Durante quase um ano Passos Coelho representou a sua pantomina do primeiro-ministro no exílio, limitou o grupo parlamentar a serviços mínimos e andou por aí fazendo encenações para o telejornal e jantares de lombo assado. Passos não precisava de se preocupar com as sondagens, o OE para 2016 era para ignorar e o de 2017 foi pelo mesmo caminho, ele sabia que o poder voltava a ser-lhe servido numa bandeja.
Afinal de contas, se o diabo vinha em Setembro, não havia motivo para se preocupar com o desempenho orçamental, o crescimento não haveria de ser grande coisa, mais tarde ou mais cedo o país voltaria a afogar-se nos juros. Passos sabia muito bem que 2015 tinha disfarçado a austeridade aldrabando as receitas fiscais, antecipou as receitas do IRS com as retenções abusivas na fonte e deixou os reembolsos do IVA para 2016. O buraco estava cavado, era uma questão de tempo para que Centeno caísse nele.
O diabo já tinha viagem marcada, setembro seria o mês do próximo armagedão financeiro do país. Mas o diabo não veio, Portugal apresentou o défice mais baixo da democracia e o reequilíbrio não resultou em recessão, antes pelo contrário. As coisas correram mal demais, o défice foi muito menos do que o previsto, o crescimento superior as expectativas, o desemprego está em queda, o país é elogiado e, para já, 2017 está a correr bem. O mesmo Passos que dizia, com ar condescendeste, que a legislatura era para ir até ao fim já deixou de o ser. Com o PSD descer nas sondagens e sem a ajuda do diabo é preciso fazer algo.
Passos percebeu que por este andar está perdido e com ele toda a direita, até os sectores mais moderado do PSD deixaram de ser tolerantes e responderam ao toque de reunir do presidente do partido. E tal como fazem os treinadores de futebol Passos Coelho, José Eduardo Martins e outros atacam o árbitro, esperam que Marcelo comece a mostrar amarelos e vermelhos ao governo.
O diabo não pareceu, os Reis Magos não trouxeram a prendinha que Passos esperava e há um único culpado para o falhanço da sua estratégia, Marcelo Rebelo de Sousa. Até Cavaco, que está convencido de que é um mestre em vitórias eleitorais, veio dar uma ajudinha, escreveu mais uma página miserável da sua obra política, agendou a publicação para a época de balanço do ano de 2016. Estava tão convencido da desgraça que até escreveu que não conhecia nenhum governo do tipo geringonça que tivesse trazido progresso. Também ele achou que devia pressionar Marcelo. Enfim, coube a Cavaco o papel de cereja neste bolo.
Passos Coelho esperava e desejava o diabo, agora manda dizer que o diabo é o Marcelo, alguém tem que levar com as responsabilidades dos seus falhanços.
Passos Coelho esperava e desejava o diabo, agora manda dizer que o diabo é o Marcelo, alguém tem que levar com as responsabilidades dos seus falhanços.