terça-feira, novembro 29, 2011

Liberais em público, fascistas em privado

Em tempos tiver a oportunidade de conviver com um jovem da JSD que fazia um estágio no Estado, em público era um liberal formado na Universidade de Verão de Castelo de Vide, em privado era um defensor do salazarismo capaz de fazer corar um marcelista. Não se tratava de um caso isolado, é uma situação muito comum à nova geração do PSD dos tempos dos actuais dirigentes.

Se nós procurarmos em Passos Coelho, Miguel Relvas e muitos outros traços de uma formação democrática não os encontramos, a afirmação da devoção à democracia é permanente mas sem que seja possível encontrar no discurso político uma matriz de valores democráticos. Antes pelo contrário, encontramos com frequência tiques ideológicos mais compatíveis com a ideologia fascista, é o caso do elogio da pobreza feito recentemente por Passos Coelho no seu Facebook, a afirmação de Relvas de que o país precisa de trabalho por oposição a greves, ou a preocupação de Vítor Gaspar com a unidade do país no dia da greve geral. Poderíamos recordar os tiques ruralista presentes no elogio à fruta por oposição aos alimentos preparados para bebés feito pela ministra da Agricultura ou mesmo no discurso do ministro da Educação que quase encaixa nos velhos admiradores da terceira classe de outros tempos.

Nunca confiei nesta combinação de vítimas dos exames de admissão com marrões feiotes ou com ar de meninos da mamã, gente com um percurso escolar cheio de galhetas e cacholetas. No discurso de gente como Paulo Macedo, Vítor Gaspar ou o Batanete da Rua da Horta Seca a palavra democracia está ausente. Para eles as medidas políticas não resultam da necessidade de respeitar qualquer equilíbrio, são soluções unívocas que eles entendem serem salvadores. No fascismo dos anos quarenta a salvação era uma emanação divina, para estes artistas do século XXI a emanação resulta da sua suposta superioridade intelectual.

Até na forma como os ideólogos deste governo elegeram um grupo social (poderia ter sido étnico ou religioso) como o culpado de todos os males e merecedor da condenação colectiva faz-nos lembrar outros tempos, só falta mesmo que os funcionários públicos sejam obrigados a usar uma braçadeira que os identifique em público ou que as suas casas sejam devidamente assinaladas. O empobrecimento forçado dos funcionários públicos por um governo de gente educada no ódio ao Estado (incluído o pobre diabo do Seguro) resultou numa reengenharia social em larga escala imposta sob a ameaça de que a alternativa seria o despedimento.

Ainda vivemos em democracia mas a verdade é que este governo está mais à direita do que o de Marcelo Caetano, os seus ministros são bem mais cinzentos do que os da Primavera Marcelista, o primeiro-ministro tem menos valor intelectual do que um par de cuecas de Marcelo Caetano e para encontrarmos um ministro com um programa, conceitos e arrogância do Gaspar teremos de recuar aos tempos em que Salazar ainda não era presidente do conselho. Nunca um governo de direita, nem mesmo nos 48 anos de ditadura de direita um governo assumiu de forma tão clara os interesses de uma classe social tão restrita como a grande burguesia, nem nunca os interesses desta classe foram defendidos de forma tão clara. Só falta mesmo a PIDE mas até nisto o governo de Passos Coelho não se deixou ficar para trás e garantiu um reforço de verbas para as polícias.