Se o polícia brutamontes de Guimarães soubesse quem era o homem que veio a agredir ter-se-ia comportado daquela forma? Talvez o polícia não tenha experiência de controlo de multidões e ao fim de várias horas e provavelmente com alguma aversão clubística à mistura estivesse com os nervos em franja. Mas um graduado da PSP saberia que um empresário, com um certo nível de educação e com tantas testemunhas por perto e não só, não seria o alvo mais aconselhável para descarregar a sua ira.
Ao contrário do que sucede em muitos países europeus por cá estereotipo do adepto desportivo que vai para o estádio é o de um jovem ou trabalhador pouco qualificado, muitas vezes um pequeno delinquente que vai para o estádio fazer o que não pode fazer no dia a dia. Talvez devido ao ambiente de tensão o brutamontes não se deu ao trabalho de fazer uma avaliação da vítima e pelas imagens percebe-se que foi tudo tão rápido que essa avaliação já estava na cabeça do polícia antes da agressão.
Se a vítima fosse alguém sem grandes recursos e cultura não só tinha levado o “ensaio de porrada” como depois seria condenada por injúrias e cuspidelas falsas. Mas como não foi o caso já se fala em precipitação, situação de excepção, ainda que na história da PSP não exista um único auto em que um gradua escreva que se excedeu, que bateu na pessoa errada.
Não estamos perante um caso isolado, ainda no passado dia 12 um jovem que estava acusado de abuso sexual de dois menores e que estava em prisão preventiva há quase um ano foi mandado para casa. Curiosamente a justiça não provou a sua inocência, o juiz optou por um “in dúbio pro réu”, uma fórmula muito confortável para os inspectores da Polícia Judiciária e para o Ministério Público, ilibou-se um inocente mas recorreu-se a uma fórmula jurídica que ilibava igualmente uma acusação.
Durante o julgamento o arguido queixou-se das ameaças e das agressões por parte dos agentes da Polícia Judiciária. Terá sido emitida alguma certidão para proceder a averiguações? Muito provavelmente não e mesmo que tal sucedesse iria acabar em águas de bacalhau, como sucedeu com a mãe da Joana, agredida por vários inspectores da PJ, onde se incluíam um bandido preso recentemente e um outro condenado a uma indemnização milionária aos pais da Maddie. Perante essa acusação o MP recuou na acusação ou os agentes da PJ que testemunharam vacilaram? Não, o MP manteve a acusação até ao fim e o jovem pode dar-se por contente.
Se o jovem fosse filho de uma família abastada teria sido agredido (torturado) pelos polícias e acusado sem provas? Tenho muitas dúvidas e ainda que na alta política as lutas de vida ou de morte travadas por polícias e magistrados já possa envolver e levar à prisão de um ex-primeiro-ministro, no dia a dia que raramente chega às televisões a nossa justiça é muito forte e corajosa com os fracos e muito fraca e cobarde com os fortes.
É por isso que aquilo a que se assistiu em Guimarães e que está longe de ser um caso raro ganhou a dimensão mediática que teve não só pela presença de crianças, mas principalmente por estar em causa alguém a quem falas acusações não pegam com facilidade. Se fosse um membro da claque residente na Cova da Moura que tivesse ido ver o jogo a Guimarães haveria por aí muito boa gente a concordar que um estádio de futebol não é local para crianças e muitos conseguiriam ver a escarreta voando no vídeo da CMTV.
De vez em quando os nossos polícias fazem erros de avaliação e muito provavelmente foi isso que sucedeu. É por isso que casos como o jovem cuja vida foi destruída por uma falsa acusação acompanhada de agressões não mereceu qualquer indignação e os nossos polícias e demais justiceiros ainda terão saído do tribunal a rir e dizendo que o rapaz ainda se pode dar por contente por ter beneficiado das dúvidas de um juiz mais atento. Porque muitos outros ter-se-iam tramado com cinco ou seis anos de cadeia e no dia do julgamento polícias e magistrados teriam dormido na paz dos anjos depois de um dia de trabalho cansativo mas bem sucedido.