Ao ler no Jornal Económico que o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais disse que em 2017 o setor financeiro pagou mais de 2000 milhões de euros de impostos ia caindo de cu, o milagre é tão grande que aos três pastorinhos terei de acrescentar os cinco presidentes dos grandes bancos, os tais que decidem a nossa vida e têm a alcunha de DDTs. Perante tal milagre terei de me reconverter e sempre que passar à porta de um dos nossos sacrossantos bancos terei de me ajoelhar como se estivesse perante a altar de Fátima e benzer-me, pedindo ao banqueiro da paróquia a sua bênção e perdão por todos os meus pecados de difamação da sua pessoa.
Só pode ser milagre, todos pensávamos que a taxa de IRC suportada pelos bancos e seguradoras é mais pequena do que a da tasca da esquina e que uma boa parte dos benefícios em sede de IRC foram concebidos em favor das sua boas ações. Mas, afinal, estávamos enganados?
Certo dia, farto de ouvir um taberneiro de bairro queixar-se dos muitos impostos que pagava e sabendo que o pobre homem raramente emitia faturas, declarava um salário mínimo e esquecia-se dos contratos de trabalho para os empregados, questionei-o sobre quanto pagava. O homem já disse o muito que pagava, a maior parte do IVA. Tive de o esclarecer que o IVA que supostamente pagava, apenas estava a entregá-lo, já que tinha sido pago pelos clientes. Feitas as contas o pobre desgraçado entre o que pagava e o que ficava por pagar ainda tinha um saldo positivo, por conta do IVA que embolsava.
Passa-se o mesmo com os nossos generosos banqueiros, não só não pagaram nada, digamos que pagaram um corno e a ponta de outro, como ainda embolsaram muitos milhões por conta de um famigerado esquema de transferência de dinheiro dos contribuintes para os bancos designado eufemisticamente por "Créditos por impostos diferidos", que é uma forma de roubar como fazia o meu taberneiro, mas como os bancos têm bons amigos o roubo foi tornado legal. Dizer que pagam muitos impostos é como argumentar como o taberneiro do meu bairro.
É inaceitável que um secretário de Estado use argumentos destes, elogiando a banca atribuindo-lhe o pagamento de impostos que foram suportados pelos seus clientes e funcionários. Que se saiba os bancos pagam IRC e em 2017 não só não pagaram nada como ainda beneficiaram dos tais "Créditos por impostos diferidos", como secretário de Estado Adjunto e das Finanças reconheceu recentemente no Parlamento.
Segundo a lógica do secretário de Estado cidadão comum só paga o IUC e o IMI ou IRS se trabalhar com recibos verdes. Segundo o seu brilhante raciocínio são os patrões que pagam o IRS, os comerciantes que pagam o IVA e os bancos que pagam o imposto de selo.
Um dia destes ainda vamos ver o secretário de Estado a promover vídeos de magia produzidos pelo ilusionista Luís Matos para nos mostrar como cidadão comum não paga impostos e as receitas fiscais resultam dos sacrifícios das grandes redes de distribuição, das energéticas e da banca, confundindo de forma oportunista retenção com pagamento.
Alguém devia recordar ao secretário de Estado algumas:
- Que representa um governo eleito pelos portugueses e não lhe cabe a si inventar falsos argumentos em favor da imagem de generosidade contributiva do setor financeiro.
- A diferença entre pagar impostos e entregar ao Estado os impostos pagos por outros.
- Cabe ao secretário de Estado cobrar impostos e não manipular estatísticas e dizer falsidades para melhorar a imagem seja de quem for.
- Que está a faltar À verdade e ao respeito a muitos portugueses sugerindo que os impostos que eles pagaram, muitas vezes vivendo miseravelmente, foram afinal pagos pelo setor financeiro.