Aquilo a que o país está a assistir é muito mais do que o justificável pela crise financeira, a direita chegou ao poder num momento de crise e desencadeou uma autêntica orgia de ataque aos mais elementares direitos constitucionais, é uma verdadeira caça ao cidadão português com direitos. O país assiste atónito a esta revisão constitucional de facto, os únicos preceitos constitucionais em vigor são os que conferem legitimidade ao governo em funções, todos os outros podem ser eliminados em nome da crise.
O Tribunal Constitucional já declarou inconstitucional um corte definitivo dos vencimentos dos funcionários públicos, o governo achou que um corte era pouco e acrescentou o corte dos subsídios por dois anos, entretanto o governo já vai sugerindo que o corte pode ser definitivo e é dessa forma que comunica a Bruxelas. Isto é, temos um governo que ignora a Constituição, que julga que basta invocar a crise para atribuir a um qualquer Vítor Gaspar plenos poderes para espremer os portugueses.
Um dia destes os mesmos que acharam que em nome da crise poderiam mandar o Tribunal Constitucional à fava vão concluir que em nome da superação da crise também podem reprimir qualquer sinal de oposição à acção governativa. Por este andar os tribunais plenários ainda serão recuperados em nome da necessidade de meter o país na linha, de forma a não parecermos a Grécia.
A orgia é tal que todos os dias se organizam seminários patrocinados pelo governo onde os representantes das associações empresariais se divertem a propor mais cortes de direitos, menos salários, mais horas de trabalho. Todos apoiam os cortes no Estado e nos direitos dos funcionários púbicos, se uns dizem mata, outros acrescentam esfola. Estão convencidos de que depois dos trabalhadores do Estado será a vez dos trabalhadores do sector privado, querem retirar em dois anos tudo o que foi conquistado em trinta, tudo isto sem PIDE ou repressão, estão convencidos de que os portugueses são mansos.
Mas estão enganados quanto à mansidão dos portugueses e arriscam-se a desencadear uma revolução social que discuta a sério as causas do nosso subdesenvolvimento e se isso suceder até o Gaspar se vai arrepender de ter defendido o TGV, nessa altura poderá dar muito jeito aos que irão fugir do que fizeram.
Mas mesmo que os portugueses sejam mansos não serão parvos e os que hoje sugerem aos portugueses que emigrem para zonas de conforto, vão andar pagar com língua de palmo o que agora querem poupar. Podem colocar um Salazar no lugar de ministro das Finanças, podem gozar que nem uns perdidos com os juízes do Tribunal Constitucional, até podem meter orelhas de burro ao Seguro, mas não podem impedir os portugueses de sair, não poderão impedir os portugueses de beneficiar da livre circulação dos trabalhadores e se não forem os sacanas a fugir serão os mais capazes deste país a abandoná-lo aos oportunistas.
Daqui a cinco anos dificilmente conseguirão um medito, um engenheiro, um arquitecto, um operário especializado disposto a trabalhar em Portugal, os mais qualificados terão abandonado o país, os mais promissores terão ido para as universidades estrangeiras. Ficarão cá os colegas do Passos Coelho na Universidade Lusíada, os jotas que trabalham para o Ângelo Correia ou que são colegas do Marques Mendes.