O governo que conta com maioria absoluta apresentou um OE e o PS de José Seguro absteve-se, como interpretar esta decisão de voto? Só há uma interpretação possível, o PS não foi contra este orçamento, transigindo na opção económica fundamentalista dos que defendem o empobrecimento dos trabalhadores, admitindo o corte institucional de 1/7 dos rendimentos dos funcionários públicos. Desde o anúncio das medidas do OE o PS deu uns gritinhos contra o IVA de 23% na restauração, aceitou implicitamente o corte inconstitucional de pelo menos um subsídio e dias antes do início da discussão atirou o tapete ao chão aceitando a abstenção incondicional.
Esta decisão é uma nódoa na história do PS pois ao não se afirmar contra um OE mais digno dos primeiros anos do Estado Novo do que de uma democracia este partido aceitou a destruição de facto dos valores constitucionais. Seguro parece estar mais preocupado com a sua boa imagem de bom rapaz merecedor da primeira comunhão do que com os eleitores do PS, com os seus pergaminhos políticos ou com o seu passado. Seguro parece ser mais uma marioneta de Passos Coelho do que o líder de uma oposição que não existe.
Mas se António José Seguro queria dar uma boa imagem de si acabou por ser gozado por Miguel Relvas. Quando Passos Coelho pediu a Passos Coelho que mantivesse um subsidiozinho para os coitados dos funcionários públicos ficou eufórico quando Relvas abriu a porta a essa possibilidade e até parece posto os spin do PSD ao serviço do líder do PS, durante dois dias o Seguro foi a vedeta dos jornais. Só que em pleno debate o mesmo Relva puxou o tapete a Seguro e deu-lhe com uma almofada quando disse que não haviam almofadas para aumentos da despesa. Enquanto Relvas iniciava uma batalha de almofadas o pobre do Seguro estatelou-se no chão, sem ter uma almofada para lhe amparar o traseiro.
Seguro permitiu a revisão do acordo com a troika pelos partidos do Governo e sem (aparentemente) ter sido ouvido, admite que o governo faça uma interpretação extremista dessa segunda versão do acordo, permite que o nome do seu partido continue a ser usado como um dos partidos da troika e no fim ainda aceita um OE digno de Salazar.
Os funcionários públicos, os trabalhadores portugueses que irão para o desemprego, as vítimas das medidas brutais desta pinochetada orçamental não têm nada que ver com as ambições de Seguro, com as suas preocupações em relação à imagem, com as suas relações de amizade com Passos Coelho ou com a sua inveja em relação a Sócrates. O que esses portugueses viram foi um PS que soçobrou perante a direita, que não teve nem coragem de apoiar, nem de chumbar o OE e acabou por votar de forma cobarde ao abster-se.