A desorientação provocada por uma crise financeira leva à perda de lucidez e a que cada um encontre os males do país, é um tempo de, cada português tem a sua sentença. Quem cobra impostos diz que o mal é da evasão fiscal, os políticos menos votados culpam os mais votados de corrupção, o Cavaco descobre a falta de consenso e o Passos Coelho, um campeão nestas coisas das cambalhotas, rezou a sua sentença, a culpa foi do pecado da gula dos portugueses menos abastados e desde então o seu governo dedica-se à penosa tarefa a transferir o rendimento dos menos ricos para os mais ricos.
Hoje é notícia um estudo que analisa a colocação das chefias no Estado e aproveito para lhes contar uma pequena história. Em tempos houve um grande concurso de admissão de funcionários no fisco e um velho amigo que se tinha dedicado à política telefonou-me intercedendo em favor de um rapazola, filho de um militante inscrito e com as quotas pagas no PSD. Respondi-lhe que não faria nada, que o concurso implicava a prestação de provas e os dirigentes eram gente honesta. O meu pobre amigo insistiu, que mesmo na oposição os militantes não paravam de lhe fazer pedidos. Por acaso, o rapazola chumbou na prova.
Serve isto para mostrar como o PSD se transformou durante o consulado cavaquista num verdadeiro partido de Estado, a pouca vergonha era tanta que ainda eme recordo de até para contratar funcionárias auxiliares era dada a indicação para se escolher gente próxima do PSD. Entre promessas, nomeações e empregos havia gente a inscrever-se em massa no PSD, o que permitiu a Cavaco realizar mais de uma cerimónia de massas no grande auditório do CCB (a grande catedral do Cavaquismo que hoje tem à sua frente um dos seus maiores devotos) para celebrar os novos militantes do partido, verdadeiras encenações do nosso inverno soviético.
É evidente que o PS não resistiu à tentação e com a sua chegada ao poder no tempo de Guterres enfrentou um problema curioso, os computadores dos gabinetes governamentais, tinham sido formatados e apenas tinham instalado o sistema operativo, as estantes não tinham um processo e os directores-gerais eram ferrenhos militantes do partido. Recorde-se o papel insólito de um antigo director-geral de Estudos e Previsões que se notabilizou a combater o Guterres em plena campanha eleitoral, ou mesmo o papel de saneador de um senhor que agora recebe grandes comendas graças ao seu estatuto na escrita, mas que no tempo era director-geral na Segurança Social. O PS teve de substituir muitos dirigente e quem contabilizou as mudanças dando uma preciosa ajuda à defesa dos Boys do PS? Pois é, o PCP, o grande aliado histórico do PSD.
A alguns políticos não basta ter o aparelho de Estado na mão para o corromper em favor dos seus negócios particulares, não resistem à tentação de deixar o Estado sob controlo durante mais um ou dois anos para que mesmo estando na oposição possam continuar a beneficiar dos circuitos corruptos que instalaram. Não admira que sempre que muda o governo o grande tema de discussão sejam as nomeações, quem receia perder acesso aos benefícios da corrupção contabiliza aqueles que em tempos nomeou e que, entretanto, foram substituídos.
Relvas foi o político mais inteligente neste domínio, para garantir que os esquemas possam sobreviver durante mais uma legislatura inventou um esquema de concursos que servem apenas para dar aos novos dirigentes tanta credibilidade como a que tem o seu diploma de licenciatura e que um PS ingénuo depressa aceitou. Veja-se a exigência feita nalguns concursos de que os futuros dirigentes devem ter experiência de trabalho com governantes para se perceber que os vencedores dos concursos são os mesmo que seriam escolhidos sem concurso, as diferenças estão no tempo perdido e no dinheiro gasto com os falsos concursos do professor Bilhim. E daqui a uns tempos estes boys encartados e criteriosamente escolhidos por concursos dignos da Independente vão permanecer em funções mesmo que mude o governo. Miguel Relvas foi corrido, mas a sua estratégia do cuco vai permitir que a sua influência e do PSD de Passos Coelho perdure por mais uma legislatura.