Se Cavaco ainda fosse Presidente da República é muito provável que tivesse explicado o crescimento económico de 2,8% ocorrido no primeiro trimestre como resultado das rezas e promessas da sua esposa à santinha da sua devoção. No ambiente de fervor religioso criado com a vinda do Papa Francisco não faltasse quem se esquecesse da opinião do papa sobre os milagres baratos e concordasse com Cavaco.
Marcelo, que vai a mais procissões, missas e peregrinações do que ia Cavaco, parece optar por uma posição mais agnóstica e explica o crescimento económico como um mero acaso, talvez resultado de uma combinação de estrelas mais favorável ou de uma qualquer outra causa desconhecida. Se em vez de adepto de Braga, talvez Marcelo defendesse, como se discutia há alguns anos atrás, que o crescimento inesperado se devia ao título do Benfica.
Em tempo houve que sugerisse que se todos os portugueses fossem para a beira-mar talvez o país se inclinasse. Não me admiraria se alguém viesse defender que o crescimento tenha sido estimulado pelo aumento da procura de telemóveis para tirara selfies com Marcelo ou, quem sabe, em consequência do bom ambiente em que se vive desde que Cavaco regressou a Boliqueime.
A ideia com que se fica das últimas declarações de Marcelo pedido para não se querer saber quem teve mérito, é a de que o crescimento económico resulta de um qualquer bom austral, ou foi o resultado inesperado de políticas económicas que não podiam ser mais contraditórias. A crer em Marcelo quando os médicos salvarem um doente que está à beira da morte e ao qual foram ministrados vários tratamentos, devem abster-se de querer saber qual o tratamento resultou e atribuir a cura ao acaso.
Esta opinião é do mais ridículo que já se ouviu, um país à beira do colapso consegue crescer e devemos abster-nos de tentar perceber o que nos trouxe tranquilidade, sugerindo de forma hipócrita que a evolução económica positiva é resultado de todas as políticas. Só não explicou se os efeitos retroativos do bom austral começaram com Passos ou ainda antes, já que pelo menos o crescimento das exportações começou antes do governo da direita.
M as a hipocrisia de Marcelo Rebelo de Sousa vai um pouco mais longe, não só diz que nos devemos abster de reconhecer o mérito de uma política económica, optando por considerar que todos contribuirão por igual, como diz que o sucesso é conjuntural e devemos transformá-lo em estrutural. Ora, se Marcelo acha que o crescimento resulta em simultâneo do congelamento e do aumento do salário mínimo, do corte brutal de vencimentos e da sua reposição, do corte abusivo das pensões e do regresso da ilegalidade, isso significa que para que o crescimento estrutural temos de adotar as duas políticas económicas.
Assim, sugiro a Marcelo que proponha que daqui para a frente haja alternância entre a Maria Luís e o Centeno, nos meses pares governa a Maria Luís para cortar vencimentos e pensos aterrorizando o país com mais medidas brutais se não comerem e calarem. Nos meses pares seria empossado o Centeno para eliminar as políticas da Maria Luís, nestes meses o Marcelo sairia à rua para servir muitos jantares aos sem-abrigo e tirar muitas selfies com o povo.