quinta-feira, março 07, 2013

Revoluções (3) – contrato social


O equilíbrio das sociedades europeias do pós guerra assentaram num contrato social não escrito no qual direita e esquerda se comprometeram a assegurar uma repartição equitativa dos resultados do progresso económico resultante da paz social. O capitalismo europeu percebeu que num Continente de guerras, conflitos nacionais, regionais e sociais, de revoluções e de criação de ideologias já não era viável a regra do mais forte e que a sua aplicação teria como consequência mais revoluções e o alargamento da influência do Leste.
  
Mas a direita portuguesa beneficiou de uma ditadura que nas suas fronteiras era protegida por outra ditadura ainda mais feroz na perseguição dos opositores e até ao início dos anos 60 ainda existiam campos de concentração na Península Ibérica. Mesmo assim Salazar tinha algumas preocupações sociais e designou o seu fascismo por corporativismo, criando uma rede de apoios sociais que mais tarde foram integrados no actual estado social. Foi o caso, por exemplo, do nosso sistema de pensões.
  
Mas alguma direita portuguesa nunca perdoou nem a descolonização, nem a democracia e muito menos o estado social, essa direita que pouco tinha que ver com o corporativismo mas vivia à sua sombra, nunca aceitou as mudanças ocorridas a seguir ao 25 de Abril. Uma boa parte dela cresceu em África, longe dos mecanismos protecionistas do corporativismo e beneficiando do progresso acelerado resultante da combinação de recursos naturais ilimitados com colonialismo.
  
Esta direita nunca aceitou a história, nunca se identificou com o modelo social europeu e nunca se adaptou à democracia. Viveu décadas escondida atrás de copos de discoteca ou treinando a vingança em movimentos de extrema direita. Os mais extremistas tornaram-se neo-nazis, os mais espertalhões levaram a vida o melhor que puderam e transformaram-se em liberais, alguns até optaram pela designação de social-democratas, designação que na Europa simboliza o estado social tal como se implantou no continente, mas em Portugal significa ser um político cobarde, muitas vezes um ex-militante da ex-ANP.
  
Esta direita ressabiada chega ao poder com base num discurso social-democrata, em que dominavam as preocupações sociais, o PSD de Passos Coelho era contra mais austeridade, o PSD de Cavaco Silva defendia que havia um limite a partir do qual a austeridade era insustentável. Viu-se o que sucedeu com a vitória eleitoral da direita, depois de aumentos brutais de impostos, da liberalização de todos os preços, quando o governo se prepara para destruir o estado social o primeiro-ministro ainda acha que sensatez significa diminuir o salário mínimo.
  
Isto significa que a direita portuguesa está rasgando o contrato social que trouxe a paz à Europa e permitiu que a regra fosse a paz social e a distribuição justa e equitativa dos rendimentos. A direita portuguesa, a mais ignorante e trauliteira da Europa, está a ser usada pelos extremistas dos gabinetes do BCE, para testar as consequências de rasgar o contrato social, para ver até onde um povo aguenta. O mesmo povo que um dia ousou fazer a mais bonita das revoluções sociais foi o escolhido para ser usado como rato de laboratório de experiências de política económica que são o equivalente às experiência de Mengele em Auschwitz. Até parece que a direita Europeia achou que a direita portuguesa tinha direito à sua pequena vingança.
  
O problema destes imbecis é ignorarem que ao rasgarem o contrato social estão tirando o travão aos conflitos e às revoluções sociais.