Aos poucos a direita portuguesa vai tentando branquear as
responsabilidades pelas opções, pelas consequências da gula pelo poder, pela
tentativa de “endireitar” a democracia portuguesa depois de quatro décadas de síndrome
de abstinência por falta de um regime ditatorial. O governo vai apagando as
suas opções extremista endossando para a troika a responsabilidade pelas suas
opções de política económica.
Mas a alteração de posição mais incrível, ou talvez não, é
de Cavaco Silva, um homem que sonhou ficar na história do país com o símbolo do
progresso, mas esbanjadas as transferências de fundos comunitários luta
desesperadamente por levar o mandato até ao fim, ainda que um dia destes tenha
de disputar influência política com o presidente da Junta de Freguesia de
Belém.
O homem que raramente tem dúvidas e que nunca se engana vem
agora admitir que se enganou nas suas previsões quando fez a sua mensagem de
Ano Novo de 2010. O homem que tudo fez para derrubar o governo anterior, que
traçou os cenários mais pessimistas, que ignorou ostensivamente a existência de
uma crise internacional para assacar todas as responsabilidades ao governo de
então, o homem que sempre que era questionado sobre a realidade económica
remetia os portugueses para os avisos que tinha feito em artigos, discursos ou
Facebook, o homem que tudo tinha escrito no seu site, enganou-se por defeito.
Compreende-se que Cavaco se tenha enganado e que agora tente
dizer que a situação é brutal, como se entre 2010 e finais de 2010 a história
de Portugal tivesse uma “branca”. Durante esses dois anos nada sucedeu, não
ocorreram eleições presidenciais, não se realizaram eleições legislativas, não
houve um chumbo do PEC IV porque Cavaco não tinha sido avisado, não houve um
discurso de vitória presidencial, não, nada sucedeu em Portugal.
Começa a ser tempo de Cavaco Silva perceber que se não vai
ficar na história como um grande Presidente não é por culpa de Passos Coelho não
estar à altura de o ajudar a terminar o mandato com dignidade, como ele um dia
ousou dizer que ia ajudar Mário Soares. É porque não tem perfil nem dimensão
política para o cargo. Os bons Presidentes são aqueles que exercem o mandato a
pensar no país, são aqueles que choram, que se enganam , que lutam pela
camisola.
Um Presidente que fala para dizer que avisou, que não consulta
o TC com o argumento que outros não consultaram, um Presidente que Preside a
pensar mais em si, é um Presidente que falhou. Não falhou apenas na mensagem de
Ano Novo, falhou como Presidente.