Os mesmos que há poucos meses confundia pobreza com gandulice não se cansam agora de adoptar medidas de discriminação positivas, foi eleito um grupo social designado por pobre que é merecedor de todos os apoios e alvo de todas as medidas de discriminação positiva. Como os mais ricos também estão a ficar isentos de qualquer medida de austeridade isso significa que os outros suportam os custos do país, são discriminados negativamente
Quem ganha mil e quinhentos euros mensais, patamar a partir do qual os portugueses são considerados ricos, começa a ter grandes motivos para invejar os pobres e só por razões de ordem cultural não abandona o emprego, entrega a casa ao banco e vai viver para uma barraca. Adquirido o estatuto de pobre tem direito a rendimento mínimo, deixa de se preocupar com cortes de vencimento, impostos extraordinários ou aumento dos preços dos serviços. Vai à Câmara Municipal e inscreve-se para ter uma casa, Segurança Social pedir rendimento mínimo, a junta de freguesia paga-lhe os medicamentos e dá-lhe um vale para as mercearias que serão compradas numa loja que, por coincidência é de um sobrinho do presidente da junta, no hospital está isento de taxas moderadoras.
Dantes tinha que pagar uma casa onde juntava os dois filhos no mesmo quarto, agora diz à assistente social que tem dois filhos e recebe um T4 a contar com o terceiro, se ficar desagradado com o tamanho da casa ou a localização chama a TVI e faz as suas queixas em prime time. Dantes, se adoecesse tinha que ir a um médico privado pois para além do emprego ainda tinha que se levantar de madrugada para levar os filhos à escola, agora pode levantar-se cedo e ir às seis da manhã para o Centro de Saúde onde não paga qualquer taxa.
Bem-feitas as contas, depois de pagas as contas da casa, das consultas, dos transportes a preço de rico, dos cortes no vencimento e dos impostos extraordinários fica com menos dinheiro do que ficaria se fosse pobre, além de ficar com menos dinheiro continua a morar numa casa apertada que não sabe se vai conseguir pagar depois do próximo PEC ou se a Euribor voltar a subir. Ainda por cima tem de trabalhar oito horas todos os dias, fora os biscates que tem de arranjar para poder sobreviver.
Atrás desta preocupação dos governos com os pobrezinhos está um objectivo meramente eleitoralista, foi isso que motivou Manuela Ferreira Leite quando só aumentou o vencimento dos que ganhavam menos de 1.500 euros, que levou Sócrates a cortar nos vencimentos dos que ganhavam mais do que esse montante, que justificou a aplicação do imposto extraordinário aos que ganham mais de 500 euros decidido por Passos Coelho, e mais algumas medidas que designam por discriminação positiva.
É importante combater a pobreza mas não é isso que se está fazendo, estamos perante um combate estatístico que ignora realidade. Não combate a pobreza dessa forma oportunista, é preciso saber quem é pobre, porque é pobre e antes de tudo o mais saber se os rendimentos declarados de um agregado familiar correspondem aos seus rendimentos reais.
O PSD chegou a falar da criação de um cartão de serviços para usar os apoios sociais, agora começa a perceber-se que esse cartão é o cartão do eleitor, se o titular tiver declarado menos de quinhentos euros esse cartão confere-lhe uma série de direitos que o coloca numa situação económica idêntica aos que ganham 1.500 euros. Desta forma os pacotes de austeridade terão sucesso garantido e a vitória nas próximas legislativas está assegurada. O problema é que com mais duas legislatura deixarão de existir contribuintes a quem cobrar impostos extraordinários.