O que mais impressiona nesta questão dos subsídios é a
cobardia de um governo que não é capaz de assumir as suas decisões sem ter de
recorrer a truques e mentiras. É bom recordar como tudo começou.
Foi numa reunião do PSD que Passos Coelho referiu a existência
de um desvio colossal na execução orçamental, desvio depois explicado de forma
ridícula por um Gaspar que gostou da palavra colossal. Foi a primeira vez que
Gaspar mostrou a sua preferência por palavras fortes como colossal ou robusto.
Foi com o argumento do desvio colossal que um pesaroso
Passos Coelho comunicou ao país o corte temporário dos subsídios, na ocasião
era por dois anos o que já era um abuso pois retinham-se os subsídios para
cobrir um desvio colossal da responsabilidade do governo de Sócrates que não se
repetiria. Em privado um ministro disse à comunicação social que a opção pelos
subsídios dos funcionários públicos e pensionistas era uma questão de
eleitoralismo, o governo não esperara ganhar os votos dessa gente. Aliás, Passos Coelho justificou o corte dos subsídios com o argumento de que os funcionários públicos ganhavam em média mais de 15% do que os do sector privado.
Note-se que em Bruxelas esta medida sempre foi tida como
definitiva e na ocasião ninguém questionou o governo nem este se sentiu na
obrigação de se explicar. Uma parte do país, dos opinion makers e dos
jornalistas concordava implicitamente com a estratégia cínica e cobarde do
governo, sacrificava-se os funcionários públicos e poupavam-se os trabalhadores
do sector privado e os mais ricos a medidas de austeridade. Mas as coisas
correram mal, o país está à beira do colapso económico e começa a duvidar-se do
Gaspar.
Mais tarde soube-se que o desvio colossal não passou de uma
mentira oportunista que não ficou comprovado nos relatórios das execuções
orçamentais. Mas mesmo que tivesse ocorrido não seria definitivo pois resultava
da suposta incompetência do governo anterior. Então porque transformar o corte
dos subsídios em definitivo?
A estratégia do Gaspar sempre foi o empobrecimento forçado,
para uns aumenta-se o horário de trabalho e pressionam-se os salários para
baixo com o aumento brutal do desemprego, para os outros cortam-se os subsídios
e numa segunda fase promove-se o despedimento em massa de funcionários. Com o
dinheiro conseguido com o corte dos subsídios pode-se esquecer a renegociação
das rendas da EDP e das PPP, tira-se aos funcionários públicos e dá-se aos
ricos.
Desta forma os credores ficam contentes, o corte definitivo
dos subsídios subsidia indirectamente as grandes empresas e estas terão
capacidade financeira para superar a crise e, eventualmente, criar emprego. Com
a redução salarial no sector privado, com o que se contou com a preciosa ajuda
do idiota oportunista da UGT, evita-se a redução da TSU que constava no
memorando, conseguindo-se poupanças às empresas que mesmo assim beneficiarão de
facilidades para despedir trabalhadores em massa.
Esta é a estratégia brilhante do Gaspar e do Passos Coelho,
falta-lhes a coragem para a assumir e explicar aos portugueses. Talvez porque
tenham medo das consequências, uma revolução de consequências imprevisíveis.
Mas com o país à beira do colapso, a contraçã económica a transformar-se numa
espiral de recessão, até o FMI receia as consequências política internas e a
condenação internacional da incompetência dos seus técnicos. Por isso é necessário
enganar os portugueses e prometer a devolução progressiva dos subsídios a
partir de 2015. Só não explicam como um desvio orçamental temporário foi
transformado em definitivo e que cortes foram esquecidos graças a esta receita
adicional não prevista no memorando.
O Gaspar e os seus amigos dos papers no FMI e no BCE estão a brincar com todo um país, sem se importarem com o risco de o conduzirem ao conflito social. Fazem-nos de forma cobarde, sem assumirem o que pretendem e sem darem a cara, aproveitaram-se de um débil mental para transformarem todo um povo em cobais de uma experiência económica inédita, o empobrecimento forçado de todo um povo ao mesmo tempo que se promove em dois anos uma reengenharia social que em condições normais levaria mais de uma década, para isso transferem-se os rendimentos da classe média para o mais ricos.
No fim de tudo isto o Gaspar e todos os responsáveis, incluindo os técnicos de meia tigela do FMI, do BCE e da Comissão que se têm pavoneado pelo país como centuriões romanos vão escapar-se sem assumirem as responsabilidades e sem serem julgados por toda a miséria e morte que estão promovendo?