terça-feira, fevereiro 24, 2015

Receios que me atormentam

Quando uma procuradora com as mais altas responsabilidades se refere aos processos de investigação em curso concluindo que no fim os honestos se escaparão, como se o país estivesse sendo alvo de uma praga bíblica destinada a eliminar os pecadores tenho razões para recear que não estamos perante processos de investigação isolados.

Quando a mesma procuradora que tem responsabilidades de direcção não invoca as suas competências mas antes a relação corporativa para afirmação da sua confiança na justiça leva-me a recear que essa classe corporativa pode ter chamado a si a nobre função de conduzir a praga bíblica que livrará o país dos menos honestos.

Estamos em ano eleitoral e é este o tempo apropriado para eliminar os menos honestos que queiram estra no poder. Não nos podemos esquecer de que a associação sindical que respresenta os nossos juízes entendeu ser uma actividade sindical pedir a lista de despesas dos membros de um governo na esperança de poder incrimnar algum por abuso dos dinheiros do Estado. Isto é, uma procurador diz que se escapam os honestos, os sindicalistas dos juízes fazem investigações por conta própria visando todos os membros de um governo. Uns dizem mata, e os outros dizem esfola.
  
É neste quadro e a poucos meses de eleições que um ex-primeiro-ministro está preso, ao que consta por corrupção. Com ele está preso um amigo de que dizem ter sido corruptor, um ex-motorista apanhado nas teias da justiça, tendo sido constituído um gestor acusado de encobrimento. A acreditar nas fontes mais ou menos oficiosas da justiça portuguesa temos o criminoso e o motivo do crime.
  
Seguindo a lógica da justiça portuguesa se Sócrates tinha dinheiro foi porque o recebeu, se o recebeu de um amigo é porque deu algo em troca. Mas como dar e receber dinheiro seja de quem for ainda não é crime é preciso provar o que se ofereceu indevidamente a troco desse dinheiro, sem isso não há corrupção e sem corrupção não há dinheiro que fugiu ao fisco e sem esse dinheiro não haveria capitais para branquear. Isto é, falta provar a existência de corrupção.
  
E aqui vamos ter um problema, como primeiro-ministro Sócrates não tinha competências próprias, não assinava contratos, não decidia compras, não escolhia empresas. Se um primeiro-ministro é corruptor dificilmente o pode ser sozinho, precisará sempre de um ministro para ajudar, este precisará muito provavelmente de um secretário de Estado e este, se for esperto, vai arranjar um director-geral para assinar os papéis. Isto significa que em função da imaginação dos procuradores os potenciais corruptos que colaboraram com Sócrates são muitos, tantos quanto os ministros, os secretários de Estado e os directores-gerais que exerceram funções durante os governos de José Sócrates. Todos os que durante quase duas legislaturas tomaram decisões que de alguma forma pudessem ser influenciadas pelo primeiro-ministro estão sob suspeita, nem o líder do PS e candidato a primeiro-ministro se escapa a este critério.
  
Isto significa que daqui até às eleições muita coisa pode acontecer, mesmo que uns tempos depois todos saiam ilibados e com os comentadores do costume a elogiar a justiça porque ao libertar os inocentes deu mais uma prova de que funciona.