sexta-feira, abril 29, 2016

Combate à evasão ou sacanice fiscal?

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Há uns anos atrás vi uma empregada de limpeza ser obrigada a para o IUC e sucessivas multas relativas a vários anos por uma viatura que tinha mandado para a sucata. O fisco dessa personagem do CDS que era Paulo Núncio, agora advogado na Morais Leitão, foi extremamente zeloso, sabendo que há muito que os portugueses ignoravam a lei e pensavam que só tinham de pagar o IUC em relação aos veículos em circulação, alguém decidiu montar uma armadilha aos portugueses para empolar as receitas em IUC e em multas.
  
Já em relação aos capitais que tinham emigrado para fugir aos impostos o mesmo senhor foi muito simpático a regularizar esses dinheiros fugidos. Isto é, o então secretário de Estado sabia muito bem que estava a obrigar muitos cidadãos a pagar o IUC por carros que tinham sido roubados ou que há muito que estavam na sucata mas foi de um grande rigor, cobrou até ao último tostão. Já em relação aos dinheiros que sabia terem fugido ao pagamento dos impostos foi de uma grande candura e simpatia. E para os que tinham fugido aos impostos sem levar o dinheiro lá para fora foi igualmente simpático e montou um mega perdão de multas e juros.
  
O país viveu quatro anos sob um regime de sacanice fiscal onde os ricos beneficiaram, de vista grossa por parte dos responsáveis pela política fiscal, para os pobres adoptou-se o rigor e cobrou-se até ao último tostão, para os ricos foi só delicadezas e chegou-se ao ponto de recusar o acesso aos tribunais para os menos ricos, subindo para 5000 euros o patamar a partir do qual se corre recorrer das decisões da máquina fiscal para o tribunal. Isto é, o pobre só pode recorrer até ao secretário de Estado, por outras palavras, o pobre come e cala.

Sabe-se agora que nada se conseguiu que os dados do caso Swissleaks não serviram para nada, informa o chefe de gabinete que “A informação constante das fichas apenas incide sobre o período temporal de 2005 e 2006. Importa referir que, relativamente a este período, já se encontra vedado, por caducidade, o direito à liquidação por parte da AT (quatro anos)”. Terei lido bem?

Então para caçar as cabeleireiras, os donos das tascas e os bate-chapas temos o e-fatura, as guias de circulação, milhões de contribuintes a verificar se o corte de cabelo consta nos benefícios fiscais e zelosos funcionários do fisco cruzando bases de dados, espremendo tudo e mais alguma coisa, chamando à repartição todos os contribuintes com direito a benefícios fiscais por serem coxos ou manetas e para os mais ricos diz-se “ai que se escaparam, o prazo caducou!”.
  
Mas só os barbeiros e os bate-chapas é que é gente perigosa? Esse pessoal vip da Swissleaks não teve todos os seus rendimentos e negócios escrutinados, estes contribuintes e os seus parceiros e sócios não deveriam ter uma vigilância apertada? Há aqui qualquer coisa de errado, o barbeiro passa a factura e não a manda no ficheiro xpto para a informática do fisco e é metido na lista de gente perigosa. São apanhados centenas de trafulhas, o fisco não fez nada e agora dizem-nos “ai, não conseguimos fazer nada!”.
  
Só se conseguem cruzar as facturas do barbeiro? Só as cabeleireiras é que são perigosas evasoras fiscais? Só quem se engana na declaração do IRS é que é detectado pela perigosa máquina informática?  

Será que o rigor, as armadilhas, os e-faturas, os cruzamentos de dados, as chamadas às repartições para trazer farturas e provar que se é maneta só se aplica às pequenas e médias empresas, à classe média e aos pobres? Sim, porque quando foram as energéticas a mandar o fisco à bardamerda o então secretário de Estado fez questão de forçar o subdirector-geral do fisco a usar um desses coletes que lhe dava um ar de canalizador e obrigou-o a ir à sede da REN armado em detective Colombo, como se isso assustasse os chineses da REN ou da EDP.