O problema do ser doutor ou não ser doutor não está no que se estuda, está em quem é doutor. A questão do grau académico nada tem que ver com a academia ou com o que se estudou, está para as classes sociais como o restaurador Olex, o que não faz sentido é um preto com uma cabeleira loura ou um louro com carapinha.
Mais greve do que o Relvas ser doutor é ver o filho do barbeiro ou do pedreiro de quem se espera que esteja a trabalhar nas obras apareça a dizer que é doutor. É isso que explica a subserviência com que o vaidoso António Borges, professor de verdade, antigo director do INSEAD, banqueiro e director do FMI aceitar ser moço de recados do dr. Relvas. O filho do barbeiro até podia ser presidente dos EUA que para muito boa gente desta praça seria sempre o filho do barbeiro, mas o dr. Relvas? Esse nasceu para ser doutor e ter ou não estudado é coisa secundária.
De um doutor esperam-se maneiras e que saiba comer à mesa, os seus valores cívicos confundem-se com os da educação que recebeu em casa, não precisa de ser muito bom aluno e muito menos o melhor da turma, é por isso que se for o estatuto social a determinar quem é doutor poupa-se muito ao Estado. O problema é quando se pretende que sejam os que não são educados a serem doutores, quando se pretende a utopia de todos serem doutores. E depois quem vai para empregada doméstica, quem recolhe o lixo?
Perguntarão alguns se esta concepção não resulta numa escola exclusiva. Não, a escola ensina e quem educa são as famílias ou, pelo menos, as boas famílias. As escolas servem para aprender a trabalhar e se não se foi educado em casa então vai-se trabalhar nas escolas porque como dizia o outro “o trabalho leberta” (“Arbeit macht frei”). É através do trabalho que os que não nasceram e foram educados para serem doutores deverão encontrar o seu caminho, preparar o seu futuro.
É por isso que o modelo de ensino que está a ser implementado pelo ministro Crato faz todo o sentido, primeiro o aumento de alunos nas escolas públicas, depois as alterações curriculares e os exames a torto e a direito e, por fim, o envio de metade dos alunos para escolas profissionais.
Agora esta aguardar por um reordenamento da rede escolar porque ter um liceu no meio de um bairro operário é o mesmo eu ver um preto com cabeleira loira, da mesma forma que não se espera que uma menina do Liceu Dona Leonor vá para costureira ou para cabeleireira. Faz todo o sentido encaminhar os jovens menos dotados para os cursos profissionais sabendo-se que há uma grande relação entre as capacidades escolares dos jovens e o nível cultural dos país.
Em tempo de austeridade não faz sentido deitar dinheiro à rua ou, como se diz, atirar pérolas aos porcos, é preciso acabar com esta mania nacional do ser doutor. Há os que nasceram para o ser o os que mesmo sendo nunca o parecerão. Alguém se lembraria de pensar que o Relvas não era doutor? Com as equivalências a Lusófona fez justiça social, da mesma forma que Passos e Crato vão fazer justiça social obrigando metade da juventude a aprender coisas úteis.