Há muito que Portugal tem um problema chamado água. Durante
décadas a importância da água foi ignorada, foi considerado um recurso gratuito
e que poderia ser usado ou destruído sem regras e sem limites, de vez em quando
o Alentejo queixava-se de sede, mas os alentejanos são poucos e pesavam pouco
nos partidos do poder, durante duas décadas foi ignorado pró Cavaco Silva,
apesar de em meados dos anos 80 ter enfrentado uma seca que levou a região a
receber ajuda alimentar.
Durante décadas indústrias como as celuloses, os curtumes ou
a pecuária usaram os rios e ribeiras como se fossem esgotos a céu aberto, o
imenso oceano acabaria por tudo limpar. Onde não havia águia em abundância
cultivava-se em sequeiro, onde esta chovia generosamente usava-se sem cuidado e
penas era retida para produção de energia elétrica.
Agora que a excitação presidencial anda em níveis mais
suportáveis e compatíveis com alguma reflexão séria dos problemas nacionais, é preciso
dizer que Portugal tem um problema grave com este recurso. Usa-o de forma
descuidada, não promove a sua retenção e redistribuição. Mas acima de tudo tem
um problema de falta de visão coletiva, porque não é possível falar de
florestas, de desenvolvimento do interior, da agricultura, do ambiente e das
florestas sem falar da água. Nenhum destes problemas pode ser analisado ou
resolvido isoladamente e todos passam pela água.
A agricultura, as populações, o equilíbrio ecológico, a instalação
de indústrias carece de água em qualidade, quantidade e a preços aceitáveis, falar
de fixação de populações, de investimento, de agricultura e florestação
ignorando a importância e o custo da água evidência falta de inteligência no
debate. Não há prioridades isoladas em todos aqueles capítulos, e muito menos prioridades
absolutas definidas nas televisões em cima de acontecimentos mais ou menos dramáticos.
É necessário reter a água, avaliar os seus stocks e prever a
necessidade de promover a sua redistribuição desenvolvendo uma rede de transvases
que assegure segurança no seu abastecimento. É preciso levar a sério o combate
à poluição e condenar proporcionalmente as indústrias poluidoras, que devem
suportar os custos económicos e ambientais, que ascendem a valores muito
superiores às multas que lhes são aplicadas.
É preciso ter água em quantidade, com segurança, com
qualidade e com preços aceitáveis e a seca que o país enfrenta mostra que os
recursos disponíveis são escassos e incompatíveis com níveis adequados do
interior. Uma boa parte da seca atual não se explica apenas pela escassez da
água, mas também pela sua procura crescente, consequência do desenvolvimento
económico ao longo de décadas, durante as quais se ignorou este problema.