Quem ouve alguns responsáveis arrisca-se a ter um grave
problema de identidade e julgar ser uma Alice no País das Maravilhas. Graças às
reformas do Álvaro as exportações transformam-nos num novo tigre europeu, os
mercados financeiros estão ansiosos em que Portugal venda dívida soberana, o
crescimento económico está quase a chegar, os desempregados já podem começar os
aquecimentos com um mata bicho. Mas a verdade é outra e aquele que alguns nos
pretendem impingir como um caso de sucesso pode estar à beira da catástrofe.
Um governo de gente irresponsável tem associado aos pacotes
de austeridade a condenação de determinados grupos sociais, atirando
portugueses contra portugueses, uma estratégia sinistra que põe em causa a
coesão nacional e o conceito de nação, só podendo conduzir ao conflito interno.
Umas vezes a culpa é dos pobres que consumiram em excesso, outras é dos
malandros dos funcionários públicos a que juntaram os inúteis dos reformados,
por fim a culpa foi atribuída aos empresários instalados que por terem os salários
em dia rejeitaram o frete da TSU.
O défice derrapou dando lugar a um desvio colossal que
obrigou a um aumento brutal de impostos cujo único resultado possível é mais um
défice colossal, o aumento da dívida soberana, a destruição de empresas e de
tecido económico e social. A consequência disto só poderá ser um terceiro
programa de austeridade a decidir em meados de 2013 com a promessa de que o
crescimento chegará pontualmente com um ano de atraso, no segundo semestre de
2014. A única consequência possível desta situação é o receio da ruína com a
consequente corrida às poupanças guardadas nos bancos, de que resultará a
falência de um sistema financeiro de bancos geridos por gente oportunista e sem
escrúpulos que num passado recente não hesitaram em vigarizar os seus clientes
levando-os a comprar as suas próprias acções sem valor.
Os jovens quadros e trabalhadores qualificados aproveitam-se
da livre circulação na União Europeia e fogem de um governo louco que parece
apostado em reintroduzir a escravatura. O país perde os recursos que investiu
no ensino, o investimento que os pais fizeram nos filhos, contribuindo para
economias ricas que nos emprestam dinheiro a troco de juros dignos de
proxenetas.
Nenhum empresário no seu pleno juízo investe num país
governado por loucos, abandonado por jovens quadros e profissionais
qualificados, à beira de um conflito social, com um sistema bancário gerido por
xulos e onde num dia se decidem cortar dois vencimentos e uma semana depois
opta-se por um aumento brutal de impostos. Nenhum empresário aposta num país
onde o ministro das Finanças parece divertir-se a decidir programas de
austeridade, produz orçamentos aldrabados, não acerta numa única previsão e
parece que está convencido de que responde perante o ministro das Finanças alemão
e que a opinião dos portugueses é uma cena que não lhe assiste.
Portugal é um país mal governado, à beira de uma grave ruptura
política, onde a Constituição da República é ignorada ostensivamente, com um
Presidente da República que parece ter menos poderes do que o faroleiro das
Ilhas Selvagens, com uma justiça que não augura nada de bom. Portugal é um
barco a naufragar, com os seus melhores tripulantes a abandoná-lo e a andar em
direcção ao rochedo.