terça-feira, novembro 14, 2017

UMAS NO CRAVO E OUTRAS NA FERRADURA



 Jumento do Dia

   
Procuradora-Geral da República

É mais do que óbvio que a Tecnoforma embolsou dinheiro, a dúvida estava em saber se o fez de forma fraudolenta ou não e como conseguiu aceder aos fundos comunitários. É mais do que óbvio que o envolvimento de políticos neste tipo de negócios visa conseguir facilidades e a presença de personalidades como Relvas e Passos Coelho acabou por se tornar um incómodo.

Agora o Ministério Público enfrenta uma situação a que não está habituado, uma entidade europeia altamente qualificada considerou fraude aquilo que o MP mandou arquivar, depois de arrastar os pés. A Procuradora-Geral da República não sai bem deste processo, tanto mais que se fizeram demasiados silêncios, num país onde parece que os jornalistas acedem aos processos em segredo de justiça com mais facilidade do que os próprios investigadores.

Parece que tudo ficou limpinho e com o arrastar dos pés tudo prescreveu, desta vez não há nada a investigar, para sorte do Inspetor Rosário, do super juiz e do fiscal de Braga. Ou não há crime ou onde se suspeita que tenha havido tudo prescreveu, como diria o Jorge Jesus tudo limpinho, limpinho, limpinho! O problema é que muitos portugueses irão pensar ou sugerir que há ex-primeiros-ministros de que se presume a culpa e há outros ex-primeiros-ministros de que se presume da inocência. Quer a senhora Procuradora-Geral queira ou não queira, serão muitos a questionar porque motivo uma transferência de meia dúzia de euros na CGD  levou a prisões e ao mega Caso Marquês, enquanto os milhões da Tecnoforma foram  gentilmente arquivados.

«Os procuradores que conduziram, em dois processos distintos, os inquéritos à actividade da empresa Tecnoforma e os investigadores do gabinete anti-fraude da Comissão Europeia (OLAF) dificilmente podiam estar mais em desacordo. Os primeiros, no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e no Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra (DIAP), não encontraram nada de particularmente grave na actuação da empresa de que Pedro Passos Coelho foi consultor e administrador. Os segundos, acompanhados pela respectiva hierarquia, não hesitaram em classificar como fraudulenta a conduta da Tecnoforma - razão pela qual entendem que a empresa deve restituir aos cofres europeus o montante de 6.747.462 euros. A decisão final sobre esta proposta ainda não foi tomada.

Respondendo a um pedido de apoio do DCIAP, onde decorria um inquérito aberto em 2012, na sequência das notícias então divulgadas pelo PÚBLICO, o OLAF disponibilizou dois dos seus inspectores de nacionalidade portuguesa. Ambos são veteranos na investigação de fraudes na obtenção e utilização dos fundos europeus e ambos estavam já a trabalhar no caso Tecnoforma, no âmbito de um inquérito do OLAF desencadeado por uma queixa da eurodeputada Ana Gomes, com base nas mesmas notícias.

Eventual abuso de poder de Relvas prescreveu
DIAP ignorou Bruxelas
Quando o pedido de assistência foi dirigido pelo DCIAP ao OLAF, em meados de 2013, estava em curso, além do inquérito daquele departamento especializado do Ministério Público (MP), uma outra investigação sobre a Tecnoforma, que corria no DIAP de Coimbra.

No DCIAP avaliava-se o eventual favorecimento da empresa por parte de responsáveis políticos, entre os quais Miguel Relvas, secretário de Estado responsável pelo programa Foral, ao abrigo do qual a Tecnoforma foi financiada entre 2000 e 2006. Em causa estava também a forma como esses financiamentos, nacionais e europeus, foram utilizados pela empresa. Em Coimbra investigava-se igualmente o possível favorecimento da Tecnoforma, e a forma como foram geridas as verbas atribuídas a um projecto de formação de pessoal para os aeródromos e heliportos municipais da região Centro - um dos muitos que lhe foram aprovados naquele período.

No caso do DCIAP, a investigação esteve praticamente parada cerca de dois anos, até meados de 2015, altura em que o OLAF concluiu a sua investigação. Depois disso, e apesar de o inquérito ter sido classificado como “urgente” pela direcção do DCIAP, passaram-se mais de dois anos até que, em Setembro passado, o processo foi encerrado e arquivado, com conclusões em grande parte contrárias às do OLAF.

Falsificações também prescreveram
Em Coimbra ­tudo se passou como se o procurador encarregue do inquérito ignorasse que os especialistas da Comissão Europeia estavam a investigar o caso - facto esse amplamente noticiado pela imprensa portuguesa em Maio de 2013.

Em Junho do ano seguinte, 13 meses antes de o OLAF concluir a sua missão, o magistrado subscreveu o despacho de arquivamento do processo sem fazer qualquer referência à investigação de Bruxelas. Por um lado, explica no documento, “não se conseguiu comprovar” o favorecimento da Tecnoforma por parte de Miguel Relvas, ou de qualquer outra personalidade do PSD. Por outro, acrescenta, verificou-se que a candidatura ao financiamento do projecto relativo aos aeródromos e heliportos “correspondia a uma proposta de formação que veio a ser regular e efectivamente concretizada”.

“Fraude”, concluiu o OLAF
Com o arquivamento do inquérito do DCIAP, em Lisboa, foi finalmente possível conhecer o resultado da investigação do OLAF, cujo relatório final se encontra junto aos autos. A subscrevê-lo, além do director Nicholas Illet e de  Sweeney James, chefe de uma das três unidades especializadas na investigação de fraudes nos fundos agrícolas e estruturais, estão os investigadores Cláudia Filipe e Artur Domingos.

A primeira, antes de entrar para o OLAF, era técnica superior principal do Instituto Financeiro para o Desenvolvimento Regional, um dos três organismos que se fundiram na actual Agência para o Desenvolvimento e Coesão (ADC), o instituto público que é responsável em Portugal pela coordenação dos fundos europeus. O segundo era inspector superior principal da Inspecção-Geral de Finanças (IGF), em comissão de serviço como especialista do Núcleo de Assessoria Técnica da Procuradoria-Geral da República, quando foi para o OLAF, em 2001.

E o que é que concluiu a equipa à qual o Ministério Público pediu ajuda por via da complexidade dos regulamentos comunitários e da experiência do OLAF nestes casos? Desde logo concluiu que “foram cometidas graves irregularidades, ou mesmo fraudes, na gestão dos fundos europeus” atribuídos, entre 2000 e 2013, aos projectos da Tecnoforma e a outros cujo titular foi a Associação Nacional de Freguesias (Anafre), mas cuja execução foi sub-contratada, em 2006, à empresa de que Passos Coelho era administrador. Parte desses fundos prendem-se com o programa Foral, mas a fatia mais importante está relacionada com o Programa Operacional do Potencial Humano (POPH), que vigorou entre 2007 e 2013.

No total, contabiliza o relatório do OLAF, “o montante a recuperar” pelas instituições europeias, devido às irregularidades detectadas, ascende a 6.747.462 euros, provenientes do Fundo Social Europeu. Desse valor, 1.921.340 euros correspondem à intervenção da Tecnoforma no programa Foral; 1.027.178 aos projectos desenvolvidos em parceria pela Tecnoforma e pela Anafre; e 3.798.943 aos projectos da empresa aprovados pelo POPH. De acordo com os autores do relatório, “os factos enunciados podem constituir infracções penais previstas no Código Penal Português”.

De fora das conclusões do OLAF ficam os cerca de 2,7 milhões de euros correspondentes aos subsídios pagos à Tecnoforma com verbas do Estado Português e cuja correcta utilização deverá ser aferida pela Inspecção-Geral de Finanças.

Em concreto, os investigadores da União Europeia dizem coisas como esta: “Na maioria dos projectos auditados, a empresa inclui os custos de amortização dos seus imóveis, ou as rendas das instalações em que funcionam os serviços administrativos e financeiros, a administração, os serviços de reprografia e as salas de formação onde têm lugar outras formações sem qualquer relação com as formações abrangidas por estes projectos. Todas as despesas relacionadas com o funcionamento das suas actividades são imputadas aos projectos, embora resulte das demonstrações financeiras e económicas que uma parte muito significativa da sua actividade tem lugar em Angola.”

“Carrocel financeiro”
A título de exemplo, o OLAF indica que as despesas listadas nas contas desses projectos a partir de 2004 envolvem casas de que a empresa era proprietária em Angola, bem como “veículos topos de gama, frigoríficos, arcas congeladoras, placas de aquecimento, televisores, geradores, máquinas de lavar roupa, colchões, armários e quadros, etc.” A apresentação destes custos para cofinanciamento pelos fundos europeus, lê-se no relatório, “parece que tem por objectivo aumentar os lucros da empresa”. 

Ainda ao nível das despesas imputadas aos projectos auditados, o documento aponta situações irregulares de duplicação de custos, que figuravam simultaneamente em rubricas de serviços contratados a terceiros e nas despesas atribuídas aos serviços da Tecnoforma. Analisando as relações entre a empresa e a Oesteconsult, sociedade à qual contratou a execução da contabilidade dos projectos, o OLAF considera que o facto de as duas empresas contabilizarem simultaneamente os créditos e as dívidas, quando os pagamentos ainda não tinham sido feitos, representa “uma prática deliberada e previamente acordada, com vista a beneficiar indevidamente a Tecnoforma”.

Os investigadores sustentam, com base nos regulamentos comunitários, que estas situações, para lá de representarem “graves irregularidades”, constituem “manifestamente uma manobra fraudulenta lesiva dos interesses financeiros da União Europeia”. Em conclusão, salientam, os factos “demonstram claramente que as duas empresas criaram um sistema fraudulento (carrocel financeiro) com o objectivo de receber indevidamente os fundos da União Europeia”. Face aos dados recolhidos, entendem mesmo que “se pode colocar a questão da efectividade da prestação de serviços” cujos custos foram imputados aos projectos.

Noutros casos, designadamente relacionados com os projectos cuja execução a Anafre contratou à Tecnoforma, o relatório admite que a empresa tenha emitido facturas “para serviços não existentes, ou com montantes inflacionados, a fim de obter os fundos de forma fraudulenta”. Nestes projectos, a Tecnoforma subcontratou a LDN, uma consultora onde trabalhara Passos Coelho e que era propriedade de Luis David Nobre, um antigo vice-presidente da JSD. De acordo com o OLAF, também a relação entre estas duas empresas “indicia a existência de um carrocel financeiro, em que o prestador de serviços (LDN) inflaciona as facturas e subsequentemente entrega os cheques em forma de restituição”.» [Público]

 Dúvidas que me atormentam

Se o MP tivesse formulado uma acusação contra Passos Coelho e a OLAF viesse agora ilibá-lo, o ainda líder do PSD estaria tão caladinho, ele mais o Amorim e outros que não se lhes pode meter uma palhinha que surgem logo a fazer declarações?

      
 Um Simplex pessoal
   
«António Figueiredo, ex-presidente do Instituto dos Registos e Notariado e principal arguido da Operação Labirinto, que investiga alegada corrupção nos vistos gold, disse nesta segunda-feira de manhã, em tribunal, que toda a ajuda que deu a amigos para que estes conseguissem autorizações permanentes de residência em Portugal teve como objectivo “dar uma imagem acolhedora da administração pública”.

Foi através deste antigo dirigente que os processos para a obtenção de vistos que diversos cidadãos de nacionalidade chinesa tinham no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras foram acelerados ou mesmo dispensados de serem instruídos com toda a documentação exigida por lei. 

António Figueiredo responde agora pelos crimes de corrupção, tráfico de influência e prevaricação. Continuará a prestar depoimento da parte da tarde. “Havia aqui uma componente de serviço público, independentemente de estar a ajudar um amigo”, justificou o ex-dirigente, salientando o contributo que com isso deu para o desenvolvimento do país. Apesar de o julgamento ter começado há nove meses, é a primeira vez que o principal arguido presta declarações.

“Era esse o conceito que eu tinha, ajudar quem precisa”, disse, acrescentando que chegou a fazer o mesmo com pessoas que não conhecia de lado nenhum. Não negou que, a certa altura, eram as secretárias quem tratava dos processos dos amigos.» [Público]
   
Parecer:

Vale a pena acompanhar este julgamento.
   
Despacho do Director-Geral do Palheiro: «Pergunte-se a Marques Mendes se vai testemunhar.»