Um ex-inspector da Polícia Judiciária mandou depositar dois
mil euros na conta de um árbitro de futebol para o poder acusar de corrupção e
uma boa parte do país diverte-se a brincar com as traquinices do mundo da bola.
Mas se um ex-inspector da PJ, agora vice-presidente de um grande clube, recorre
a este estratagema não foi certamente para ser apanhado e cair no ridículo.
È bom lembrar que o processo Casa Pia nasceu com um esquema
montado por outro inspector da PJ que combinou o envio de uma carta anónima.
Quando alguém experiente, que foi inspector da Polícia Judiciário tem esta
escola temos sérias razões para sentirmos arrepios na espinha quando pensamos
no que se passará nos bastidores da justiça portuguesa.
Quantos cidadãos foram acusados por encomenda, quantos foram
condenados por falsas provas, quantos esquemas foram montados a troco de
dinheiro? É bom recordar que só nos últimos tempos, para além deste caso e da
forma como foi iniciado o processo Casa Pia, também foi notícia uma inspectora
que roubava os traficantes e andava no BMW de luxo cujo roubo havia encomendado
e ainda um caso de vigilâncias ilegais feitas por agentes da PJ nas suas horas
vagas.
A tudo isto temos de somar a facilidade com que processos
judiciais vão parar Às mãos dos jornalistas quando estão em causa certos
interesses políticos. Compare-se a facilidade com que os documentos do processo
Freeoport chegaram aos jornais com a protecção dos segredos no caso dos
submarinos. Num caso já se gastaram milhões na tentativa de provar que houve subornos
de algumas centenas de milhares de euros. No outro a justiça alemã provou que
houve subornos de milhões e por cá por cá o processo parece merecer menos
importância do que o roubo de uma melancia.
Compare-se o empenho de alguns magistrados sindicalistas em
processos como o caso Freeport, o caso Face Oculta ou o caso Freeport com este
dos submarinos em que até ficamos com a impressão de que o “Arpão” e o “Tridente”
são submarinos espanhóis. Aliás, as preocupações daqueles processos chegaram
mesmo a Belém, o presidente confundiu várias vezes o sindicalista do MP com o Procurador-geral
e chamou-o por várias vezes a Belém.
Menos rascas do que o inspector da PJ foram os sindicalistas
dos magistrados, não depositaram dinheiro nas contas dos ex-ministros, mas
foram recolher todas as despesas para que sejam investigadas, talvez algum
deles tenha comprado um perfume para a amante e depois não tenha feito a
reposição do dinheiro, aliás, mesmo que o tenha feito pode ser acusado de
peculato.
O mais grave de tudo isto é que já ninguém se indigna,
levamos a coisa para a brincadeira e reduzimos a questão a um problema da bola.
Só que o país está como o mundo da bola, tal como as claques os partidos estão
infiltrados por marginais, os juízes da bola cada vez se distinguem menos dos
que usam toga, há tanta corrupção no mundo da bola como no da justiça e algumas
decisões judiciais suscitam mais dúvidas dos que as grandes penalidades.