Imagine-se que um ministro de José Sócrates telefonava a uma
jornalista do jornal Público ameaçando boicotar o jornal e divulgar pormenores
da vida íntima da jornalista na Internet.
Cavaco Silva nem teria chegado a Timor e já estaria de
regresso a Lisboa quase sem fazer escalas. O presidente do PSD já estaria a dar
uma conferência de imprensa acusando Sócrates de asfixia democrática. O senhor
do sindicato dos magistrados do Ministério Público já teria vindo a público
denunciar que o governante teria cometido meia dúzia de crimes. O José Manuel
Fernandes, então director do Público, não se calava e até os cachorros de
Passos Coelho não parariam de ladrar não deixando ninguém dormir em Massamá.
Mas como está em causa o luzidio banqueiro cabo-verdiano o
fim-de-semana prossegue tranquilo, o Público chega a ser ternurento informando
os seus leitores que não é tradição do jornal divulgar ameaças e que nã havendo
crime tinha dado o assunto por encerrado. Ficamos a saber que para o jornal público
os ministros só são notícia se cometerem algum crime e que ameaçar uma
jornalista e fazer chantagem ameaçando-a de divulgar pormenores da sua vida íntima
na Internet não é crime.
O jornal Público deu aqui provas de grande generosidade, não
encontrou nenhum crime no comportamento de Relvas, a chantagem de um político não
é notícia, saber como é que Miguel Relvas conhece a vida privada dos seus
jornalistas não se reveste de interesse jornalístico e que recursos tem Relvas
na Internet para prejudicar alguém também não é que questão que não deve
motivar a curiosidade do jornal. Apresentado o devido pedido de desculpas o
assunto está encerrado.
Crime ou não o que Miguel Relva fez é digno de um capo
mafioso, sabe da vídi íntima da jornalista porque alguém o informou, tem forma
a de fazer disseminar essa informação através da Internet sem ser identificado
e usa tudo isto para ele próprio fazer chantagem sobre uma jornalista. É tão
mafioso o comportamento do político como o é a a actuação dos responsáveis do
jornal que permitiram que um dos seus fosse chantageado por um político,
provavelmente porque sendo este poderoso os pode prejudicar ou pagar-lhes bem o
silêncio.
Tudo isto passa-se em Portugal em 2012, um país que tem um
governo que por governar num contexto financeiro difícil acha que pode
desprezar a constituição, ignorar a oposição, desconsiderar o parlamento,
chantagear os jornalistas e sujeitar todo um povo a uma austeridade que mais do
que uma imposição do memorando com a troika resulta de uma agenda política de
extrema-direita não sufragada pelos eleitores e imposta com recurso a mentiras
e à manipulação da informação, como sucedeu com o falso desvio colossal
descoberto pelo ministro das Finanças.
Isto não é asfixia, é asma democrática.