terça-feira, fevereiro 22, 2011

A revolução cultural à portuguesa


A falta de alternativas políticas, a necessidade de os jornalistas produziram notícias chamativas, uma governação à vista e a desorientação geral face às dificuldades são factores que estão a desenvolver na sociedade portuguesa um ambiente de revolução cultural com os tiques que vimos na revolução cultural promovida por Mao na China.

De vez em quando elege-se um grupo culpado de todos os males, um grupo de contra-revolucionários burgueses, e é iniciada a perseguição. Um bom exemplo que ainda recentemente deu que falar é o número de deputados, como se o país pagasse a dívida soberana eliminando uma ou duas dúzias de lugares no parlamento. É evidente que ninguém se dá ao trabalho de fazer contas, inicia-se logo um processo de empalamento dos deputados, exibindo desde logo os que estão nas filas mais recuadas do hemiciclo. Ninguém se dá ao trabalho de reparar que há empresas municipais que nunca fizeram falta que gastam mais do que meio parlamento.

Há algum tempo o CDS contou as chefias da CP e promoveu o escândalo nacional das chefias, a partir de então criou-se a ideia de que em tudo o que é Estado há mais do que índios, políticos, comentadores e jornalistas passaram a dedicar-se a contar chefes. O governo aproveitou mais este tique maoista e o secretário de Estado da Administração Pública vestiu de imediato a farda de guarda vermelho e tornou-se no líder de mais este movimento purificador. Agora o objectivo é eliminar chefes, o objectivo é eliminá-los e enquanto isso não sucede deixam de se nomear ou reconduzir chefias. O resultado é que ainda antes de qualquer reestruturação no Estado milhares de técnicos qualificados já pediram a aposentação, vão ganhar tanto ou mais como aposentados do que ganhavam como chefes e o Estado perdeu alguns dos seus quadros mais qualificados. Daqui a um ou dois anos, quando esta vaga fundamentalista tiver passado, veremos muitos serviços públicos que foram decapitados durante esta revolução cultural a promover concursos porque ficaram sem quadros.

Se alguém parar para fazer contas depressa perceberá que o que dizem ter poupado não chega para pagar meio quilómetro da linha Poceirão-Caia, uma linha que não tirará um único cliente às companhias de low cost que voam entre Lisboa e Madrid, para compensar o custo de um décimo das borlas anunciadas por Sócrates para a sua nova auto-estrada em Trás-os-Montes ou para compensar a comparticipação do Estado na barragem do Tua que a troco de um aumento de 3% ou 4% da produção eléctrica vai destruir um dos locais com maior potencial turístico no norte do país, isto só para referir os projectos que foram notícia durante a semana passada.

E enquanto nós andamos armados em jovens guardas vermelhos a exibir as cabeças dos responsáveis por todos os nossos males, devidamente liderados por grandes líderes da revolução cultural como o Santana Castilho, secretário de Estado da Administração Pública, ou Jorge Lacão, ministro dos Assuntos Parlamentares, os grandes banqueiros e os administradores das grandes obras públicas vão esfregando as mãos de contentes porque enquanto os idiotas abraçam falsas causas eles vão beneficiando de chorudos apoios ao sitema financeiro ou das obras públicas faraónicas que vão sendo lançadas.