Parece que os magistrados vão decidir hoje se boicotam ou
não as eleições autárquicas, os tribunais e os defensores da legalidade decidem
se boicotam a democracia e o seu funcionamento. Um desastre? À primeira vista
dir-se-á que sim, mas na verdade e por mais incrível que pareça é um bom sinal,
um sinal de evolução do país.
Durante meio século de ditadura os nossos magistrados foram
homens felizes, não há memória de um pequeno contributo desta classe
profissional ter mexido um dedo contra os ditadores, nenhum se recusou a fazer
o que a PIDE lhes mandava fazer nos tribunais plenários, foram dos mais
disciplinados funcionários públicos do salazarismo. Se hoje já têm opinião e
questionam o poder é um bom sinal, é uma pena que só o tenham aprendido a fazer
em democracia, mas ainda assim é um bom sinal.
Também é um bom sinal que o líder do sindicato dos magistrados
em vez de ir fazer queixas a Belém reúna com os seus e decida lutas sindicais.
Os sindicatos servem para fazerem sindicalismo e se os sindicalistas em vez de
manobras políticas conduzem lutas sindicais não fazem mais do que a sua
obrigação. Se os magistrados sentem razões de queixa é também um bom sinal,
muito mau seria se todos os funcionários públicos tivessem sido maltratados e
os magistrados tivessem razões de felicidade. Ainda assim ganham muito mais do
que outros profissionais altamente qualificados do Estado.
Se estão zangados com o poder e fazem greve é um bom sinal,
ainda que seja ridículo ver juízes em greve, mas se os nossos juízes querem ser
parecidos aos do Burundi o problema é deles, nada está na Constituição que nos
impeça de fazermos as figuras tristes que bem entendermos. Mas é preferível
fazerem greve do que recolherem as despesas que os ministros fizeram com os
cartões VISA na esperança de meterem algum na cadeia. É um sinal positivo que
as lutas entre os magistrados se fazem com greves e não com detenções.
Também é um bom sinal que os magistrados em vez de fazerem
congressos de luxo com passeios para os acompanhantes, tudo com o alto
patrocínio do Ricardo Salgado e do BES, se reúnam numa sala modesta para
decidirem se fazem greve às eleições. Assim é tudo mais bonito e a justiça só
fica dignificada que os seus executores sirvam de exemplo. E um sinal de que os nossos magistrados estão
mais democratas e de que não tiveram por onde pegar o Costa.