sexta-feira, junho 23, 2017

Os DDT da agricultura

Imagine que herdou 300 ha de terrenos sem aptidões agrícolas, algures no meio da serra ali para os lados de Góis ou da Pampilhosa da Serra. Trata-se de uma grande extensão, com difíceis acessos, de encostas pedregosas. No passado talvez pudesse plantar oliveiras ou mesmo semear algum cereal menos exigente, aveia ou centeio, para alimentação de animais. Nos dias de hoje esses terrenos não têm valor económico por não assegurarem padrões de produtividade compatíveis com os custos que a produção agrícola exige atualmente.

Resta deixar crescer o mato ou florestar, mas se crescer o mato pode ser acusado de não limpar os terrenos e ser multado por isso, quase que é forçado a florestar. Trezentos hectares é uma extensão com um terço da dimensão do Parque Florestal de Monsanto, a grande mancha verde da capital. Florestar uma área desta dimensão implica construir caminhos, limpar os terrenos, recorrer a máquinas e trabalhadores para fazer buracos, preparar o terreno e assegura a rega durante algum tempo, para além de adquirir milhares de pequenas árvores.

Resta escolher que árvores plantar, terá de escolher espécies vegetais resistentes aos fogos e de crescimento lento ou por espécies vegetais de crescimento rápido. as primeiras oferecem vantagens ambientais e ainda que sendo mais resistentes ao fogo não deixam de ser vulneráveis a incêndios, para além de doenças e pragas, mas nenhuma companhia de seguros aceita cobrir-lhes os riscos. A sua exploração só ocorrerá daqui a três ou quatro décadas, mas muito provavelmente as árvores só servirão para produzir lenha, isso se, entretanto, os ambientalistas não conseguirem uma lei que determina que essas espécies são protegidas, nesse caso a sua floresta servirá apenas para ornamento ambiental, cabe-lhe a si cuidá-la sem benefícios.

Tem uma boa alternativa, vai a uma empresa de celulose que lhe assegurará a plantação da florestas de eucaliptos a troco de uma parte da produção. Há ajudas públicas para a plantação do eucalipto e graças ao fato de se tratar de uma árvore de crescimento muito rápido em breve começará a receber receitas muito apreciáveis. 

Vai optar pelas espécies resistentes ao fogo ou pelo adorado eucalipto?

É óbvio que vai optar pelo eucalipto e é isso que explica que em poucas décadas temos uma percentagem de área com eucalipto provavelmente muito superior à da Austrália. Isso explica que tudo vale na plantação do eucalipto e que a estrada nacional 236 tivesses eucaliptos plantados quase até ao limite do alcatrão. Basta ir ver as fotografias de satélite do Google Maps para se ver que na região de Pedrogão e Góis há muitas estradas que quase não se deixam ver por estarem cobertas pelas copas das árvores.

Como é possível que as celuloses beneficiem deste ambiente favorável à sua atividades sem regras? Porque as celuloses estão para a agricultura como a banca estava para as finanças, se os banqueiros deram os donos disto tudo na economia e nas finanças, as celuloses são são os donos disto tudo no mundo rural. Da mesma forma que os ministros das Finanças se curvavam perante as exigências dos banqueiros, desde o Eng. Álvaro Barreto que quem manda nas florestas portuguesas são as celuloses.

Ainda há poucos dias o lóbi das celuloses, através da CELP, a sua Associação da Indústria Papeleira Portuguesa fez publicar anúncios pagos na imprensa criticando a reforma florestal, diziam que:

"A fileira industrial baseada no eucalipto tem sabido aproveitar os recursos naturais de que o país dispõe [...] utilizando uma espécie bem adaptada, e tem-no feito de forma exemplar, responsável e com total respeito pelo ambiente", argumentou a CELPA, defendendo que a proibição "prejudica os produtores florestais, provoca perda de competitividade da indústria da pasta e papel e contrai a economia do país".

O anúncio, que usa uma linha de argumentação muito semelhante ao das tabaqueiras em relação aos malefícios do tabaco ou das petrolíferas no que se refere ao aquecimento global, foi publicado no dia 21 de Abril, no mesmo dia Capoulas Santos, numa demonstração de grande preocupação com as críticas das celuloses, assegurava que continuaria a apoiar o eucalipto. Porque será que agora que se ouvem tantas vozes criticando os abusos das celuloses os senhores da CELPA que têm tanto dinheiro para pagar anúncios, optaram por um silêncio cobarde?