Os governos seguiram políticas económicas erradas que tiveram como resultado encher os bolsos dos que beneficiam de rendimentos do trabalho, pagou dinheiro a mais aos funcionários públicos, os trabalhadores por conta de outrém recebem salários pagos à custa dos lucros das empresas. Se os governos foram responsáveis, os trabalhadores é que foram os beneficiados. A solução? Castigar os que abusaram do consumo, os que ganharam mais do que deviam, os que se lembraram de recorrer a taxas de juros mais baixas do que as praticadas no antigamente para encherem a despensa. Ousaram votar mal em governo irresponsáveis e consumir acima das possibilidades, agora devem pagar pelos seus pecados, o objectivo número um da política económica é o seu empobrecimento forçado, pouco importa que fiquem desempregados, que passem fome ou que tenham de entregar a casa ao banco, devem espiar as suas culpas em silêncio e sem qualquer manifestação de revolta.
Esta é a lógica que interessa a Gaspar, assim os seus princípios são inquestionáveis, os que defendem correntes económicas distintas da sua nem têm o direito à palavra e até os seus colegas que ousem propor medidas que visem o crescimento económico são humilhados em pleno conselho de ministros com piadas do género "qual das três palavras não percebeu?". É fácil ir a Washington e defender a pinochetada económica perante pares que partilham das mesmas ideias, é fácil falar no parlamento com o discurso da condenação dos que opinem de forma diferente e com a força do deficiente alemão a apoiá-lo. Aquilo que para muitos portugueses significa sacrifícios, desemprego e mesmo fome para o Gaspar é enriquecimento curricular, ele está acima da austeridade, teve o cuidado de trazer do Banco de Portugal um secretário de Estado da Administração Pública cuja primeira tarefa foi blindar o estatuto do BdP, onde Gaspar é consultor, às medidas governamentais de austeridade.
O problema é que a questão tem uma dimensão bem maior do que aquela que a cabeça de Gaspar alcança, a causa da crise está para além das políticas nacionais, a zona euro distribui de forma desigual os benefícios e os custos, a globalização enriqueceu uns enquanto destruiu a indústria de outros. Mas o Gaspar está mais interessado em ter razão em em fazer currículo à custa do nível de vida dos portugueses do que em defender os interesses do país. Para defender o país o ministro das Finanças teria de abdicar de algumas das suas opiniões e, porventura, saber mais de economia do que aquilo que se ensina na Universidade Católica.
Não admira que o coxo alemão goste tanto do nosso ministro das Finanças, o rapaz trata-o respeitosamente, quase de forma subserviente, concorda com as suas teses e não questiona a crise de uma forma que conduza a que se questionem a forma como a Alemanha enriqueceu com a globalização e com o euro à custa dos outros países. Como é que o ministro das Finanças alemão não há-de gostar do ministro das Finanças se este parece contente por lhe pagar a 4,5% o dinheiro que a Alemanha consegue no mercado praticamente a 0%? E a Alemanha ainda fica com a fama de estar a ajudar Portugal, os alemães têm o direito de gozar do país e passear-se nas nossas ruas como se fossem detentores de uma quota do país.
O ministro das Finanças parece estar mais empenhado e em conduzir o país de forma a provar que tem razão nos seus papers do que em defender os interesses de Portugal. Para isso não hesitou em inventar desvios que atribuiu a terceiros para impor uma política de austeridade bem mais brutal do que a acordada a troco da ajuda internacional. Pela primeira vez na história do capitalismo um governo parece sentir prazer com os sacrifícios insuportáveis que impõe aos seus cidadãos.
O país está a capitular na defesa dos seus interesses para engrandecimento pessoal de um modesto doutorado em economia.