Vale a pena reflectir sobre o que disse Cavaco Silva, em Nova Iorque, a propósito da crise financeira :
"Funciona [a economia de mercado] se houver uma regulação. Não podia funcionar segundo uma regra geral da mão invisível. Por isso é que existem entidades reguladoras, por isso é que existe responsabilidade dos governos. Alguém disse, a democracia é o pior dos regimes, excepto todos os outros; a economia de mercado é a pior, excepto todas as outras". [Público]
Com esta afirmação Cavaco Silva põe o dedo na ferida e afirma que o funcionamento dos mercados não iliba os governos de responsabilidades. O Presidente não pretenderá defender o intervencionismo estatal nos mercados, mas é evidente que os governos e as democracias não poderão aceitar que possa ocorrer um colapso do sistema económico só porque os reguladores actuam com negligência e irresponsabilidade, como sucedeu nos EUA. Cavaco Silva deita por terra a tentativa de Pacheco Pereira e Manuela Ferreira Leite de usar a crise financeira para obter ganhos políticos.
Ainda no passado Sábado, num artigo publicado do Expresso, cujos argumentos eram decalcados de um artigo de Pacheco Pereira publicado no Público, Manuela Ferreira Leite defendia:
«Desta crise, vai certamente resultar o fortalecimento do papel das entidades reguladoras, como a forma mais apropriada de melhor proteger os cidadãos.»
«Por cá, tem-se actuado exactamente de forma oposta. Entende-se que é intervindo o Governo e, desta forma, desacreditando os reguladores que melhor se protegem os cidadãos. Além da falta de responsabilidade e sensatez, está-se perante o desnorte completo.» [artigos reproduzidos no Jumento]
No mesmo dia Pacheco Pereira escrevia no Púbico:
O ataque à regulação é mais do que um ataque à regulação - é um ataque à liberalização dos mercados que essas entidades são suposto regularem.
No mesmo artigo JPP defendia a tal mão invisível:
«Naturalmente, como muita gente acha, os "mercados" são maus e injustos, esquecendo-se que são os mercados que estão a acabar com o Lehman Brothers e bem, que são os mercados que estão a fazer aquilo que autores clássicos da economia liberal como Schumpeter sempre disseram que faziam, destruir, que a destruição provocada pelas crises é um mecanismo fundamental de crescimento e de inovação, de pujança do modelo económico do capitalismo. A "crise" não é o sinal da crise do liberalismo, mas sim do seu normal funcionamento, em sociedades e economias que incorporam o risco e os custos como parte do seu funcionamento normal, das regras do jogo dessa mão que Adam Smith dizia ser "invisível".»
Isto é, o mesmo JPP que defende os organismos reguladores e acusa o governo de intervencionismo dá o dito por não dito e associa a mão invisível ao funcionamento dos reguladores. É evidente que JPP não é economista, senão percebia que a existência de “regulação” é precisamente a negação da existência da mão invisível e que regular significa intervir e não propriamente auto-regular, como se viu agora nos EUA. A verdade é que os mercados financeiros revelaram-se manetas, a tal mão invisíel não actuou.
Resta a contradição entre a visão económica de Cavaco Silva que está em rotura com a posição de Manuela Ferreira Leite que em vez de estudar o assunto numa perspectiva económica preferiu os conselhos de filósofo avulso de Pacheco Pereira.