A economia portuguesa enfrenta problemas cujas terapias são contraditórias o que torna a solução um problema difícil. Para além disso algumas das causas desses problemas só poderão ser encontradas num cenário de médio e longo prazo. É necessário aumentar a poupança para financiar a economia e reduzir a dependência dos bancos em relação ao financiamento externo mas é o Estado que está resolvendo os seus problemas subtraindo com medidas de austeridade uma boa parte da capacidade de poupança dos portugueses. É indispensável promover o crescimento económico mas as medidas restritiva implicam que esse crescimento dependa da procura externa, incerta e onde as empresas portuguesas mais se defrontam com problemas de competitividade.
A troika ter teve o cuidado extremo para conciliar a necessidade de reequilibrar as contas públicas comprometendo o menos possível as expectativas de crescimento. Os economistas do BCE, da Comissão e do FMI perceberam que o grande problema da economia portuguesa reside no crescimento e também sabem que quanto maior for a contracção da actividade económica maior será a capacidade de o Estado arrecadar receitas fiscais. Aumentos brutais de impostos implicam arrecadar mais receitas a curto prazo e comprometer essas receitas a médio prazo em consequência da perda de rendimentos por parte das empresas e das famílias e do aumento da evasão fiscal.
Quando Pedro Passos Coelho afirma que vai ser mais radical do que a troika comete o erro de designar o acordo como radical. Mas radical está a ser o seu programa de governo e talvez esteja a ser radical demais. Antecipa a privatiação de empresas e alarga o âmbito das privatizações mas nada garante que dessa forma consiga mais receitas e só o primeiro-ministro sabe porque razões e com que objectivos pretende vender empresas públicas num momento em que sabe que as vai vender mais baratas? Se essas empresas fossem suas ou pertencessem ao grupo empresarial de Ângelo Correia procederia da mesma forma? Duvido. A troika previu as privatizações e fez as contas de forma a compatibilizar as necessidades de financiamento do Estado ou de cortar nas suas despesas com essas empresas com o imperativo de proteger os interesses do país. Passos Coelho diz que é mais radical e opta por vender mais empresa e num momento em que as venderá mais baratas.
É muito duvidoso que as medidas a que o ministro das Finanças designa por robustas sejam mesmo urgentes, pode argumentar que o Estado pode ir mais longe do que o acordado com a troika, pode querer ter uma margem de segurança para o se sucesso à custa do Natal dos portugueses, mas invocar uma situação inesperada para divulgar de forma atabalhoada um aumento brutal do IRS deixa muitas dúvidas. O ministro nem disse quanto esperava receber, disse isso sim quanto pretendia e nem soube explicar como o ia fazer, a robustez fica-se por ir ao pote que está mais à mão pois o ministro não fez um único comentário sobre as consequências dessas medidas robustas no crescimento económico.
Dizer, por exemplo, que as privatizações atraem o investimento estrangeiro é uma mentira. Mesmo que haja investimento estrangeiro na compra das empresas públicas daí não resulta a criação de um único emprego, antes pelo contrário, muitas dessas empresas vão despedir trabalhadores na sequência das privatizações. O que muito provavelmente vai suceder é serem grupos portugueses a comprarem-nas recorrendo ao financiamento externo, isto é, limitando a capacidade de recorrer ao endividamento externo para financiar novos investimentos. A economia portuguesa vai acabar por usar uma boa parte da capacidade de financiamento que lhe resta para promover negócios de grupos que apenas pretendem obter mais-valias quando venderem as empresas privatizadas num momento em que o mercado tenha recuperado
Tenho muitas, mas mesmo muitas dúvidas sobre as opções robustas de Gaspar e Passos Coelho.