quarta-feira, abril 25, 2012

O dia que não devia ter acontecido




Visto numa perspectiva histórica o 25 de Abril só faz sentido porque somos um  país onde uma rainha teve de fazer o milagre de fazer aparecer rosas em Janeiro para enganar o rei porque andava a dar pão aos pobres, algo que neste país ainda é pecaminoso ao ponto de os pobres terem ousado comer pão a mais durante um par de anos.
  
É um absurdo histórico um povo europeu que durante séculos esteve na liderança do mundo estivesse em finais do século XX prisioneiro no seu próprio país por um regime político que a direita insistiu em manter muito para além do que qualquer direita inteligente acharia razoável.
   
É um absurdo que os portugueses só tenham conquistado direitos elementares, como o direito a férias, em finais dos anos 70 e que para se assegurarem de que esses direitos não lhes seriam retirados foi necessário garanti-los numa constituição. Mais de trinta anos depois percebemos que a direita nunca aceitou esses direitos e de pouco serve ao país uma constituição e um Tribunal Constitucional, nesta democracia tudo e todos estão à venda.
   
É um paradoxo que aquilo que em toda a Europa foi um processo lógico de desenvolvimento social por cá tenha sido necessário um golpe de Estado e mesmo assim, passadas mais de três décadas, a direita ainda se recusa a aceitar que o país dedique ao Estado social uma parte da riqueza criada exigindo que esse dinheiro alimente um sistema económico onde os ricos ficam com a maior parte da riqueza gerada.
   
É uma aberração manter um império colonial quase no virar do século XX e depois de reposta a normalidade ainda se discutiu durante vinte anos a forma como foi feita a descolonização, os que nunca a quiseram fazer porque queriam manter um colonialismo burro para continuarem a explorar os africanos transformaram-se em campeões da descolonização inteligente.
   
O 25 de Abril só sucedeu porque a direita portuguesa é burra e por aquilo que se tem vistos nos últimos tempos não melhorou grande coisa. E só há tanta gente a questioná-lo porque por oposição à cobardia os militares que impuseram a democracia à direita foram generosos. Podiam ter julgado os pides, os governantes e os empresários que usaram apolítica política como instrumento de gestão dos recursos humanos, mas não o fizeram. Podiam ter impedido o regresso dos que fugiram do país com receio das suas consciências, mas deixaram-nos regressar.
   
Mais do que pelo upgrade de meio século de um país que a direita poupadinha, rigorosa nas contas públicas e pouco dada a keynesianismos obrigou a parar no tempo o 25 de Abril deveria ser comemorado pela generosidade face à cobardia, pela inteligência face ao obscurantismo, pela alegria face ao cinzentismo. As grandes novidades do 25 de Abril não foram a descolonização, a democracia ou o Estado Social, isso há muitas anos que era a regra na Europa, no que os militares de Abril foram superiores à direita portuguesa foi na generosidade, na superioridade moral e ética, no dar sem exigir nada em troca.
   
Hoje parece que a direita não aprendeu a lição, continua fora do tempo, desajustada da Europa, burra como sempre foi, sem grandes princípios éticos e a não respeitar quaisquer valores de ordem humana no momento de ir ao pote. O País parece que precisar de inventar rosas no Inverno quando se pretende dar pão aos pobres ou de voltar a desrespeitar a legalidade instituída para que exista em Portugal o que é elementar existir em qualquer país desenvolvido.
 
(Talvez por isso os que fizeram o 25 de Abril para que depois um Cavaco desse prioridade a um pide na atribuição de pensões deviam ter deixado tudo na mesma, Cavaco estaria sua (antiga) vivenda Mariani a gozar dos lucros da bomba de gasolina e da reforma do BdP, Marcelo estaria à beira de ceder o lugar no governo, Passos Coelho seria médico algures em África, Miguel Relvas estaria a gerir a sua mercearia. Se calhar era mais digno lutar pela democracia contra ditadores com alguma classe do que debater o país com gente idiota.)