Paulo Portas desvalorizou todas as maldades de Trump declarando que "onde há um risco muito grande com Trump é no comércio", talvez porque se sinta ideologicamente muito próximo, para dar importância à que o pode penalizar nos negócios, as medidas proteccionistas prometidas pelo novo presidente americano. Parece que Marcelo Rebelo de Sousa também está preocupado e convocou o Conselho de Estado para discutir o comércio internacional.
Depois de décadas de negociações pautais em que nada se soube sobre a posição de governos portugueses é bom que a Presidência da República coloque esta questão em debate. O país perdes horas infindas a discutir questões de lana caprina e depois, em assuntos tão importantes como o desarmamento pautal, tudo se faz pela calada. Depois assistimos com frustração à deslocalização de empresas sem perceber o que se passa.
É pouco provável que as medidas de proteccionismo adoptadas por Trump não atinjam numa primeira fase o comércio português, ainda que possa atingir de forma grave algumas empresas que tenham uma grande dependência em relação ao mercado dos EUA. O mesmo não se pode dizer das consequências para as nossas importações do impacto negativo dessas medidas no comércio internacional e no crescimento das economias.
Seria interessante que as nossas universidades estudassem o tema, ainda que e apesar da nossa dependência externa as relações económicas internacionais nunca tenham cativado muita atenção por parte das nossas escolas de economia. Seria interessante perceber em que medida a política proteccionista de Trump vai afectar as economias dos nossos parceiros internacionais induzindo consequências na economia portuguesa, que empresas ou sectores poderão ser atingidos em Portugal, que impacto terão essas medidas ao nível de desvios de comércio em consequência da desestruturação das trocas internacionais a que se vai assistir.
Paulo Portas pode ser muito simpático com os seus parceiros ideológicos desvalorizando o que não lhe convém para dar importância ao que lhe interessa, mas a verdade é que o proteccionismo dos dias de hoje é muito mais do que pautal. Vão longe os tempos das pautas e dos contingentes ou das medidas de efeito equivalente. Nos dias de hoje o “armamento” proteccionista é mais sofisticado e algumas das medidas adoptadas para combater a emigração encobrem medidas proteccionistas.
Quando Trump dificulta a emissão de vistos para os brasileiros não está combatendo a emigração u a rejeitar refugiados, está dificultando a mobilidade de cidadãos e isso significa a também a deslocação de representantes de empresas. É mais difícil ir a feiras, realizar reuniões de negócios com clientes americanos, deslocar especialistas para assistência técnica ou quadros para a instalação de equipamentos.
Quando Trump apela a que os americanos consumam produtos americanos, algo que por cá também se faz, está mobilizando o país para um boicote às importações, medidas que no estrangeiro ninguém está adoptando em relação aos produtos provenientes dos EUA. Estamos perante muitas medidas proteccionistas, algumas com tanto impacto como as negociações pautais, sejam elas multilaterais como se têm vindo a realizar no âmbito da Organização Mundial de Comércio, ou bilaterais como Trump pretende.