A melhoria da eficácia da DGCI na cobrança das dívidas fiscais foi um dos maiores passos dados pelo fisco na última década, ao acabar com a total impunidade dos contribuintes incumpridores o fisco promoveu mais justiça fiscal. Uma boa parte da crise financeira do Estado, cujos custos são suportados apenas por uma parte dos portugueses, justifica-se pela existência de dívidas fiscais. Uma parte destas dívidas justifica-se pela incapacidade de cumprimento, mas muitas resultaram da ineficácia do fisco que permitia a alguns contribuintes apostar na sua prescrição, graças à prestimosa ajuda de conselheiros fiscais e a uma imensa teia de "amigos" diligentes.
Além de contribuir para que haja mais justiça fiscal, a recuperação das dívidas fiscais permitiu a superação da crise financeira do Estado, sem a cobrança dessas dívidas não só o Estado teria que reduzir a despesa a qualquer custo, como seria forçado a aumentar os impostos, mergulhando a economia numa profunda recessão. Seriam os mais pobres, que normalmente pagam os impostos, a suportarem ainda maiores sacrifícios. Ao contrário do que se tem dito na comunicação social, este sucesso deve-se a estratégias delineadas muito antes do dr. Macedo ter chegado à DGCI e ao esforço dos funcionários do fisco.
Então porque anda tanta gente preocupada com as penhoras?
Quando o director-geral dos Impostos era o dr. Macedo e a eficácia do fisco em distritos importantes como Lisboa era quase nula não se ouviram protestos. O jornal Público, que agora anda tão preocupado, dedicava sucessivos elogios ao dr. Macedo nos seus editoriais justificando o seu vencimento abusivo e ilegal, o Provedor de Justiça tinha uma vida tranquila, os bancos não cometiam erros nas penhoras, alguns conhecidos fiscalistas desfaziam-se em elogios ao homem do Millennium. O que mudou então? Não foi apenas o facto de o actual director-geral não contar coma "boa imprensa" do seu antecessor.
Quando as penhoras deixaram de atingir apenas cidadãos anónimos da província, para passarem a atingir empresas com domicílio fiscal nos bairros fiscais no centro da capital e noutras cidades importantes do país caiu o Carmo e a Trindade. O que era eficácia na gestão passou a ser prepotência, o que era gestão moderna passou a ser abuso, o que era um milagre do fisco foi transformado numa nódoa do fisco. Paulo Portas veio em defesa dos oprimidos pelo fisco e o novo secretário de Estado juntou a sua voz em defesa dos contribuintes torturados pelo fisco, ainda que muitos deles de contribuinte só tenham o número de identificação fiscal.
A verdade é que as dívidas fiscais eram um bom negócio para todos, desde os corruptos aos escritórios de advogados e fiscalistas, alguns com presença permanente nas televisões, que mais não são do que gestores de influências. Estamos a falar de milhares de milhões de contos, de dezenas de milhares de processos, uma imensidão de trabalho e de dinheiro que ao longo de anos enriqueceu muita gente à custa da ineficácia consentida do fisco. Uma boa percentagem dos milhões de dívidas que iam prescrevendo graças a expedientes que serviam para enriquecer umas centenas de personagens que viviam da ineficácia do fisco.
Enquanto assim foi ninguém se queixou do comportamento do fisco, enquanto uns pagavam mais impostos para que outros escapassem às suas obrigações ou enriquecessem à custa da gestão de influências, o fisco até era uma instituição simpática.
É evidente que o fisco comete erros, mas os erros nas penhoras são uma gota de água se comparados com os cometidos noutros domínios da acção do fisco, basta contabilizar as dezenas de milhares de reclamações graciosas que são feitas. O que motiva muitas das personalidades não é a preocupação com os contribuintes faltosos, é a perda de um negócio onde se ganhavam milhões com uns telefonemas e uns envelopes. Seria interessante, por exemplo, comparar as reclamações do fisco às recebidas por empresas como a EDP ou a PT. Pois, mas o Provedor de Justiça não tem jurisdição sobre o sector privado...
Lamenta-se que o inexperiente secretário de Estado, advogado de profissão, não tenha percebido ou querido perceber esta realidade, tendo feito intervenções públicas que conseguiram desmotivar e revoltar a máquina fiscal. Resta agora saber se as intervenções “simpáticas” do governante terão assim tanta eficácia eleitoral, ou se a quebra das receitas fiscais poderão resultar numa derrota inesperada de Sócrates nas próximas eleições legislativas. Há muito a fazer para melhorar a forma como o fisco trata os cidadãos, mas não é com discursos simpáticos que se resolvem os problemas, é com ideias, políticas e medidas. O que está a ser feito para modernizar e simplificar as relações entre os contribuintes e o fisco? O que é feito do famoso call center que o dr. Macedo anunciou três vezes à comunicação social? Qual a continuidade do esforço de mudança de imagem na sequência de uma cerimónia em que o dr. Macedo inaugurou um serviços na rua dos Correeiros, depois de lhe dar uma de mão de tinta e mudar o logotipo da DGCI?
A última vez que as receitas quebraram como sucedeu no primeiro trimestre deste ano o ministro das Finanças era Pina Moura, durou pouco mais de um mês desde a divulgação da execução orçamental de Maio. Os seus últimos dias de governo foram dedicados a inventar 50 medidas para reduzir as despesas do Estado, daí em diante faltava dinheiro para tudo na Administração Pública. O governo de António Guterres durou seis meses.
Dizem as más-línguas que um director de serviços chegou a ter que meter na rua um advogado que tempos depois veio a ser governante, esperemos que José Sócrates lhe faça o mesmo.