O ministro Gaspar é ameaçado e reforça a segurança pessoal depois de ter transformado o seu ministério num bunker defendido por mais homens armados do que uma boa parte das instalações militares, o Presidente da República suspende a visita a uma escola por razões de segurança, o desemprego continua a subir em flecha e já vais nos 14% com 770 mil portugueses inactivos, o ministro da Economia é aconselhado pelos seus deputados a não ser ponderado, coisa que o homem dificilmente conseguirá pois é por natureza um destravado, a Moody’s admite baixar o rating de sete bancos portugueses num momento que a banca está em dificuldades. Se não fosse o José Castelo Branco a vestir de miss universo neste Carnaval a edição online do DN não nos permitiria um sorriso.
Ainda a procissão vai no adro e já se começa a perceber a dimensão do “custe o que custar”defendido por Passos Coelho. Mas ainda estamos muito longe de ter a noção real dos custos desta política de excessos voluntariosos adoptada por um governo que a coberto da crise financeira pretendeu governar sem limites constitucionais e promover a reinvenção em dois anos de um país que parece odiar.
O custe o que custar ainda está no princípio, a banca ainda não bateu no fundo, muitas pequenas e médias empresas ainda sobrevivem ligadas “à máquina”, algumas empreitadas de obras públicas ainda estão por concluir, alguns investimentos promovidos por empresas mais optimistas ainda estão em curso, as medidas mais gravosas como o corte dos subsídios, a nova lei das rendas, a actualização dos impostos sobre o património ou o aumento do IRS ainda não se fizeram sentir. O custe que custar será mais evidente quando os portugueses forem afogados por este verdadeiro tsunami de austeridade. Por agora ainda só se sente o efeito da alteração no comportamento por parte dos mais avisados e já é evidente uma contracção económica superior à estimada para 2012.
Mas se alguém imagina que o “custe o que custar” resultante desta orgia de liberalismo extremista tem limites que se desengane, este governo tem uma agenda que vai muito para além do programa encadernado a 100 euros por exemplar (“em papel couché semimate”, com uma capa em “tons de cinza-prata” e uma “ilustração em alto-relevo”) numa empresa amiga do partido, com um título pomposo e a recordar as publicações da Mocidade Portuguesa, “Compromisso para uma Nação Forte”.
Ainda faltam muitos pontos da agenda pessoal de Vítor Gaspar por concluir, a receita liberal que o país tem de engolir ée muito mais do que o equivalente a uma colher diária de óleo de fígado de bacalhau, é todo o frasco de uma vez. Ainda falta o despedimento em massa dos funcionários públicos, a privatização da segurança social para reanimar o sistema financeiro, mais um aumento das taxas da saúde, a desqualificação dos serviços médicos prestados a título gratuito, o aumento das propinas nas universidades e muitas outras medidas que permitam aproximar a sociedade portuguesa dos modelos mais liberais.
Se alguém imagina um governo preocupado com a crise económica que se desengane, o governo parece desejar o agravar das condições económicas, sem isso deixaria de ter cobertura para implementar o seu projecto, um verdadeiro golpe de Estado a coberto de uma troika formada por técnicos da mesma escola ideológica do ministro das Finanças. O custe que custar vai ser bem mais difícil do que muitos imaginam.