Houve um tempo em que em Portugal existiam apenas dois tipos de concelhos, os que estavam livres de armas nucleares e aqueles onde ainda existia o perigo real de estarmos a passear tranquilamente e levarmos com uma bomba de neutrões pelos cornos abaixo. Quando se ia de carro e se entrava num concelho livre desse perigo o condutor era avisado por cartazes colocados na fronteira dos concelhos que podiam respirar de alívio, ali existia nenhum paiol repleto de bombas H, bombas de neutrões e outros brinquedos made in USA.
Agora os únicos painéis que encontramos são os colocados nas auto-estradas sugerindo aos automobilistas que interrompam a sua viagem e saiam da estrada uns vinte quilómetros mais à frente para depois de andarem outros vinte em estradas quase intransitáveis poderem ver o museu das Minas do Lousal ou o castelo de Alcácer do Sal. Em contrapartida agora todos os concelhos são capitais de alguma coisa, vivemos num país teso e de tesos onde nem os bancos têm capitais, mas que é um país de capitais.
Temo há muito a capital dos móveis, a moda pegou e agora os autarcas não conseguem dormir enquanto não arranja qualquer coisa que sirva de capital. Se há muitos lingueirões é a capital do lingueirão, se o que dá é a ameijoa teremos a capital da amêijoa. Há capitais para tudo e mais algumas coisa mas como o nosso problema é fome o tema mais dominante é o comes e bebes, não temos dinheiro para comer mas sobram-nos as capitais da petiscaria.
Além de ser capital de qualquer coisa concelho que se preze também tem uma festa de comida para oferecer aos seus visitantes. Há a feira do atum, a feira do tremoço, a feira dos caracóis, a feira do enchido, a feira do queijo da serra e a famosa feira do Marisco de Olhão. Aliás, a Feira do Marisco de Olhão é um acontecimento tão importante, o equivalente ao Festival de Cannes no Algarve, que com o país teso a autarquia da terra que o Almirante Henrique Tenreiro escolheu para atracar os seus arrastões era a única entidade com dinheiro para manter no ar uma daquelas avionetas irritantes que passavam a vida a quebrar a rotina das ondas nas praias algarvias.
Veja-se o caso do distinto autarca da minha terra, presidente da distrital do PSD do Algarve, começou por colocar a terra no mapa pagando ao atrofiado do Castelo Branco para ser o Rei do Carnaval, depois enterrou uma fortuna numa discoteca que deu à Astróloga (antigamente chamavam-se bruxas) Maia, agora promoveu a feira da conquilha, para o ano deve ir à ONU anunciar que Vila Real de Santo António é a capital Mundial do Berbigão. Bem ainda pode escolher a capital dos xalavares (na terra diz-se que de punhetas), do cascabulho, do camaleão, do carapau alimado, e de mais umas dezenas de coisas.
Um dos argumentos em favor desta orgia administrativa nacional que são as autarquias locais, uma conquista de Abril que alguma direita e o caciquismo local tanto agradece, é que é um viveiro de políticos. Começam de pequeninos nas autarquias e depois de experiência comprovada escolhem-se os melhores para servirem o país nos mais altos cargos da Nação. Por aquilo que se vê, para além dos idiotas, bandidos e corruptos que o país tem conhecido graças a esta grande conquistam, é muito provável que se multipliquem agora os chefes de cozinha, provavelmente vamos ter o Chef Macário, o Chef Isaltino ou o Chef Luís de Gaia.