas que deram importantes contributos para a humanidade, escritores que escreveram obras-primas enquanto viveram, grandes maestros, exploradores que atravessaram a Amazónia para definir as fronteiras desse grande país que é o Brasil, grandes navegadores que cruzaram o mundo em navios em que muitos teriam medo de ir a Cacilhas, a esmagadora maioria não teve lugar no Panteão Nacional.
Eusébio foi alvo de uma grande injustiça pecuniária mas isso é responsabilidade dos dirigentes do Benfica e da Federação, que pagaram os seus brilhantes jogos de futebol ao preço da uva mijona, umas camisas Triple Marfel e um par de sapatos por vitórias. Mas convenhamos que para estar no Panteão Nacional é preciso mais, muito mais do que ter um jeito natural e fora de série para dar chutos na bola. Uma coisa é eu gostar do Eusébio, ver e voltar a ver os vídeos dos seus golos, lamentar a sua morte e prestar-lhe homenagem pelo desportista que foi, outra é considerar que deve ter lugar no Panteão Nacional.
Anda por aí muita exaltação nacional, uma boa parte dela estimulada por políticos e por jornalistas, uns porque se aproveitaram da morte de Eusébio para melhorarem a sua própria imagem e os outros porque viram no funeral um óptimo negócio publicitário. Já não se pode dizer tudo o que se pensa e nem mesmo aquilo que era público, gente sem escrúpulos lançou um tsunami de exaltação nacional que impede uma reflexão séria. De repente o estádio da Luz deve chamar-se Eusébio, o parlamento deve decidir sem discutir a transladação de Eusébio para o panteão nacional e, por este andar, quem não puser o nome de Eusébio ao próximo filho corre um sério risco de perder o direito à nacionalidade portuguesa.