quinta-feira, novembro 23, 2017

SE PENSARMOS COMO A DIREITA...



"Todos estes objectivos devem ser cumpridos para aumentar a capacidade de o país investir onde é necessário. Se queremos investir mais na qualidade da educação, na qualidade do sistema de saúde e nos serviços públicos não podemos consumir todos os recursos disponíveis com quem trabalha no Estado"

Estas palavras poderiam ter sido ditas por Passos Coelho para justificar a austeridade, aliás, de uma ou outra forma quase todas as personalidades as têm dito. A mensagem é clara, o que se gasta com os funcionários é tirado da educação, da saúde e nos serviços públicos, isto é, a despesa com os funcionários prejudicam o país. E prejudica duplamente, porque estas palavras são seguidas de outras: 

"Temos de manter essa linha. É preciso responsabilidade para que haja irreversibilidade nos passos dados por este Governo"

Isto é atender aos funcionários é fazer perigar a linha de progresso para o país. Esta foi a linha de pensamento do governo de Passos Coelho, foram estes os argumentos usados pelo mesmo Passos Coelho contra todas as medidas que considerou reversões. Mas não foi Passos Coelho que proferiu estas palavras, numa linha seguida pela direita desde Cavaco Silva, de desvalorização e de estigmatização dos funcionários públicos. Quem proferiu estas palavras foi o primeiro-ministro António Costa.

Ao ouvir António Costa dizer estas alarvdades vieram-me à memória outras palavras, estas bem mais profundas e sábias, proferidas pelo mesmo António Costa:

“Se pensarmos como a direita pensa, acabamos a governar como a direita governou”

Estávamos em julho de 2014, António Costa falava na apresentação da sua candidatura às primárias do PS na cidade do Porto. O alvo desta frase er António José Seguro.

Antes de mais, convinha lembrar que é António Costa e o PS que estão em dívida para com os funcionários públicos e não estes que devem estar gratos pela generosidade governamental. Tudo o que o governo de António Costa deu aos funcionários estava obrigado a dá-lo, tudo o que foi tirado aos funcionários e que o governo tem vindo a devolver às mijinhas foi declarado ilegal pelo Tribunal Constitucional.

Portanto, António Costa devia estar a dizer que o país está em dívida com aqueles que á margem da legalidade ficaram sem subsídios de férias e de Natal, sem uma parte substancial dos seus vencimentos mensais, que tiveram de trabalhar mais horas e dias de férias sem qualquer recompensa e têm estado pacientemente calados em nome do país. Cavaco chegou a cortar nos vencimentos mas pagou-os sob a forma de títulos do Tesouro, o governo de direita de Espanha devolveu os cortes que fez, por cá e apesar de tem sido declarado ilegais os cortes persistiram .

Se António Costa fizer bem as contas ao seu sucesso no reequilíbrio das contas públicas vai perceber que está em dívida com aqueles que agora parece considerar gulosos, a maior parte do reequilíbrio orçamental conseguido tanto pelo governo de Passos como de Costa foi conseguido com a persistência dos cortes.

Não vale a pena dizer que o crescimento económico em 2015 resultou da decisão do TC que obrigou o governo de então a devolver pensões e agora sugerir que estamos perante um milagre resultante de uma mezinha especial. Os funcionários devem a este governo o fim de uma estratégia de desvalorização do seu trabalho, quanto a tudo o resto que Costa julga ter oferecido aos funcionários foi decisão do Tribunal Constitucional.

Já agora convinha explicar a António Costa que "investir mais na qualidade da educação, na qualidade do sistema de saúde e nos serviços públicos" não é apenas comprar tijolos e os serviços públicos não são robots, como sugere a direita quando se queixa que a maior parte da despesa do Estado é feita com os funcionários, como se estes fossem uns parasitas. Enfim, como alguém disse em 2014 “Se pensarmos como a direita pensa, acabamos a governar como a direita governou”.