Uma das características mais curiosas dos comunistas portugueses é a atitude que têm em relação a quem ouse dirigir-lhes uma crítica, podemos ser anti-tudo mas se rejeitarmos o seu modelo de sociedade somos logo apelidados de “anti-comunistas primários”, com se nos estivessem a lançar o estigma de hereges ou de anti-cristos. Se não formos “democratas” (a designação dada aos não comunistas simpáticos) somos condenados à fogueira, casos perdidos sem direito a lugar no seu reino dos Céus.
Se critico violentamente os partidos, personalidades, entidades ou instituições que constam no rol dos adversários do PCP ouço alguns elogios e os textos multiplicam-se por mail, mas se critico o PCP a caixa de comentários enchem-se de comentários de baixo nível, aparecendo sempre a inevitável acusação de “anti-comunista primário”. Os nossos amigos não apreciam a discussão de ideias ou de projectos, ou se está de acordo com os seus objectivos ou reagem com o recurso à ofensa.
No léxico do PCP os “anti-comunistas primários” estão para além do lúmpem proletariado. Há os comunistas e, entre estes, a classe operária que por não ter sido conspurcada pela riqueza tem as funções de líder do proletariado. Depois estão os que não sendo comunistas são simpáticos para com o PCP, aquilo que no passado foi o MDP/CDE, são os designados por “democratas”. Por fim, estão os outros e de entre estes os piores de todos, os que ousam dizer não ao PCP, esses são os perigosos, não são reeducáveis nem irrecuperáveis, são os “anti-comunistas primários”.
Como se adquire o horrível estatuto de “anti-comunista primário”? Cometendo aquilo a que a igreja designa como “pecado mortal”, por exemplo, da mesma forma que a igreja nos condena ao inferno se não respeitarmos o “não matarás”, os nossos amigos do PCP cosem-nos o símbolo de “anti-comunista primário” na lapela se dissermos "não, obrigado" ao seu paraíso.
Dizer que a CGTP devia ser a única central sindical e admitir que o controlo exercido pelo PCP é uma garantia da defesa dos interesses dos trabalhadores dá-nos quase direito a uma entrada à borla na Festa do Avante mais uma sandes de courato no pavilhão do Centro de Trabalho do Feijó, mas insinuar que o controlo da central visa condicionar as lutas laborais aos objectivos políticos do PCP já nos condena à excomungação.
Constatar que a China apresenta progressos ou que Cuba é a terra dos nossos sonhos cai bem aos militantes do PCP que nos passam a considerar pequeno-burgueses recuperáveis, mas se lembrarmos que os trabalhadores chineses vivem num capitalismo sem regras ou que os agricultores cubanos só agora conquistaram o direito de comparar um par de botas fica logo o caldo entornado.
Bem, confesso publicamente que o adjectivo de “anti-comunista primário” me dá gozo, se sou excomungado porque não partilho das simpatias de Bernardino Soares pelo regime absurdo da Coreia do Norte, se considero dos ditadores de Myanmar criminosos de delito comum, se digo que há cubanas a prostituírem-se para poderem comer ou que os trabalhadores chineses são mais explorados do que os portugueses e me designam por “anti-comunista primário” o que posso dizer? São bem capazes de ter razão, a minha reacção contra as ditaduras, a transformação dos trabalhadores em escravos e os regimes absurdos é mesmo primária, se isso é ser anti-comunista então sou mesmo.
Assim sendo sugiro aos comentadores que julgam ofender-me dessa forma que sejam mais imaginativos.