Começa a ser preocupante o meu desinteresse em torno do
interesse nacional, de nada serve argumentar, provar a incompetência, propor
alternativas, o país tem um governo que mais se assemelha a uma seita religiosa
do que a um governo que emana de um parlamento democrático. Veja-se o caso das obras de Miró, o governo não deu
qualquer explicação para as suas opções e até se escudou atrás de uma empresa
pública, e quando finalmente o secretário de Estado da Cultura vimos um funcionário
de Passos Coelho dizer banalidades, dar golpes baixos e usar de uma
argumentação que revela uns palmos abaixo do padrão de inteligência e
capacidade argumentativa do que se espera de um governante de uma qualquer
república das bananas.
A situação é bem mais grave do que a falta de diálogo ou de
convergência de que alguns tanto falam, é bem pior do que isso, Passos Coelho e
os seus não se limitam a desprezar as opiniões da oposição, isso é mau mas não
é grave pois o governo tem legitimidade para governar, ainda que seja
questionável se essa legitimidade ainda exista se o programa eleitoral foi um
embuste. O governo não se limita a desprezar as ideias da oposição, se é que
quer uns, quer os outros têm ideias, o desprezo despreza a opinião da
sociedade, ignora os sentimentos da população.
De nada serve haver a percepção de que o povo discorda desta
ou daquela medida, o governo despreza totalmente a opinião dos portugueses
convencido de que agora faz o que quer e quando tudo estiver esquecido recorre
a esquemas de propaganda para manipular a opinião pública, contando com isso
com jornalistas comprados pelas benesses governamentais ou pelos orçamentos publicitários
das empresas amigas e beneficiárias do poder, o que actualmente deverá
representar mais de 80% dos investimentos publicitários.
Um bom exemplo de como a máquina de propaganda governamental
conta com o apoio de empresários amigos é o tea party português, a fundação de
Manuel dos Santos. O merceeiro holandês recusa-se a pagar taxas alimentares,
beneficia de mais de 80 milhões de euros em benefícios fiscais, vai ser um dos
mais favorecidos com a descida do IRS e ainda recorre ao esquema dos benefícios
fiscais das fundações para criar o maior embuste intelectual do país. Se
juntarmos à Jerónimo Martins, a banca que é a beneficiária das política
governamentais, empresas que beneficiam da protecção do poder como as energias
ou as telecomunicações, percebe-se que à oposição pouco mais resta do que as
redes sociais para responder a este uso da propaganda que faz recordar outros
tempos e regimes tenebrosos.
Antes de Passos chegar ao poder os governos eram sensíveis
às opiniões que se faziam ouvir, os debates tinham impacto na acção
governamental. Agora o governo ignora tudo e todos e mesmo os debates a que têm
de ser sujeitos alguns diplomas governamentais são ignorados. O governo chama
os sindicatos mas não considera nenhuma das suas propostas, ignora o que se diz
na opinião pública, despreza-se o povo. Em Portugal há um visionário que é
detentor da única opinião e a que todos devem obedecer.
Neste ambiente de nada serve opinar, Paulo Portas sintetizou
a realidade ao responder às críticas Mário Soares dizendo que em democracia as
opiniões expressam-se no voto, isto é, durante a legislação não só a nossa
opinião não conta como temos o dever cívico de ficar calados. Enfim, talvez o
deputado Montenegro que acusou Sócrates de asfixia democrática possa agora
caracterizar esta nova situação em ao povo não serve de nada pensar e ele faz de
palhaço governamental pois ele não é deputado para dizer o que pensa, só pode
pensar porque precisa de pensar o que Passos Coelho deverá estar a pensar e
depois dizer o que Passos pensa para nós ficarmos a pensar que ele pensa alguma
coisa.