No OE para o ano em curso o ministro das Finanças apresentou
um OE à Chico esperto, aumentava os impostos sobre o consumo, sacava os subsídios
aos funcionários públicos e pensionistas, resolvia o problema orçamental e a austeridade
passava ao lado da maioria dos portugueses, muitos estariam secretamente
agradados com a ideia de que só o vizinho iria pagar a crise. O ministro das
Finanças, um homem que se na liturgia católica houvesse lugar a um virgem
masculino daria lugar ao Virgem Gaspar, chamou a si o poder divino de decidir
quem em matéria de austeridade ficaria no céu, no purgatório e no inferno. No céu
ficariam os muito ricos porque o seu dinheiro é sagrado e os muitos pobres
porque não têm dinheiro, no inferno ficariam os funcionários públicos e os
pensionistas por terem sido eles os mais pecaminosos e no purgatório ficariam
todos os outros.
Como os funcionários públicos são uns ricaços e todos os
outros se escaparam à austeridade o Gaspar ajeitou as suas previsões quanto ao
crescimento e às receitas fiscais, para as determinar bastaria uma velha regra
de três simples, se a um IVA a n% correspondia x de receita, a uma taxa de m%
corresponderia y. Nada mais fácil. Só que os consumidores não são tão simplório
no seu comportamento como pensa o virginal Gaspar e as suas contas saíram erradas,
a recessão disparou, o desemprego aumentou exponencialmente e as receitas
fiscais caíram abruptamente. A desgraça só não foi maior porque uma boa parte
da economia defendeu-se da incompetência do ministro refugiando-se no território
libertado da economia informal.
Mas apesar daquele ar virginal o Gaspar é um malandreco e se
o pessoal fugiu ao IVA não terá como fugir ao IRS. Ainda por cima mata três
coelhos com uma cajadada, goza com o CDS aumentando brutalmente os impostos,
impede que o pessoal escape pois cobra mesmo que as pessoas não consumam e
promove a desvalorização fiscal através do imposto sobre o rendimento, o que
vai dar no mesmo que a TSU.
Só que o virginal Gaspar revela mais uma vez um domínio da
economia que está bem abaixo do meu merceeiro, não só vai falhar conduzindo o
país a uma situação que levará o governo grego a dizer que não quer ser como
Portugal, como a economia paralela terá o maior crescimento de que há memória.
Como todas as entidades prevêem a recessão estará bem acima
do previsto, isso significa que o OE para 2013 está aldrabado, as receitas
fiscais ficarão muito aquém das despesas pois estão inflacionadas com previsões
de crescimento irrealistas e aldrabadas. Mas a desgraça não se fica pelas
contas aldrabadas do ministro, uma parte significativa de sectores de
actividade económica vão transferir-se para a economia paralela, à semelhança
da construção civil e de outros sectores onde os trabalhadores já recebem uma
parte significativa dos salários “livres de impostos”.
A única forma de as empresas impedirem a saída dos
trabalhadores é pagando-lhes uma parte significativa dos ordenados “por fora”,
se não o fizerem sujeitam-se a perder os seus melhores trabalhadores que depois
de ficarem sem ordenado após pagamento do resgate gaspariano optam pela emigração
ou pela mudança para empresas que operam no paralelo. Para muitas empresas a
sobrevivência passa pela sua transferência para a economia.
O merceeiro do meu bairro faria orçamentos melhores do que
os do Gaspar, para uma política económica destas não teria sido necessário
gastar tanto dinheiro com a educação do virginal ministro. Esta política não só
é um desastre como promove a discriminação entre portugueses e funciona como um
forte desincentivo ao investimento e um poderoso estímulo à economia paralela.