sexta-feira, abril 10, 2015

Ficar aquém da troika e ir além do admissível

O discurso supostamente corajoso de Passos Coelho que dizia ir além da troika não passou de mais uma das muitas tretas de um político igualmente da treta, a verdade é que em boa parte do programa Passos Coelho ficou muito aquém da troika e em domínios não previstos no memorando foi muito além do aceitável. 

O governo ficou muito aquém da reestruturação do Estado onde se ficou por uma muito duvidosa fusão do fisco cujos resultados começam a ficar em evidência.  Ficou muito aquém do exigido pela troika nos subsídios indirectos que são pagos `s empresas do sector energético. Ficou muito aquém do esperado na renegociação das PPP. Mas, acima de tudo, ficou aquém dos resultados e muito além na recessão, no desemprego, na destruição de empresas, na emigração.
  
Foi o próprio Passos Coelho que acaba de admitir que não fez qualquer reforma pois mesmo aquela que durante tanto tempo foi bandeira deste governo e do seu presidente, a reforma da legislação laboral, é agora considera não não tendo sido realizada e apontada como a única reforma que ficou por realizar.
  
Passos Coelho nunca quis fazer qualquer reforma esta direita é tudo menos reformadora, o seu modelo económico é absolutamente primário, inviável no quadro legislativo e social da União Europeia e incapaz de superar o nosso subdesenvolvimento. O modelo económico de Passos Coelho tem um único vector, baixar os salários até ao ponto em que seja vantajoso investir. Só que o sucesso a curto prazo ambicionado por Passos Coelho implica uma aposta em indústrias de baixo valor acrescentado.
  
Não é por acaso que Passos Coelho e os seus pares chegaram a dar sinais de alegria perante a fuga de quadros para a emigração, Paulo Rangel chegou mesmo a propor uma agência pública para facilitar a sangria.  Uma aposta em investimentos que procuram a mão de obra barata conduz a uma conclusão óbvia, os jovens qualificados nunca terão emprego e a única solução seria a emigração, até porque ao contrário do passado, quando os limites à emigração pressionavam os salários para baixo, agora o problema não se colocava e a presença no país dessas geração qualificada era um problema político incómodo.
  
Temos um modelo salazarista invertido, dantes apostava-se na mão de obra barata porque não se tinha mão de obra qualificada e impedia-se a emigração  enquanto se investia no ensino para formar os quadros de que o país precisava. Agora apossa-se na mão de obra qualificada e convidam-se os quadros a emigrar. Como a livre circulação na EU impede medidas que restrinjam a emigração o governo encontrou uma solução para o risco de fuga da mão de obra menos qualificada, recorreu a um processo de eugenia económica e eliminou dois sectores de mão de obra intensiva, a construção civil e a restauração.
  
Só que Passos Coelho ignorou que o mundo de hoje já não é o mundo do tempo do Salazar que ele parece estudar e uma aposta em mão de obra não qualificada só faz sentido se o objectivo for concorrer com países como o Bangladesh, a Índia, a China ou o Egipto. Só que se o objectivo é esse não bastam salários baixos, será necessário recorrer à escravatura.
  
Passos Coelho não propôs ao país um modelo que implicava desinvestir na formação profissional séria (não essa falsidade que serve para esconder os desempregados), que obrigava à emigração forçada das últimas gerações e que pressupunha a destruição de sectores importantes do tecido económico e social. Passos Coelho fez tudo isto pela calado, destruiu uma boa parte da economia, levou milhares de portugueses à miséria, desorganizou e desprestigiou o Estado. Passos Coelho ficou aquém da troika e foi muito além do admissível, algo que só foi possível porque Portugal tem um único órgão de soberania com poderes efectivos, o governo. Tudo o resto é treta.