A actual crise financeira da zona euro tem servido para mostrar como a União Europeia está longe do projecto dos seus fundadores, sendo cada vez mais uma coligação de interesses. Os Finlandeses são arrogantes com os portugueses, os ingleses dizem que estão de fora e só ajuda a Irlanda, os antigos bárbaros do norte designam os do sul como periféricos, os portugueses dizem que nada têm que ver com os gregos e os espanhóis dizem o mesmo dos portugueses.
A esquerda grega chega ao poder com a crise, a direita portuguesa fez o mesmo e a direita espanhola anseia que a legislatura chegue ao fim, a senhor Merkel promete aos seus contribuintes que não perder um tostão do que ganharam com a União Europeia e a extrema direita finlandesa ganhou as eleições assegurando aos seus que recusaria qualquer ajuda a Portugal. Os velhos castelos estão desactivados, as auto-estradas e os TGV não param nas fronteiras criando a ilusão de que existe um único país, o presidente da Comissão Europeia é como se fosse uma Abelha Maia a quem os grandes países dão uns trocos para se ir divertindo nos hotéis de Nova Iorque.
Os que mais ganharam com a abolição das fronteiras, com a desregulamentação dos mercados e com o desarmamento pautal global recusam-se a pensar em conjunto, beneficiaram dos mercados alimentados com dívida pública, enriquecerem com a abertura dos novos mercados de onde vieram os produtos que destruíram as indústrias dos países mais vulneráveis, os seus empresários abandonaram os países do sul da Europa em busca de mão de obra mais barata a leste ou nas economia emergentes.
Os mesmos que reagiram à crise do sub prime apelando aos restantes países europeus para que apoiassem as suas economias acusam-nos agora de gastadores, reagem à especulação nos mercados exigindo o seu empobrecimento para garantir os lucros dos seus bancos e as poupanças dos seus.
A Europa dos vencedores tentou superar a crise aproveitando as vulnerabilidades dos mais pequenos para os condenar ao estatuto de derrotados, em vez de usarem o poder financeiro de que dispõem para responder à crise optaram pela chantagem sobre os mais vulneráveis, impuseram-lhe programas de austeridade que os condenam à recessão e ainda lhes cobram juros bem mais elevados do que conseguiriam, se tudo correr bem vão ganhar em juros o que perdem com a redução das exportação dos seus produtos para esses mercados.
Ao invés de mandarmos sacos de lixo para a Moody’s deveríamos agradecer aos seus responsáveis, não tanto porque converteram em lixo as dívidas soberanas da Grécia, de Portugal e da Irlanda, mas porque não obedecendo aos interesses da Europa e ignorando as patetices do Durão Barroso levaram a crise à Itália. Com isso estragaram o caldinho aos que tentaram iludir a crise do euro sacrificando os mais fracos pondo em causa a estratégia oportunista da direita europeia. Graças à Moody’s a crise deixou de ser uma questão de periféricos e até o nosso Passos Coelho que durante anos atribuiu as culpas a Sócrates já fala em crise sistémica e soluções robustas.
Os que dantes recomendavam muito respeitinho pelas agências de rating dizem agora que estas são o lobo mau, os que usaram os ataques especulativos à dívida soberana e se congratulavam com cada queda no seu rating dizem agora que a crise internacional exige uma resposta robusta da Europa, os que não hesitaram em lançar a Grécia numa profunda crise social e se vingaram a política fiscal agressiva da Irlanda falam agora na necessidade de criar uma agência de rating europeia.
Ao não acreditar nas soluções oportunistas adoptadas pela Europa a Moody’s levou a crise aos grandes e não vai tardar muito que os Estados mais gastadores talvez não sejam os ou apenas os do Sul. Os mesmos que adoptaram um pacto de estabilidade criaram os mecanismos para os subverter inventando truques para disfarçar as contas, transformaram a Europa numa imensa Enron Corporation. Se não fosse a Moody’s esta crise teria sido resolvida empobrecendo os gregos, irlandeses e portugueses.