quinta-feira, maio 24, 2012

Esperteza saloia, politiquice matreira e brandos costumes

No caso Relvas o país está confrontado com uma de duas situações possíveis:

  1. O Público tem razão nas acusações que faz e então o governo português tem no seu seio um mafioso que investiga ou manda investigar a vida privada de uma jornalista para exercer chantagem e obrigá-la a calar-se. Ou,
  2. Miguel Relvas fala verdade e nesse caso temos um jornal que acha pode pode cometer homicídios políticos em total impunidade para fazer o jornalismo que pretende e visando objectivos menos transparentes.

Num caso estamos perante um acto mafioso, no outro estamos perante a mesma situação. Nenhuma das duas situações é uma questão meramente jornalista para ser analisada por umas personalidades simpáticas. Estamos perante um caso de polícia que envolve um jornal de referência e um ministro de um governo eleito com uma maioria absoluta. Há uma única certeza, seja quem for que esteja a falar verdade alguém cometeu um crime grave contra a democracia e se o Código Penal não prevê este tipo de situação então as bibliotecas devem arrumá-lo junto da literatura infantil. Se o culpado for Relvas surge uma segunda dúvida, muito grave num tempo em que se fala das suas relações com rapazes da secreta, como teve conhecimento e com que recursos ia divulgar a vida privada da jornalista?

Este caso não pode ficar em águas de bacalhau, não pode morrer porque a palavra do ministro vale tanto quanto a palavra da jornalista, não é um caso nem de jornalismo, nem de debate parlamentar é um caso de polícia e dos graves, está em causa a honra de um ministro ou de uma jornalista e de um jornal, está em causa igualmente o regular funcionamento do governo e da democracia. Sabe-se que foi cometido um crime grave, conhecem-se dois suspeitos do crime, resta saber qual dos dois é o verdadeiro criminoso e deve ser julgado e condenado enquanto tal, independentemente dos julgamentos que possam fazer responsáveis políticos, responsáveis empresariais ou do julgamento da opinião pública. Ninguém consegue entender que num país o MP ande a investigar a cadeira de inglês técnico de um mero diploma universitário e não investigue os submarinos por falta de verba, não tenha chegado ao fim da operação furacão e que agora tenha reservado lugar na primeira fila para assistir ao espectáculo na ERC.

A questão é simples, ou se apura a verdade ou os portugueses tirarão as conclusões e como as coisas estão sucedendo parece que teremos de dispensar os nossos magistrados e julgar mais este processo (começa a ser um hábito) na praça pública com base nas fantochadas políticas que já foram iniciadas. Na ausência da verdade teremos de escolher entre culpar uma jornalista que tem todo um jornal em sua defesa e que teria de se socorrer de uma imaginação muito criativa para inventar a acusação a Relvas, ou culpar um político que nem se queixou da jornalista mas sim do seu jornalismo interpretativo.

Se os jornalistas há muito que não inspiram confiança aos portugueses, a verdade é que as sondagens de opinião valorizam-nos muitos furos acima dos políticos e até dos magistrados. A maioria esmagadora dos portugueses vão acreditar no jornal Público, até porque este jornal não é propriamente apoiante da oposição, não está interessado em nenhuma quota da RTP nem tem nos seus quadros nenhuma célula do PSD de Relvas, como parece existirem em jornais como o DN.

Relvas poderá não ser demitido, o governo vai sobreviver preso em arames, mas para muitos portugueses o país terá um governo mafioso. É por esta razão que é do interesse de Passos Coelho e do PSD o esclarecimento cabal dos factos, se tem uma maçã podre no seu cesto será mais inteligente jogá-la fora do que permitir que a podridão passe para as outras maçãs. A esperteza saloia de Miguel Relvas, a politiquice matreira do líder parlamentar do PSD e os brandos costumes do Ministério Público não favorecem o governo.