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Campo das Cebolas, Lisboa
Jumento do dia
Maria Luís Albuquerque, ministra das Finanças
No mesmo dia em que Passos Coelho diz que não tem pressa para apresentar as suas propostas a usa ministra das Finanças surpreende o país com a sua declaração de que a direita pretende cortar nas pensões, medida que já foi ensaiada e devidamente chumbada pelo Tribunal Constitucional. Percebe-se que Passos nada diga sobre as suas propostas, não são mais do que as mesmas que já implementou ou tentou implementar durante estes quatro anos, o empobrecimento forçado dos portugueses na esperança de a desigualdade social trazer progresso ao país.
Era de esperar que a ministra das Finanças se tivesse pronunciado sobre as propostas dos economistas convidados pelo PS, no pressuposto de que domina as matérias poderíamos assistir a um debate entre quem defende determinadas políticas e quem acha que há alternativas. Mas parece que a ministra tem medo de ir a jogo e prefere piadolas perante a miudagem disciplinada do PSD. É pena.
«Para Maria Luís Albuquerque, "fazer a promessa de que não fazemos nada para aqueles que já são pensionistas e que vamos fazendo tudo sobre os que lá chegarão no futuro é de uma enorme injustiça".
A ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, disse, na noite de sábado, que o processo de garantia da sustentabilidade da Segurança Social pode passar por reduções nas atuais pensões, se tal significar uma melhor redistribuição do esforço.
Durante uma sessão de perguntas e respostas em Ovar, no âmbito do evento "Aveiro em Formação" da Juventude Social-Democrata do distrito, a ministra disse que "é honesto dizer aos portugueses que vai ser preciso fazer alguma coisa sobre as pensões para garantir a sustentabilidade da Segurança Social".
"E essa alguma coisa pode passar, se for essa a opção, por alguma redução mesmo nos atuais pensionistas. Se isso for uma distribuição mais equilibrada e razoável do esforço que tem de ser distribuído entre todos, atuais pensionistas, futuros pensionistas, jovens a chegar ao mercado de trabalho, se essa for a solução que garante um melhor equilíbrio na distribuição desse esforço, é aí que nos devemos focar", afirmou Maria Luís Albuquerque.» [DN]
Maria Luís Albuquerque, ministra das Finanças
No mesmo dia em que Passos Coelho diz que não tem pressa para apresentar as suas propostas a usa ministra das Finanças surpreende o país com a sua declaração de que a direita pretende cortar nas pensões, medida que já foi ensaiada e devidamente chumbada pelo Tribunal Constitucional. Percebe-se que Passos nada diga sobre as suas propostas, não são mais do que as mesmas que já implementou ou tentou implementar durante estes quatro anos, o empobrecimento forçado dos portugueses na esperança de a desigualdade social trazer progresso ao país.
Era de esperar que a ministra das Finanças se tivesse pronunciado sobre as propostas dos economistas convidados pelo PS, no pressuposto de que domina as matérias poderíamos assistir a um debate entre quem defende determinadas políticas e quem acha que há alternativas. Mas parece que a ministra tem medo de ir a jogo e prefere piadolas perante a miudagem disciplinada do PSD. É pena.
«Para Maria Luís Albuquerque, "fazer a promessa de que não fazemos nada para aqueles que já são pensionistas e que vamos fazendo tudo sobre os que lá chegarão no futuro é de uma enorme injustiça".
A ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, disse, na noite de sábado, que o processo de garantia da sustentabilidade da Segurança Social pode passar por reduções nas atuais pensões, se tal significar uma melhor redistribuição do esforço.
Durante uma sessão de perguntas e respostas em Ovar, no âmbito do evento "Aveiro em Formação" da Juventude Social-Democrata do distrito, a ministra disse que "é honesto dizer aos portugueses que vai ser preciso fazer alguma coisa sobre as pensões para garantir a sustentabilidade da Segurança Social".
"E essa alguma coisa pode passar, se for essa a opção, por alguma redução mesmo nos atuais pensionistas. Se isso for uma distribuição mais equilibrada e razoável do esforço que tem de ser distribuído entre todos, atuais pensionistas, futuros pensionistas, jovens a chegar ao mercado de trabalho, se essa for a solução que garante um melhor equilíbrio na distribuição desse esforço, é aí que nos devemos focar", afirmou Maria Luís Albuquerque.» [DN]
Uma biografia doente
«Uma biografia que começa a mistificar logo na biografia da biógrafa*. Não foi exactamente para a verdade que a propaganda política nasceu no mundo. Mas quando a biografia autorizada de um primeiro-ministro eleito democraticamente consegue estar 235 páginas a defender os valores que ela própria renega, frase a frase, facto a facto, temos de admitir que subiu de patamar. Ou desceu. Não vamos é ficar no mesmo sítio. É um assunto sério.
Os historiadores e colunistas do PÚBLICO Vasco Pulido Valente e José Pacheco Pereira publicaram textos importantes sobre o caso. A 10 de Maio, sob o título “Um diletante”, Pulido Valente defendeu que a política sempre foi “um subgénero do teatro e da literatura”, começando pelo exemplo de Churchill, e que hoje, com a omnipresença da televisão, “cada frase, cada movimento, precisa de ser pesado e calculado com antecedência e minúcia. Um elogio entusiástico à pessoa errada, revelações despropositadas numa pretensa biografia podem arruinar — e frequentemente arruínam — a propaganda de meses”. O “diletante” Passos Coelho não se prepara “para essa parte essencial do seu trabalho”, reincide num “amadorismo destrutivo e patético”, no “comentário néscio” e “numa biografia (Santo Deus!) que envergonha as pedras. Não leu, ninguém lha mostrou?”
Um dia antes, a 9 de Maio, Pacheco Pereira confessava como lhe foi penoso ler Somos o Que Escolhemos Ser, de Sofia Aureliano, “dada a vacuidade geral e o terrível mau gosto que o perpassa de uma ponta à outra. O mau gosto, aquilo a que se costuma chamar “possidónio”, chega a incomodar porque, se há coisas que eu não quero saber sobre o primeiro-ministro de Portugal, este ou qualquer outro, são exactamente muitas das que enchem o ‘lado humano’ do livro”. O político do PSD que mais se tem destacado no combate à coligação no poder acrescenta: o livro “rompe com aquilo que sempre considerei uma qualidade de Passos Coelho, a reserva sobre a sua vida privada” e “consegue a proeza de, em vez de o puxar para cima, como os autores da encomenda certamente pretendiam, puxá-lo para baixo, para uma trivialidade tão evidente que não serve os objectivos hagiográficos da publicação”.
Tenho a certeza de que Pulido Valente e Pacheco Pereira têm razão, mas não estou seguro de que a conclusão seja certa. É verdade que o livro consegue ser aflitivo, a começar pela capa. Um homem a apertar a gravata como um garrote (o dever, a dolorosa responsabilidade de salvar a pátria?), mas satisfeito, normal. A olhar-nos de frente ou a ver-se ao espelho antes de ir trabalhar.
Para ir direito ao assunto, acredito que o mau gosto é intencional, tal como acredito que as gaffes nos improvisos — elogios ao “exigente e metódico” Dias Loureiro, dizer que as vidas humanas devem ser salvas mas “não a qualquer custo” — surgem cada vez mais de propósito para compor o retrato de um homem que diz “sempre o que pensa”. Não serão gaffes, só o parecem. Ele é aquele que não hesita em afrontar todas as opiniões e todos os poderes (e todos os gostos...), incluindo denunciar e ridicularizar o parceiro de coligação Paulo Portas — ao contar que a sua demissão “irrevogável” foi apresentada de surpresa e por sms, a 3 de Julho de 2013 — e o seu principal aliado, o Presidente Cavaco Silva, que terá prejudicado o país ao deixar “o governo em banho-maria durante os vinte dias de estéril negociação com o Partido Socialista” (pág. 208).
Passos Coelho pretende afirmar-se como uma espécie nova de político providencial — é isso que o livro faz com tantas mistificações do seu percurso de vida, tantas omissões do verdadeiro papel de aliados agora inconvenientes (Miguel Relvas, Ângelo Correia, despachados numa frase). Honrado, verdadeiro, transparente, apesar das “imperfeições”. Como a história muito mal explicada do que fazia e ganhava na Tecnoforma e a quantidade de anos em que foi trânsfuga da Segurança Social, de 1999 a 2004, os “anos em que este cidadão foi mais imperfeito” (pág. 136).
Passos Coelho e os seus assessores estão a construir, com tiros conscientes que parecem disparos ingénuos, um mito de príncipe popularucho que vive como a classe média, as “pessoas como nós”, um messias de subúrbio contra o elitismo da linha de Cascais “que têm amigos da Quinta da Marinha e adoram velejar aos domingos” (pág. 178). Ao mesmo tempo, esconde, por pudor, a dimensão verdadeira da sua cultura (leituras, ópera). Ele podia ter sido médico, ele podia ter sido cantor. Mas é um homem que sacrificou o talento e a própria família ao serviço dos portugueses. Passos Coelho, “o Imperfeito”. Mais um salvador da pátria. O costume. Já cá fazia falta.
Assim, a aparente falta de estratégia comunicacional transforma-se em virtude. Ele não tem tempo para pensar nisso, e é o primeiro a sofrer com a incompreensão. Mas o seu coração apaixonado aguenta tudo: tem um sangue-frio como nunca se viu. Mas a frieza afinal é calor. E a opacidade, transparência.
Assim, também, o despudorado e angustiante mergulho na sua vida privada, nas desgraças da família e, principalmente, na situação da mulher, Laura Ferreira, que ocupa boa parte da biografia.
Quem lê o livro apanha com um vendaval de tuberculoses (os avôs, mais os pais de Pedro), de cancros, crises renais, crianças que nascem deficientes, sobrevivências improváveis, mortes reais e medos de morrer amanhã. E, no entanto, o livro está sempre a dizer que Pedro Passos Coelho protege sempre, mas sempre, a sua vida privada e que nunca a usará para objectivos políticos. Um homem que diz “que se lixem as eleições” também perceberá a expressão “é preciso ter lata”.
Pacheco Pereira pensa que o livro prejudica Passos Coelho, que o “puxa para baixo”. A sua interpretação, limpa de sarcasmo ou ironia, é certamente válida para muitas pessoas. Outras pensam que o livro se autodestrói na manipulação grosseira e que só pode ser lido como sátira involuntária. A deputada Isabel Moreira, do PS, apareceu na televisão (RTP Informação) a publicitar o livro, pedindo a todos os portugueses que o leiam para que vejam como Passos “é um mentiroso”. O exemplo que deu, entre risos, foi esta citação do primeiro-ministro: “Sempre tive uma sede, uma vontade, quase aditiva, pelo conhecimento.” Acrescento outra parecida: “Para Passos Coelho, a demonstração do conhecimento não deve ser gratuita e o fim em si mesmo. Deve existir para acrescentar valor. Já era assim que pensava há trinta anos.” Isto num livro que junta citações de Passos, Shakespeare, Churchill, Saint-Exupéry, Mark Twain, Aristófanes, o filósofo Sócrates e que cita erradamente, como lembra Pacheco Pereira, a frase “em política, o que parece é”, como se fosse de Sá Carneiro, quando pertence a Oliveira Salazar.
Mas vivemos num momento da política em que verdade e mentira deixaram de ser opostas. Aliás, nem lutam uma contra a outra. Não faz qualquer diferença. Só conta o efeito imediato, amanhã logo se vê. Mas a mentira é insidiosa e fura a verdade como a água fura a pedra e deixa um buraco. É por isso que é possível ler neste livro, de várias formas, a frase do sr. Cardoso, dono do restaurante Comilão, “o Pedro diz sempre a verdade” (pág. 84), omitindo a lista de promessas falsas que Passos Coelho fez para ganhar as eleições, a começar pela garantia de que nunca iria cortar salários porque isso era “um disparate”.
A autora, aliás, situa-se bem na introdução: a biografia “não tem a pretensão de ser um retrato fiel do que foi a vida deste homem nem do que é hoje a base do seu pensamento. Essa história só ele a poderá contar” (pág. 9).
Mas, enquanto esperamos por esse dia, é preciso admitir o efeito eleitoral do livro, escrito na sua forma simplista, redundante, apaixonada, “possidónia”.
Passo a citar frases que podem ser lidas com distanciamento, como propaganda mal feita, ou, pelo contrário, podem entrar, pelo sentimentalismo e persuasão, numa grande parte do eleitorado, objectivo último desta biografia.
Sobre a mãe de Passos Coelho, que sempre quis ter um filho “loirinho de olhos azuis”:
Passos Coelho e os seus assessores estão a construir, com tiros conscientes que parecem disparos ingénuos, um mito de príncipe popularucho que vive como a classe média, as “pessoas como nós”, um messias de subúrbio contra o elitismo da linha de Cascais
“Bia acusa a passagem do tempo e, apesar de ser um ano mais nova do que António [pai de Pedro, médico], ‘a idade pesou-lhe de outra maneira’. Ainda assim, não deixa de ter energia para se martirizar com o que sabe dizer-se, todos os dias, nos jornais e na televisão, sobre o seu filho mais novo. Apesar de se isolar, como que a esconder-se do tempo, acompanha diariamente o que se diz sobre Pedro e, como qualquer mãe que vê ser atacado o filho, vive numa angústia imensa. Uma das suas maiores alegrias seria ver o filho longe da pressão que o caminho que escolheu seguir lhe impõe. Acaso o filho se afastasse da política, Bia não iria ficar triste. Pelo contrário!” (pág. 35).
Sobre a juventude em Vila Real, na JSD:
“Quer fosse pela tenra idade ou pela clareza das ideias, conseguia passar as suas mensagens. Pedro, não tendo essa consciência, acredita que isso se deveria ao facto de se munir sempre de dois grandes aliados: a verdade e a convicção. ‘Nunca usei a minha capacidade de intervenção para atingir um objetivo preciso de uma forma artificial que não tivesse que ver com a convicção que tinha quanto ao julgamento que fazia do que pensava do que defendia. Sempre afirmei aquilo em que acreditava’” (pág. 52).
Sobre o talento “esplendoroso” de Pedro Passos Coelho para a escrita:
“‘O Pedro escrevia e escreve esplendorosamente bem, melhor do que qualquer um de nós. Era normal que, para além de tudo o resto, na divisão de tarefas, lhe fosse dada a de elaboração de textos’. Recorda Luís Monteiro” (pág. 68).
É na parte dos sentimentos íntimos e da história familiar que o livro tem mais contradições. Para não usar outras palavras que todos entendem sem demonstração gratuita de conhecimento: hipocrisia ou cinismo.
“Mas esconder o que sente, mesmo não sendo um ato racional, não pode ser visto como uma desonestidade? Perante esta resposta, Pedro vira o tabuleiro. Usar a informação sobre factos que aconteceram na sua vida, que nada têm a ver com a política, com a tomada de decisão ou com o exercício da sua função, isso sim seria incorreto.
‘Não gosto de dar a ideia de poder estar a manipular ou a utilizar o sentimento das pessoas em favor de um determinado objectivo.’
Esta não é a postura mais comum, existe essa consciência. O mais fácil era deixar que se fizesse uso da sua história. E também seria o mais lógico. Não só porque o que vivemos é muito importante para a construção do que somos, mas também porque o facto de não demonstrarmos o que sentimos, fruto do que vivemos, pode ser interpretado como uma ausência de sentimento. Se não contarmos nós a nossa verdade, alguém contará a história por nós. Corremos o risco de que não seja a versão verdadeira.”
Mais adiante, Passos explica-se ainda melhor:
“Acho que existe um espaço próprio para a intimidade. Devemos distinguir aquilo que somos da nossa relação pessoal, da nossa intimidade, na nossa reserva, daquilo que é o nosso desempenho público. São coisas distintas” (pág. 120).
Distintas? Pedro Tadeu, no Diário de Notícias de 12 de Maio mostrava a sua surpresa e a da generalidade dos jornalistas por terem sido enganados. Tinha-se pedido reserva noticiosa sobre o cancro de Laura, a mulher de Passos Coelho. “Mas eis que num livro de propaganda política, de elogio à personalidade de Pedro Passos Coelho, a privacidade solicitada deixa de o ser e o cancro de Laura Ferreira é servido ao sentimentalismo das massas.”
E é assim que Laura surge a confessar como está apaixonada por Pedro porque ainda sente “borboletas na barriga” quando ele lhe telefona de surpresa para jantarem fora. E ficamos a saber que tipo de cancro lhe apareceu na perna, da prótese no joelho, das sessões de quimioterapia que continuam, do cancro que “atira o ânimo para uma gruta escura”. Do medo de morrer, misturado com o marido em acção:
“Laura, que sempre foi o porto seguro, o abrigo onde Pedro encontrou o conforto para ser ele próprio, é agora quem carece de força anímica.
A doença obrigou a uma total alteração de rotina do casal. Os que antes estavam estabelecidos como ritmos de um dia-a-dia normal, deixaram de existir. Pedro Passos Coelho, primeiro-ministro de Portugal, tenta agora gerir os dias entre a agenda de Estado e as obrigações de marido e de pai. Conta com a ajuda da família, sobretudo da filha e da irmã de Laura, mas na maior parte das vezes não dispensa o papel de pilar da família. Agora, é Pedro quem tem de ser o porto seguro. ‘Eu tenho medo de deixar as minhas filhas, a minha família, o meu marido. Tenho muito medo de morrer. O Pedro consegue tranquilizar-me e dar-me uma força’” (pág. 145).
Mais tarde, Passos Coelho, o discípulo do falecido António Borges, que defendia uma sociedade com uma elite de financeiros e empreendedores apoiada numa extensa mão-de-obra barata, aparece como o exemplo mais belo e genuíno da classe média, numa casa “nos arrabaldes”, aberta a petiscos e fados de fim-de-semana:
“Um apartamento espaçoso onde Pedro e Laura conseguem acolher todos os que amam e fazem questão de manter por perto no dia-a-dia. Uma casa decorada sem a tirania da estética ou das novidades estilísticas, onde cabem pedaços da história dos dois, das filhas de um, de outro e da de ambos. E ainda há espaço para Peluche e Olívia, as cadelas da família que completam, com o seu entusiasmo sonoro, o quadro mais genuíno da arte de bem receber. Ali, nada é pretensioso nem preparado. A simplicidade da receção é tão autêntica como a singeleza do espaço, onde o que se sente mais é vida. Ali vivem pessoas de carne e osso, pessoas como nós. Foi fácil sentir-me entre amigos” (pág. 179).
Linguagem onde ecoam maneiras de escrever antigas, as de um “acrisolado amor à Pátria”, algures entre as descrições oficiais de 1940 da “Aldeia Mais Portuguesa de Portugal” — onde as “casas são de granito em grandes silhares e perpianhos” e “o coveiro de Monsanto, primoroso tocador de flauta, é uma das pessoas mais alegres da aldeia” — e as aventuras de Anita (agora Martine) com o seu cachorrinho-salsicha, o Pantufa.
É num prédio de Massamá que habita um homem, um primeiro-ministro que faz com as próprias mãos os papos-de-anjo no Natal e estende a roupa e guarda sempre os domingos para o almoço de família. É um governante doméstico.
E que vive com “desconcertante desapego ao poder” para a desconcertante conclusão do livro (pág. 234):
“É exímio na protecção da sua vida privada e não levanta o véu, nem quando a vê ser agredida por inverdades. Não reage às falácias que se constroem sobre o que é, como vive ou que hábitos possui. Tem o conforto de saber que só há um Pedro, e é o mesmo antes e depois de ser primeiro-ministro. Esta manutenção de um ‘eu’ privado, que nem sempre foi propósito ou estratégia de outros primeiros-ministros, é para Pedro Passos Coelho condição incontornável. É aquela que lhe assegura que a sua identidade não se esgota no ser político e lhe dá espaço para que se possa entregar, mais genuinamente, aos outros papéis, não menos importantes: de pai, marido, filho, irmão, homem.”
Esta figura opaca que mistura família e política negando fazê-lo acaba de lançar novas bases populares para a conquista das próximas eleições. Para a manutenção no poder. Ingénua, mal feita, a biografia quer construir um novo mito português.
* Ao contrário do que sugere o resumo da sua vida profissional na badana do livro, Sofia Aureliano nunca foi produtora do programa de humor Contra-Informação» [Público]
Autor:
Ri«ui Cardoso Martins.
Os gestos e trejeitos de Carlos Costa
«“Carlos Costa ao afirmar ‘com toda a clareza’ expressa uma linguagem corporal completamente em desacordo com ‘clareza’, exibindo assim uma forte incongruência, sendo uma excelente revelação de que não existe clareza nenhuma na afirmação que proferiu”. A frase é de Rui Mergulhão Mendes, especialista em linguagem corporal, a quem a Revista 2 pediu que observasse e interpretasse os depoimentos dos protagonistas que passaram pela comissão de inquérito ao caso BES. No caso de Carlos Costa, independentemente dos trejeitos e das caretas, ficou claro para quem ouviu (e não precisava sequer de ver) que o governador falhou em quatro pontos: demorou muito tempo a afastar Ricardo Salgado, criou expectativas falsas aos subscritores do papel comercial e aos pequenos accionistas, garantiu que o BES estava sólido numa altura em que já não estava, e a sua relação (ou falta dela) com a CMVM foi confrangedora.
É com estas falhas no currículo que Carlos Costa se apresenta como potencial candidato a suceder a Carlos Costa no cargo de governador, estando já a provocar brechas no Governo e uma grande fractura com os partidos da oposição. Passos Coelho já lhe fez rasgados elogios. Percebe-se que para o primeiro-ministro seria incómodo mudar de governador numa altura em que a campanha eleitoral estará ao rubro. Qualquer deslize na venda do Novo Banco, ou nas reestruturações do Banif e do Montepio poderia ser fatal para a maioria. O actual governador tem pelo menos a vantagem de já conhecer os dossiers. E Passos tem uma espécie de dívida moral para com Carlos Costa; mesmo nos momentos mais difíceis do caso BES, o governador tomou sozinho as dores do processo e permitiu que o Governo passasse relativamente incólume num caso em que também foi protagonista.
Mas do ponto de vista da coerência manter o governador é no mínimo questionável. A própria ministra das Finanças, que dentro do Governo é quem mais lida com o Banco de Portugal, foi ao Parlamento dizer que “a supervisão se calhar também devia ter visto mais cedo” o que aconteceu no BES. Mas quem manda é o primeiro-ministro.
Esta nomeação para a continuidade de Costa poderá, no entanto, ganhar contornos caricatos. É que segundo a nova lei, que já foi aprovada por iniciativa do Partido Socialista, o candidato ao cargo de chefia do banco central terá de ser ouvido previamente no Parlamento e alvo de um relatório de apreciação por parte dos deputados. O que nos leva a questionar: o Parlamento não acabou de fazer uma relatório, e de o aprovar por uma larga maioria, onde avalia o trabalho de Carlos Costa? E nesse relatório não são feitas várias críticas ao governador, nomeadamente a de ter “actuado tardiamente” no caso BES? Dizem os especialistas em linguagem corporal que 93% do que comunicamos não é por palavras, mas por gestos e pequenas expressões do rosto. E na nomeação de Calos Costa é difícil evitar um torcer de nariz.» [Público]
Autor:
Editorial.
PS desertou em combate
«O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, disse este sábado que o PS “desertou em combate” como partido da oposição nos últimos quatro anos e esteve “comprometido” com as políticas desenvolvidas pelo Governo PSD/CDS-PP.
“Em relação ao estar na oposição, tardou muito, um PS que durante quatro anos esteve preso, eu não diria pelo rabo, porque a imagem pode ser ofensiva, mas esteve condicionado, desertou em combate porque esteve comprometido com esta política, com a situação que vivíamos”, disse o líder do PCP.» [Público]
Parecer:
Certamente Jerónimo de Sousa deve estar a falar do glorioso combate em que se juntou à direita para ajudar o FMI a vir e à formação do pior governo que já teve.
Despacho do Director-Geral do Palheiro: «Sugira-se a Jerónimo de Sousa que apoie menos a direita.»
Enfim, falar em honestidade
«“Ia a passar na estrada e vi um cartaz, que acho que é novo, do PS, e onde falam em rigor”, contou a ministra perante jovens do partido. “Isto é extraordinário que falem em rigor – o PS. Enfim… sem comentários”» [Observador]
Parecer:
A senhora que fez estes comentários é a mesma dos negócios com swaps.
Despacho do Director-Geral do Palheiro: «Sorria-se.»
Despacho do Director-Geral do Palheiro: «Espere-se para ver.»