Eu ainda sou do tempo em que os ilustres da direita
portuguesa diziam que o Passos Coelho e o seu governo não estavam preparados, a
continuação do Miguel Relvas no governo era insustentável, que a coligação
estava no fim e que era quase inevitável um governo de iniciativa presidencial.
Imaginem que nesses tempos até havia Presidente da República, estava num palácio
ali para os lados de Belém onde, por estas alturas, o único presidente que
parece haver é o da Junta de Freguesia, isso se a junta ainda não foi extinta.
Era um tempo em que se dizia que o OE era uma desgraça, o
Gaspar ainda prometia crescimento no segundo semestre de 2013 e ninguém
questionava o brilhantismo intelectual do ministro das Finanças. Pois, esse
tempo longínquo que quase nos remete para a fundação da nacionalidade ocorreu há
duas, três semanas.
Agora tudo é diferente, o Cavaco deve ter ido apanhar banhos
de sol junto à Fonte Luminosa e parece ter desaparecido, se calhar foi ver os
golfinhos que terão aparecido no Tejo e terá sido levado pela corrente. O
Miguel Relvas já é um dos melhores ministros, até recuou menos na extinção de
freguesias do que a louraça na extinção de tribunais e já exibe aquele sorriso
que tanto me faz lembrar o ar simpático do talhante do meu bairro quando lhe
pedem um quilo de bifes do lombo.
O Portas voltou a desaparecer e o Marques Mendes já não se
queixa do assalto fiscal, voltou a ser o confidente oficial do governo e a
contar aos outros ministros aquilo que o Gaspar vai ditando ao Passos Coelho.
De um dia para o outro Passos Coelho está acima do imbecil,
aquele a quem os colegas chamam de Salazarzinho voltou a ser o melhor aluno da
turma e até Cavaco já ressuscitou, tudo porque quando a troika exigiu um plano
B face ao OE falhado o Gaspar informou o parlamento de que seria necessário
estudar as funções do Estado e depois dias depois o Passos chamou refundação à
coisa.
A direita teve um orgasmo colectivo, convencida de que com o
apoio do exército de ocupação conseguia vingar o 25 de Abril e forçar o povo a
aceitar uma nova Constituição, de preferência a que o rapaz da extrema-direita
escreveu a pedido do Passos Coelho. Os imbecis da direita estão convencidos de
que a democracia vai ser mesmo suspensa durante o tempo suficiente para o
Salazarzinho impor ao país uma nova Constituição. Até parece que andam todos
parvos, ou estarão com uma grande bebedeira?
É mesmo preciso uma grande bebedeira para que alguém acredite que pode mudar o regime, transformando numa farsa democrática contra a vontade da maioria dos portugueses. A direita idiota sonha com uma primavera marcelista, mesmo sendo eleitoralmente minoritária, sem polícias de choque ao seu serviço e com a brigada do reumático aposentada ou mesmo já devidamente embalada no cemitério do Alto de São João.