terça-feira, fevereiro 18, 2014

O regresso das ratazanas

Quando acordarmos deste pesadelo colectivo que o país enfrenta for ultrapassado talvez possamos avaliar o papel que cada personagem teve e na galeria dos candidatos a serem laureados com a admiração ou o ódio colectivo estará essa personagem estranha, franzina e espertalhona que é o Vítor Gaspar. Um não político que cresceu em gabinetes de gentes que considera que a democracia é um teatro de marionetas controlado por bancos, investidores e magos da economia escondidos em edifícios cinzentos.
  
Vítor Gaspar fez a passar uma mensagem sobre a sua pessoa que fazia lembrar Salazar, o mago da finança. O homem austero, o senhor totalmente dedicado à nação, o economista respeitado pelo seu alor intelectual e, acima de tudo isto, o rapaz humilde, netinho da dona Prazeres, uma modesta senhor de Manteigas.
Gaspar afirmava-se como o não político por oposição aos políticos que nada sabem do que fazem, os outros tinham por tarefa falar, a ele cabia a superior função de pensar. Ele decidia e o Passos assumia as suas decisões, ele era o homem de confiança da troika que brincava com os três estrangeiros exibindo o seu primeiro-ministro.
  
Vítor Gaspar era o homem rigoroso que se necessário ridicularizava os colegas, alguém se encarregou de contar pormenores de uma reunião do Conselho de Ministros em que terá humilhado Álvaro Santos Pereira. O então ministro da Economia ousou pedir medidas que estimulassem o crescimento a que Gaspar respondeu “não há dinheiro”. Perante a insistência do colega Gaspar limitou-se a perguntar-lhe “qual das três palavras não percebeu”. A história encarregou-se de dar razão a Álvaro Santos Pereira, hoje o governo festeja cada miligrama de crescimento e a única coisita boa que fez foi um acordo de concertação social dinamizado pelo célebre sôr Álvaro.
  
Vítor Gaspar era o homem frio, que não hesitava na adopção de medidas duras, indiferente ao sofrimento impunha a sua tese do empobrecimento e da desvalorização fiscal. Era um não político, desprendido e sem ambições, mas a verdade é que a única coisa que fez na reforma do Estado que lhe cabia conduzir foi uma alteração dos estatutos do Banco de Portugal, alteração que garantia que quando regressasse ao banco não sofresse do empobrecimento e desvalorização profissional de todos os que, como ele e o seus colegas do BdP, trabalham para o Estado.
  
Agora regressou, agora que há sinais de alguma esperança vem cobrar os seus préstimos, aquele que assumiu o fracasso e endossou culpas aos ouros acha que o herói é ele. É como se alguém que apostou sempre no mesmo número da lotaria e do qual tinha desistido viesse mais tarde exigir o prémio porque a taluda tinha saído ao seu antigo número. 
  
Depois de alguns meses de esquecimento falou-se de uma ascensão fulgurante do homem, mas a verdade é que enquanto o sôr Álvaro conseguiu um alto cargo na OCDE por via de um concurso, o tal tacho de escolha política que premiaria o brilhantismo intelectual do Gaspar ainda não se concretizou e a triste figura ainda anda por aí, ganhando um bom vencimento livre dos seus próprios cortes e pago pelos contribuintes
  
O não político não faz política mas tenta derrubar políticos, o homem honesto e rigoroso faz cortes ao rendimento dos outros mas garante que ele próprio fica de fora desses cortes. Gaspar regressou e de uma penada tentou destruir Portas, ridicularizou Eduardo Catroga e deu à ministra das Finanças um estatuto de pessoa que ele pode elogiar e avaliar. 
  
O não político, competente, austero, netinho de uma devota que lhe ensinou os caminhos do senhor regressou. Mas não vem para fazer política ainda que destrua políticos, não veio por cargos, não veio em nome da troika ele que escrevia textos para o site do ministério das Finanças alemão. Simplesmente regressou ao navio de que havia fugido.