O equilíbrio das sociedades europeias do pós guerra
assentaram num contrato social não escrito no qual direita e esquerda se
comprometeram a assegurar uma repartição equitativa dos resultados do progresso
económico resultante da paz social. O capitalismo europeu percebeu que num
Continente de guerras, conflitos nacionais, regionais e sociais, de revoluções
e de criação de ideologias já não era viável a regra do mais forte e que a sua
aplicação teria como consequência mais revoluções e o alargamento da influência
do Leste.
Mas a direita portuguesa beneficiou de uma ditadura que nas
suas fronteiras era protegida por outra ditadura ainda mais feroz na perseguição
dos opositores e até ao início dos anos 60 ainda existiam campos de
concentração na Península Ibérica. Mesmo assim Salazar tinha algumas
preocupações sociais e designou o seu fascismo por corporativismo, criando uma
rede de apoios sociais que mais tarde foram integrados no actual estado social.
Foi o caso, por exemplo, do nosso sistema de pensões.
Mas alguma direita portuguesa nunca perdoou nem a
descolonização, nem a democracia e muito menos o estado social, essa direita
que pouco tinha que ver com o corporativismo mas vivia à sua sombra, nunca
aceitou as mudanças ocorridas a seguir ao 25 de Abril. Uma boa parte dela cresceu
em África, longe dos mecanismos protecionistas do corporativismo e beneficiando
do progresso acelerado resultante da combinação de recursos naturais ilimitados
com colonialismo.
Esta direita nunca aceitou a história, nunca se identificou
com o modelo social europeu e nunca se adaptou à democracia. Viveu décadas
escondida atrás de copos de discoteca ou treinando a vingança em movimentos de
extrema direita. Os mais extremistas tornaram-se neo-nazis, os mais
espertalhões levaram a vida o melhor que puderam e transformaram-se em
liberais, alguns até optaram pela designação de social-democratas, designação
que na Europa simboliza o estado social tal como se implantou no continente,
mas em Portugal significa ser um político cobarde, muitas vezes um ex-militante
da ex-ANP.
Esta direita ressabiada chega ao poder com base num discurso
social-democrata, em que dominavam as preocupações sociais, o PSD de Passos
Coelho era contra mais austeridade, o PSD de Cavaco Silva defendia que havia um
limite a partir do qual a austeridade era insustentável. Viu-se o que sucedeu
com a vitória eleitoral da direita, depois de aumentos brutais de impostos, da
liberalização de todos os preços, quando o governo se prepara para destruir o
estado social o primeiro-ministro ainda acha que sensatez significa diminuir o
salário mínimo.
Isto significa que a direita portuguesa está rasgando o
contrato social que trouxe a paz à Europa e permitiu que a regra fosse a paz
social e a distribuição justa e equitativa dos rendimentos. A direita
portuguesa, a mais ignorante e trauliteira da Europa, está a ser usada pelos extremistas
dos gabinetes do BCE, para testar as consequências de rasgar o contrato social,
para ver até onde um povo aguenta. O mesmo povo que um dia ousou fazer a mais
bonita das revoluções sociais foi o escolhido para ser usado como rato de
laboratório de experiências de política económica que são o equivalente às
experiência de Mengele em Auschwitz. Até parece que a direita Europeia achou que a direita portuguesa tinha direito à sua pequena vingança.
O problema destes imbecis é ignorarem que ao rasgarem o
contrato social estão tirando o travão aos conflitos e às revoluções sociais.