Uma senhora cheia de glamour que parecia planar ao lado de
damas da corte, uma associação cheia de sucesso que todos queriam financiar,
premiar e visitar, um governante embeiçado e bem remunerado, massagens
revigorantes num SPA de luxo, passeios apaixonados à beira-mar. A senhora
exagerou na dose e agora faz companhia ao Ricardo Salgado, ninguém se deixa ver
ao seu lado, os que a bajulavam agora são os piores verdugos, os que encheram
álbuns de fotos comprovativos de muitos afetos exigem agora investigações
pormenorizadas, como se na justiça houvesse uma ementa de investigações.
Tudo isto é pode e não estamos perante a ponta de um
icebergue, isto é mais o cume de uma montanha de lixo. Não estamos apenas
perante um caso de oportunismo, estamos também perante um espetáculo degradante
onde são poucos os que se escapam. É tão miserável a senhora que decide tirar a
barriguinha de misérias como os que lhe querem suceder, os que se zangaram
depois de muitos abusos ou os que querem tomar o lugar ao lado da Leticia.
As almas caridosas do mundo empresarial que cheias de amor e
afeto para dar alegravam as contas da associação com chorudos donativos e
prémios de todos os tipos, os que queriam aparecer associados a uma instituição
que era escolhida para visitas de cabeças coroadas dedicadas à caridade, fogem
agora da associação como o diabo foge da cruz. Que se lixem as crianças e
jovens deficientes, as vítimas das doenças raríssimas, vou ali e já venho.
Não sei se o senhor administrador que abandona a empresa porque
a Leticia já lá não volta é menos perverso do que a bonitona que gostava de luxo.
Não sei se os que à boa maneira portuguesa fizeram a cama à rapariga são mesmo
almas caridosas e impolutas ou sofredores de uma doença mais nacional e menos
rara do que a doença dos pezinhos, a penosa dor de corno.
Sei que tudo isto é um espetáculo degradante que nos devia enojar,
que devia envergonhar os que andam a fazer de conta que de nada sabiam ou que
nada viam. Estamos a assistir de novo ao espetáculo que esteve em cena na fase
final do BES, quando os que iam à missa na capela do Ricardo fugiram a sete pés,
quando os que adoravam animar os jantares dos banqueiros passaram a fazer de
conta que o desconheciam e deram agora em voluntários das noites frias, quando
os que o bajulavam e recebiam benesses se transformara num momento nos seus
algozes.
Esta caso nada tem de raro, é a fotografia de muita miséria
que graça na nossa melhor sociedade, sejam senhoras de boas famílias, esposas
de gestores bem-sucedidos, presidentes e primeiras-damas, banqueiros, princesas
e rainhas, jovens políticos ambiciosos especializados no exercício de cargos
pro bono ou candidatos ministeriáveis. Tudo isto retrata a nossa miséria em
todo o seu esplendor e devia ser motivo de vergonha.